Operários, robôs e criatividade ajudam fábricas automotivas a produzir mais

Da Auto Press

Produzir mais veículos em menos tempo, com nível máximo de qualidade e o menor custo possível. Essa é receita ideal da manufatura moderna para as fábricas de veículos. Só que a demanda do mercado brasileiro cresceu em níveis recordes nos últimos dois anos. Em 2008, a produção interna de automóveis chegou a 3,2 milhões de unidades, volume 24% maior que os 2,3 milhões de veículos entregues em 2005. Ou seja, as montadoras tiveram de correr para adequar a produção. E com o capital para investimentos controlado pelas matrizes, o jeito foi usar a criatividade nos processos de manufatura. As linhas de montagem ganharam robôs e mais operários. Mas precisaram ir além. Foram informatizadas e receberam ferramentas inusitadas. Em algumas fábricas, por exemplo, há funcionários que abastecem as linhas a bordo de patins. Tudo em nome da agilidade.

Uma das inovações mais curiosas fica na fábrica da Volkswagen em Taubaté, interior de São Paulo. Dentro da fábrica há um "supermercado" de peças e componentes. Os funcionários da linha de montagem vão até esse centro de distribuição e enchem um carrinho com peças, de acordo com a sequência dos modelos que serão montados. O procedimento evita erros de montagem, atrasos e falta de componentes. "A fábrica recebe os pedidos e faz imediatamente um planejamento, de acordo com as prioridades dos clientes", explica Frank Sowade, diretor da fábrica de Taubaté. Dentro dessa lógica, também foi construído o Depovert, um depósito vertical de carrocerias com capacidade para armazenar até 180 monoblocos. A estrutura permite a flexibilização do mix de produtos. De acordo com a demanda por determinada versão de um modelo, a carroceria é estocada ou segue para a linha -- o que otimiza o processo. Sai a rígida linha de montagem fordiana, que marcou a indústria automobilística e o capitalismo no século 20, e entra a produção flexível ou on-demand.

ACELERADAS

- O Brasil fechou 2008 como o 6º maior mercado de veículos do planeta em produção e vendas. Em 2009, o país pode chegar ao 5º lugar, superando a Rússia.
- As fábricas da Volkswagen Anchieta, em São Paulo, e de São José dos Pinhais, na Grande Curitiba, são duas das poucas no país equipadas com sistema robotizado de solda a laser. Na unidade Anchieta é produzida a linha Polo, nas carrocerias hatch e sedã, enquanto na unidade curitibana são montados os modelos Fox, CrossFox e Golf.
-A unidade da Fiat em Betim, na Grande Belo Horizonte, produziu 722,4 mil automóveis e comerciais leves em 2008 -- aproximadamente um veículo a cada 20 minutos. Atualmente, a planta monta 12 modelos e 217 versões em quatro linhas de montagem. Trabalham lá 25.833 funcionários, entre contratados e terceirizados.
- A planta da General Motors em Gravataí tem hoje um dos custos mais baixos de todas as fábricas da montadora norte-americana no mundo. A manufatura enxuta, com máxima comunização de peças, rendeu melhorias de 63% na produtividade geral e de 87% no volume entregue.
- Para reduzir custos e aumentar a produtividade da planta de Sumaré, em São Paulo, a Honda inaugurou em 2008 a unidade de motores Power Train dentro das instalações, com capacidade de produção de 12.500 unidades/mês.
Outra solução cada vez mais aplicada nas linhas de montagem das fábricas brasileiras é o assento deslizante para os operadores -- chamado de "raku raku seat", um termo que mistura japonês e inglês e que significa algo como "banco fácil-fácil", em português. O operador fica sentado em um banco móvel, suspenso por uma estrutura de aço, e locomove-se ao redor do carro, podendo acessar o interior para fazer ajustes e instalar componentes. O acessório permite maior conforto ergonômico e, é claro, agilidade.

"Os processos dependem da produtividade e precisão do operador para chegarem ao final com o máximo de qualidade. E isso demanda um padrão de trabalho motivador e confortável", valoriza Gilson Souza, diretor de projetos industriais da Renault-Nissan Mercosul.

"O operador é como um cirurgião. Tem de estar focado e muito à vontade. E a linha também precisa rodar no tempo exato e com qualidade", faz coro Sílvio Illi, gerente da fábrica da Ford em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista.

Mas de nada adianta dar maior mobilidade e conforto aos operadores se a linha de montagem não caminhar em sincronia precisa. Daí a recente opção pelas chamadas plataformas globais e a tal da sinergia. A Ford, por exemplo, criou o conceito "One Ford", que consiste em um desenho padrão, uma linha de montagem única e diversas derivações em modelos e configurações. A General Motors adotou um princípio similar, chamado internamente de "Footprint Flexível Global". A ideia é compartilhar o máximo de ferramental e componentes em diversos modelos, barateando o custo final e otimizando o processo de montagem dos veículos.

"A padronização de plataformas permite a troca de produtos entre unidades, trazendo ganhos de capacidade produtiva sem investimentos significativos", pontua Walter Othero, diretor de Manufatura da GM em Gravataí, no Rio Grande do Sul, e em Rosário, na Argentina.

A participação direta dos fornecedores nas linhas de montagem também é cada vez mais comum e necessária. Diversas fábricas brasileiras já agrupam, hoje, os principais fornecedores dentro das próprias instalações -- os chamados sistemistas. Componentes como motor e câmbio, pneus, peças de acabamento, entre outros, são produzidos nas fábricas e levados diretamente para a linha de montagem, dispensando transporte e estocagem. A unidade de motores Fiat Powertrain Technologies, por exemplo, tem um centro de produção na fábrica da montadora em Betim, Minas Gerais. A unidade da Fiat ainda agrupa 43% dos fornecedores em um raio igual ou inferior a 30 km de distância.

"É fundamental ter os fornecedores ao lado e reduzir custos de mão-de-obra, já que as commodities, como o aço, têm preços internacionais definidos", completa Sérgio Hartman, diretor de manufatura da FPT.

Essa logística é a essência do modo de produção "just-in-time", criado pela Toyota em 1948. Um padrão que levou a montadora japonesa a se tornar uma das maiores do mundo. Muito graças a esse sistema que se tornou mais do que necessário nos tempos atuais. Se tornou vital para os fabricantes.

MUDANÇAS INESPERADAS
Além de produzir carros num tempo cada vez menor, as montadoras atualmente precisam responder rápido ao mercado. Se há uma demanda maior por determinado modelo, reduz-se a produção de outro veículo montado na mesma linha para evitar gargalos e filas de espera nas revendas. Alterar o planejamento da produção, no entanto, não é tão simples. Os pedidos são ordenados à medida em que chegam e é preciso ganhar versatilidade.

"Tudo é controlado no fluxo, como peças, demais componentes e até a movimentação dos operadores", explica Frank Sowade, diretor de manufatura Volkswagen em Taubaté.

Para não ser pega de surpresa, a Fiat passou a acompanhar de perto a evolução do varejo e as tendências do mercado, interagindo também com os fornecedores antes de decidir os rumos da produção. Já a Ford utiliza uma sequência de montagem padronizada para todos os modelos, o que dá maior flexibilidade às oscilações de pedidos -- 80% das peças e ferramental servem tanto para a linha Fiesta como para o EcoSport na planta de Camaçari, na Bahia. O mesmo princípio é utilizado na rival General Motors em Gravataí, no Rio Grande do Sul, onde são produzidos o hatch Celta e o sedã Prisma.

"O mercado é ingrato e a manufatura precisa ter grande habilidade para enfrentar e sintonizar as necessidades do mercado", pondera Walter Othero, diretor de Manufatura da GM em Gravataí e Rosário, na Argentina. (por Diogo de Oliveira)

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