Betinho teve hemofilia e contraiu HIV: qual a relação entre as doenças?
A série "Betinho: No Fio da Navalha" estreou nesta semana no Globoplay, contando a vida do sociólogo Herbert José de Souza. Betinho, como ficou conhecido, desempenhou um papel crucial na luta contra a fome no Brasil.
Ele, que enfrentou desde os primeiros dias de vida a hemofilia, doença do sangue que compromete a coagulação, também teve hepatite do tipo C, adquirida, como a HIV, em transfusão de sangue durante tratamento contra a doença.
O que é hemofilia
A hemofilia é uma doença rara que atinge pouco mais de 13 mil pessoas no Brasil e que é caracterizada pela deficiência da atividade coagulante do Fator VIII (hemofilia A) ou do Fator IX (hemofilia B), que são proteínas do sangue.
O trabalho da coagulação é estancar o sangramento e, para que isso aconteça, várias substâncias entram em ação, uma ativando a outra. Quando falta um fator, ele não ativa o próximo e o sangramento não cessa.
É importante ficar claro que a pessoa com hemofilia não sangra mais que os outros, ela sangra por mais tempo. Claudia Lorenzato, hematologista do Hemepar
Na maioria dos casos, a hemofilia resulta de uma mutação genética localizada em uma parte do cromossomo X, transmitida da mãe para seus filhos do sexo masculino.
Quando um casal é composto por uma mulher que tem o gene modificado e um homem afetado pela hemofilia, há uma possibilidade de a criança do sexo feminino, filha deles, desenvolver a hemofilia. Entretanto, é importante destacar que essa situação é considerada rara.
A gravidade da hemofilia é classificada de acordo com a atividade do fator de coagulação de cada paciente:
- Leve: observa-se a presença de 5% a 40% de atividade do fator de coagulação. A pessoa pode não apresentar sintomas por longo período de tempo, e só descobrirá que há algo errado quando tiver um ferimento, se submeter à extração de um dente ou sofrer um acidente, por exemplo.
- Moderada: a atividade está entre 1% a 5%. Assim como o tipo leve, os sintomas podem não se manifestar, mas haverá maior propensão a hematomas, além de sangramento nas articulações, principalmente no tornozelo, joelho ou cotovelo, mas também pode acometer o ombro, o pulso e o quadril.
- Grave: a atividade é menor que 1%. Os sintomas serão semelhantes aos da hemofilia moderada, mas essa modalidade apresenta sangramentos articulares mais frequentes e graves. Entre as crianças, os sangramentos espontâneos podem ocorrer nas juntas ou nos músculos, sem causa aparente.
Nesses casos [graves], em geral, a criança apresenta distúrbios hemorrágicos já ao nascer. Fernando Lopes Martins, professor de hematologia da Escola de Medicina da PUC-PR
Há cura? Quais são os tratamentos?
Quadros mais graves não são mais frequentes porque há maior controle e cuidado com grávidas com histórico familiar de hemofilia.
Apesar de ter tratamento, que se baseia na reposição do fator de coagulação que está faltando, e de ele ser oferecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde), não há cura para a hemofilia.
Existem algumas opções terapêuticas, e a escolha do tratamento dependerá da gravidade da doença:
- Tratamento profilático (preventivo): em geral, é indicado para os quadros graves. Como o sangramento pode ocorrer após mínimos esforços, a abordagem se vale do uso de medicamentos recombinantes (fator VIII) ou derivados do plasma (fator IX), injetáveis. A medida previne não só os sangramentos como danos articulares ou musculares. O tratamento dura por toda a vida, requer acompanhamento médico contínuo e educação de pais e pacientes.
- Tratamento por demanda: quando a hemofilia é moderada ou leve, o tratamento medicamentoso acontecerá como resposta imediata a algum tipo de sangramento.
Qual a relação entre hemofilia e HIV?
Até a década de 1990, como tratamento também era usada a infusão de plasma em pessoas com hemofilia.
Nesse período, muitos hemofílicos adquiriram o HIV em transfusões. Hoje, porém, não existe mais esse risco.
"Os produtos derivados de plasma passam por um processo de inativação viral e são seguros", garante Margareth Ozelo, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
"E, além deles, existem os fatores recombinantes, criados a partir de cultura de células em laboratório", explica a hematologista.
Por conta das inúmeras transfusões de sangue no tratamento da hemofilia, Betinho testou positivo para o HIV em 1986.
No ano seguinte, ele fundou a Abia, uma associação para lutar pelos direitos das pessoas que vivem com HIV e dos doentes com Aids.
O sociólogo combateu o preconceito falando publicamente sobre o vírus HIV e a Aids nos meios de comunicação.
Deixe seu comentário