Mochila filtradora leva água potável para famílias vulneráveis
Juliana Domingos de Lima
De Ecoa, em São Paulo
14/06/2021 06h00
Quase 35 milhões de brasileiros não têm abastecimento de água tratada em suas casas, segundo dados de 2019 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, do governo federal. A falta de acesso ao saneamento básico afeta a população mais pobre, situada nas periferias urbanas e em áreas rurais.
Foi pensando nessa situação que um grupo de estudantes do curso de Design da PUC-Rio criou o Kit Água Camelo, um equipamento composto por uma mochila, um filtro portátil de água e um suporte de parede, que tem ajudado algumas centenas de famílias brasileiras a consumirem água potável no seu dia a dia.
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A partir de um estudo sobre o acesso à água tratada nas comunidades do estado do Rio de Janeiro, o estudante Rodrigo Belli e seus colegas verificaram que os moradores normalmente precisavam atravessar quatro etapas para consumir um copo d'água seguro: captar, transportar, armazenar e, por fim, filtrar a água em casa.
O kit facilita enormemente o processo: permite captar até 15L de água, transportá-la com praticidade, armazená-la e realizar a filtragem, tornando a água própria para consumo disponível a qualquer momento.
Belli calcula que a quantidade cobre o consumo diário de uma família de cinco pessoas, considerando dois litros de consumo individual de cada membro e cinco litros para cozinhar. O filtro purifica em torno de 700 mL por minuto — filtrar os 15 litros leva cerca de 20 minutos.
Desde a entrega da primeira unidade no final de 2019 no Jardim Gramacho, bairro de Duque de Caxias (RJ), a empresa social surgida na PUC-Rio já instalou 592 kits em comunidades de oito estados brasileiros: Rio de Janeiro, Amapá, Bahia, Maranhão, Piauí, Ceará, Acre e Paraná.
Mais de 3.000 pessoas já foram diretamente impactadas pela iniciativa, que além do idealizador Rodrigo Belli também conta com a participação dos designers Daniel Ilg e João Manuel Tui.
Um efeito positivo em cascata
A maioria das doenças que afetam a população que consome água imprópria é causada por bactérias e protozoários. Chamada de membrana de fibra oca, a tecnologia utilizada no filtro consegue filtrar mais de 99% de todas as bactérias, protozoários e matéria orgânica presentes na água, combatendo o desenvolvimento dessas doenças.
"O impacto é muito imediato, é direto. Assim que a gente entrega o kit e capacita as pessoas para usar, elas já começam a consumir uma água tratada", disse Rodrigo Belli a Ecoa.
Ele enfatiza que o acesso a uma fonte segura de água tratada traz vários outros efeitos positivos mais indiretos. Com uma saúde melhor, crianças faltam menos à escola e adultos também perdem menos dias de trabalho, o que pode gerar mais renda para as famílias e culminar no desenvolvimento da comunidade.
A tecnologia de purificação do filtro é de fácil limpeza e dura até dez anos sem requerer substituição de nenhuma peça — uma vantagem em relação ao popular e eficiente filtro de barro, que exige a troca periódica das velas.
Desde o seu surgimento, a iniciativa vem ampliando o escopo das populações atendidas. Em 2020, os kits chegaram a algumas aldeias indígenas no Acre e a comunidades quilombolas do Amapá durante a crise de energia que atingiu o estado em novembro do ano passado.
A Água Camelo também estuda caminhos para que os kits possam beneficiar pessoas em situação de rua no país, que também têm dificuldade em acessar água potável.
Como ajudar
A instalação dos kits é financiada por meio de doações de pessoas físicas e instituições. Acessando o site da Água Camelo, qualquer um pode apadrinhar um ou mais kits que serão distribuídos em casas de famílias e centros comunitários em territórios vulneráveis de diferentes regiões do Brasil. Cada kit tem um custo de R$ 500.
A escolha de quem será beneficiado é feita com a ajuda de organizações parceiras que atuam nos locais e conectam os fornecedores dos kits com quem mais precisa.
"Por conhecerem a comunidade e por terem a confiança dos locais, as instituições que atuam na ponta conseguem nos indicar as famílias que mais necessitam e acompanham nossa entrada para que tudo seja feito da forma mais respeitosa e cuidadosa possível, sempre pensando na maximização do impacto que a gente pode proporcionar para aquela comunidade", afirmou Rodrigo Belli.