fizeram história

Como a luta de Jane Jacobs para preservar seu bairro mudou o urbanismo

Por Juliana Domingos de Lima

Crédito: Frank Lennon/Toronto Star via Getty Images

Nos anos 1960, uma jornalista travou uma batalha pública em Nova York contra um dos planejadores urbanos mais poderosos da época — e venceu. Jane Jacobs entrou para a história do urbanismo com seu ativismo e suas ideias, que seguem influentes até hoje.

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A disputa começou em meados dos anos 1950, quando Robert Moses planejava construir uma nova via expressa em Nova York. Ela atravessaria bairros tradicionais como Greenwich Village, Soho e Little Italy, removendo milhares de pessoas e alterando suas características. Nas décadas anteriores, Moses tinha estado à frente de grandes projetos de construção de vias, parques e conjuntos habitacionais que haviam mudado a paisagem da cidade.

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 Foi uma guerra fria: os dois só chegaram a se encontrar uma vez pessoalmente. Mas, ao fim da década de 1960, os planos de Moses para a região tinham perdido força.

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Moses encontrou em Jacobs, moradora do Greenwich Village desde os anos 1930, uma adversária à “renovação” que ele queria promover na região. Ela organizou a comunidade, conquistando apoiadores que iam de crianças à ex-primeira-dama Eleanor Roosevelt, publicou artigos na imprensa e escreveu cartas a autoridades.

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Jacobs também reuniu suas observações cotidianas e visões sobre as cidades em um livro. “Morte e vida de grandes cidades” foi publicado em 1961 e se tornou um dos mais influentes e populares estudos urbanos de todos os tempos. Nele, ela se opõe ao que chama de “urbanismo moderno e ortodoxo”, que tinha em Moses um de seus representantes, e defende a vitalidade dos usos diversos e do fluxo de pessoas na rua.

Essas duas imagens foram usadas por Jacobs no livro e se tornaram conhecidas por sintetizar aquilo que, para ela, torna uma vizinhança atraente e segura. A primeira trata do movimento de pedestres na rua em suas atividades diárias e a segunda de como olhos vigilantes e solidários para a rua garantem a segurança de moradores e transeuntes. 

O balé de calçada e os olhos nas ruas

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Sob a aparente desordem da cidade tradicional, existe, nos lugares em que ela funciona a contento, uma ordem surpreendente que garante a manutenção da segurança e a liberdade. Sua essência é a complexidade do uso das calçadas, que traz consigo uma sucessão permanente de olhos

Jane Jacobs
Em “Morte e vida de grandes cidades” 

Esse livro mudou as regras do jogo no planejamento urbano. Ele faz uma crítica aos modelos tirados da cabeça de um planejador que achou que aquilo era melhor pra cidade sem falar com as pessoas que moram nela ou prestar atenção nos usos que elas fazem desse espaço. Isso é bastante revolucionário, porque permite extrair toda uma ideia de gestão democrática das cidades. ‘Morte e vida’ tem coisas a dizer pra gente ainda hoje

Bianca Tavolari

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Professora do Insper 

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A autora desse clássico não era uma urbanista profissional, e sim uma jornalista, o que fez com que ela tivesse um olhar específico sobre o cotidiano das cidades. Jacobs nasceu em 1916 na cidade de Scranton, no estado norte-americano da Pensilvânia. Mudou-se para Nova York nos anos 1930 e passou a trabalhar como jornalista freelancer para várias publicações.

No período da Segunda Guerra Mundial, conheceu o arquiteto Robert Jacobs, com quem se casou em 1944. Algum tempo depois, passou a escrever sobre cidades para a revista Architectural Forum. No fim dos anos 1960, Jacobs se mudou com a família para Toronto, no Canadá, onde seguiu escrevendo sobre a temática urbana. Ela morreu em 2006, aos 89 anos. 

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Jacobs foi uma mulher à frente do seu tempo porque conseguiu ver o desgaste da substituição urbana proposta pelo modernismo e antecipou o debate sobre a valorização da memória da cidade a partir dos seus bairros e territórios históricos. Isso foi estratégico para pautar uma nova reflexão sobre a cidade, um novo urbanismo que se afasta da escala do carro e se aproxima das pessoas, do interior dos bairros

Tainá de Paula
Arquiteta e urbanista, colunista de Ecoa

Edição: Fred Di Giacomo

Reportagem: Juliana Domingos de Lima

Publicado em 17 de julho de 2021