"Não houve negociação [para trazer Lula para o sindicato]. Nós estávamos aqui [no sindicato] reunidos, discutindo justamente o que fazer diante da iminente ordem de prisão. Aguardávamos uma ordem de prisão que viesse três, quatro dias depois, não com aquela celeridade, com aquela brevidade que acabou acontecendo. Eu falei 'vem para cá' assim que a gente soube da ordem de prisão, na quinta-feira (5).
Liguei para o Lula e disse:'O sindicato está aqui à disposição, aqui a gente conversa'.
"Talvez nem precisasse da ligação. Seria uma coisa natural dele. É o ambiente em que ele se sente bem, o ambiente em que ele cresceu para o mundo e para a política, onde ele se sentiria acolhido. Foi espontâneo tanto o convite como ele vir para cá. Não houve nada planejado."
"Aí que as coisas foram sendo preparadas, reservamos o segundo andar para Lula e a família. Fomos improvisando, as pessoas foram se voluntariando. Dormi no chão. Teve gente dormindo em sofá, em cadeira, em colchonetes que fomos comprar. O térreo e o subsolo estavam tomados de gente. Onde tinha tomada para carregar o celular você via uns dez dormindo em volta. O terceiro andar também estava aberto."
"Chegou uma hora que faltou água e achamos que era conspiração, que tinham cortado a água. Colocamos deputados para correr trás, para tentar investigar o que estava acontecendo, e não era [corte]. Simplesmente [a Sabesp] não vencia a quantidade de pessoas que estava utilizando recursos no sindicato. E a gente encomendou carros-pipa [para abastecer o local]. A cada hora e meia, duas horas chegava um carro-pipa, dada a quantidade de pessoas."
"Definimos o local onde Lula iria dormir por questão de comodidade. E também de improviso. O único lugar que temos com chuveiro é lá no subsolo, que é o vestiário dos trabalhadores. Ao lado dele, tem um refeitório que também tem uma área de descanso e lazer. Os trabalhadores fazem a refeição e depois descansam em uma sala onde tem uma TV e sofá", conta. (A foto abaixo mostra o local onde Lula dormiu.)
"A minha postura de anfitrião era muito mais com os outros, com quem era de fora e não conhecia a casa, do que com ele. Ele conhece a casa inteira, se vira bem aqui."
"Decidi manter o sindicato aberto da hora em que ele chegou até o momento em que ele deixou o sindicato [para se entregar]. Cada militante que estava aqui queria protegê-lo, demonstrar carinho e solidariedade. E o sindicato não poderia negar esse direito [a essas pessoas]. Foi um momento histórico. Foi um momento tão representativo e significativo quanto o dia posse dele na Presidência em 2003."
O que mais me preocupou foi a ameaça concreta de um atrito com a polícia pela resistência da militância no final. Teve gente que resistiu, apesar da orientação dele e nossa, deitou na frente do portão, jogou madeira no portão tentando impedir que ele saísse. Sei que a polícia tem seus meios e suas obrigações.
"Tenho certeza de que aconteceria uma tragédia pelo instinto de defesa da polícia e a estrutura que ela tem. Bombas de gás e balas de borracha não seriam suficientes para deter aquele povo [os militantes]. Eles [os policiais] estavam preparados, estavam monitorando por obrigação e se preparando para essa possibilidade [de ir ao sindicato deter Lula]", diz Wagnão.