O horário eleitoral nas rádios de Pomerode (a 167 km de Florianópolis) é todo falado em português, mas na hora de pedir o voto cara a cara o candidato tem de gastar o alemão para ganhar a confiança do eleitor. “A gente aprendeu a pedir voto em alemão. Não sou fluente, e meu sotaque não é bom, mas o vice se encarrega de convencer porque ele fala bem”, confessa Paulo Pizzolatti (PP), o primeiro prefeito eleito sem sobrenome germânico em toda a história do município, emancipado em 1959.
O UOL visitou Pomerode dentro do projeto UOL pelo Brasil, série de reportagens multimídia que percorre municípios em todos os Estados da federação durante a campanha eleitoral.
Atrás de sua reeleição, Pizzolatti tem o atenuante de possuir mãe de origem alemã e ter crescido na cidade. Um de seus rivais na campanha é a chapa duplamente italiana Rolf Nicolodelli e Ricardo Campestrini, da coligação PMDB-PSD. “Mas nós dois falamos bem o alemão. As pessoas ficam mais à vontade e dá uma credibilidade maior falar no idioma que eles estão acostumados”, conta o vereador Campestrini, vice na chapa.
Estas, porém, são exceções que só reforçam a regra na “cidade mais alemã do país”, como a localidade catarinense se autointitula até em seu hino: "Pomerode! Pomerode! O teu povo se orgulha de ti, ó cidade mais alemã do Brasil".
O cálculo é que 90% da população tenha origem na Pomerânia, região à beira do mar Báltico que atualmente é dividida entre a Alemanha e a Polônia. A influência é tanta que o dialeto pomerano, extinto na Europa, ainda sobrevive nesse canto do Brasil.
A cultura alemã se preserva por lá também com os bolos cucas, os marrecos recheados, os grupos de dança folclórica, os clubes de tiro, as cervejas artesanais e na arquitetura de chalés típicos usando a técnica do enxaimel. Todo o mês de janeiro tem a Festa Pomerana.
Mas a política já atrapalhou essa característica local. Após o ex-presidente Getúlio Vargas declarar guerra aos países do Eixo (que inclui a Alemanha nazista) em 1942, o governo brasileiro proibiu o uso da língua alemã, assim como construções no estilo alemão e qualquer outro tipo de manifestação que lembrasse a cultura do inimigo bélico de então. O banimento terminou junto com a guerra em 1945.
Hoje em dia, o alemão é ensinado nas escolas primárias e é considerado língua cooficial do município. Há placas bilíngues e alguns serviços, como enfermagem e comércio, podem ser oferecidos nos dois idiomas.
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- http://eleicoes.uol.com.br/2012/enquetes/2012/09/25/voce-votaria-em-um-politico-so-porque-ele-tem-a-mesma-origem-etnica-que-a-sua.js
“Eu já chego falando alemão com todo mundo. A gente conquista o eleitor com mais facilidade”, conta o vereador Nelson Fischer (PMDB). O mais usual nas ruas, na verdade, é uma espécie de dialeto que mistura a estrutura do alemão popular (o chamado plattdeustch) com palavras em português. Surge daí a palavra “prefekt” para prefeito, quando o certo na língua de Goethe é “bürgermeister”.
O isolamento de Pomerode, que ajudou a criar esse dialeto, também tem seu lado negativo. “Pela nossa formação, uma vergonha pública é inaceitável. A pessoa prefere se suicidar a ficar devendo para um vizinho”, comenta o vereador Arno Muller (PMDB) sobre a triste estatística recente de Pomerode, com alto índice de suicídio por habitante.
Outro tema polêmico é o racismo dentro de uma comunidade tão homogeneamente branca. Várias empresas alemãs, como Bosch, Netzsch e Weiku, se instalaram nos últimos anos na cidade, atraídas pelo ambiente germânico da região.
Os investimentos, porém, mudaram ainda mais o perfil rural da cidade para o industrial --antes, a principal fábrica era a de porcelanas Schmidt. A movimentação econômica também trouxe uma leva de migrantes vindos principalmente do vizinho Paraná.
O tema ainda não ganhou importância eleitoral, mas pode ganhar importância no futuro. “Há 18 anos, quando cheguei aqui, havia uma resistência muito grande a quem era de fora. Agora até que está melhorando”, relata o paulista Hamilton Petito (PP), único vereador sem sangue alemão.
Além da migração, a TV também é um vetor de transformação. “Os pais e os avôs começaram a assistir a televisão e assimilar o português e os costumes brasileiros. Isso está mudando a cultura local”, opina Arno Muller, vereador pelo PP.