Não é gripe: tosse seca e sem catarro pode ser alergia respiratória

Você está bem, de repente começa a tossir. Nada de febre, nem catarro, só aquela tosse seca e insistente que parece não ter fim. Já tomou água, já parou de falar, já fechou a janela —e nada. Seria um resfriado? Uma gripe chegando? Talvez nenhuma das duas opções.

"A tosse alérgica é uma resposta do organismo a algum alérgeno, uma substância capaz de gerar alergias em algumas pessoas. Ela não é uma doença em si e sim uma consequência, um sintoma de que algo provocou esse efeito irritativo", explica o otorrinolaringologista Cícero Matsuyama, do Hospital Cema (SP).

Tossir, na verdade, é um reflexo do corpo, um tipo de alarme interno contra intrusos. "A tosse é um mecanismo de defesa e de proteção das vias aéreas respiratórias, que impede a entrada de microrganismos, corpos estranhos e alimentos, e ajuda a remover secreções", detalha Matsuyama.

Ou seja, o problema não é tossir, e sim quando a tosse vira um sintoma persistente. No caso da tosse alérgica, o que acontece é que o corpo interpreta certos elementos do ambiente como ameaças e dispara a tosse para tentar "expulsá-los" do corpo.

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De onde vem tanta tosse? Causas da irritação

A tosse alérgica pode ser ativada por uma infinidade de agentes invisíveis, muitos deles comuns dentro de ambientes fechados, incluindo a própria casa.

"Os inalantes são dos principais agentes que desencadeiam a tosse alérgica", explica o otorrinolaringologista Cícero Matsuyama. "Podem ser substâncias químicas usadas para antissepsia, limpeza, desinfetantes de chão e vasos sanitários. Tintas de parede também entram na lista", continua o médico.

Mas não para por aí. Segundo Matsuyama, o simples ato de limpar o armário pode ser um convite para a irritação. "Quando a pessoa vai mexer em livros antigos ou roupas guardadas por quase todo o ano, especialmente na época do frio, entra em contato com peças cheias de ácaros, o que pode provocar essa tosse."

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A pediatra Maianna Viana, professora e coordenadora na Faculdade Santo Agostinho, da Afya, em Vitória da Conquista (BA), acrescenta mais responsáveis. "A tosse alérgica pode ocorrer ainda quando o sistema imunológico reage ao contato com poeira doméstica, pelo de cachorro ou gato, pólem e cheiros fortes, como de poluição, perfumes, cigarros." Em resposta, o corpo desencadeia um processo chamado secreção pós-nasal, um gotejamento de muco da parte superior do nariz para a garganta, que ativa o reflexo da tosse.

E como a tosse alérgica se manifesta?

De acordo com a alergista Rafaella Leão Baiocchi Faig, do Fleury Medicina e Saúde, essa tosse tem pouco a ver com a típica tosse causada por infecções virais ou bacterianas, habitualmente seguida de mal-estar geral pelo corpo e febre e, às vezes, de secreção, que vai desde a branca até a esverdeada mais escura.

"A tosse alérgica é seca, sem catarro, persistente e costuma vir acompanhada de coceira na garganta, nariz e olhos, além de espirros e coriza", elenca a médica. Sua chegada, geralmente, acontece à noite ou nas primeiras horas da manhã, o que, literalmente, tira o sono de muita gente. E mais: a crise pode durar mais de quatro semanas. Torna-se crônica quando acima de oito semanas em pacientes sem diagnóstico e sem tratamento.

Essa tosse também raramente aparece sozinha. Em muitos casos, ela vem acompanhada de outras condições alérgicas, como rinite ou asma —o que deixa o desconforto ainda maior. Durante as crises, o indivíduo pode tossir tanto que apresenta olhos lacrimejantes e até ânsia de vômito.

Lugares fechados, com pouca ventilação ou mudanças bruscas de temperatura funcionam como gatilhos perfeitos para essas crises. Nessas condições, as vias respiratórias ficam mais sensíveis e reagem como se estivessem sob ataque. A tosse, então, é a sirene de alarme do corpo.

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Como saber se é alergia? E o que fazer?

Diferente de uma gripe passageira, a tosse alérgica exige investigação, sobretudo quando dura mais de quatro semanas e parece surgir sem motivo aparente.

O diagnóstico é basicamente clínico, feito por meio de uma avaliação médica detalhada. O profissional irá considerar o histórico de sintomas, fatores ambientais e até os antecedentes familiares do paciente. Em alguns casos, pode solicitar exames laboratoriais, testes alérgicos ou de imagem (como radiografia do tórax), para descartar outras causas (pneumonia, tuberculose) e identificar os gatilhos específicos da reação.

E quando o diagnóstico se confirma, o foco é duplo: tratar os sintomas e eliminar os fatores desencadeantes do ambiente. "O tratamento é baseado no controle ambiental, evitando o contato com alérgenos como poeira, fumaça de cigarro, odores fortes e pelos de animais. A lavagem nasal também é importante", explica a pediatra Maianna Viana.

Entre os medicamentos mais usados estão os antialérgicos (anti-histamínicos), que ajudam a aliviar os sintomas mais incômodos. Em alguns casos, corticoides nasais ou orais podem ser indicados, especialmente se houver rinite associada e os sintomas persistirem.

Os xaropes também podem ser bons aliados no alívio da tosse alérgica, de maneira especial os formulados com extratos naturais, que costumam ter menos efeitos colaterais. Um exemplo é o extrato de Hedera helix Linné, uma planta medicinal com ação broncodilatadora, ou seja, que ajuda a "abrir" as vias respiratórias. Além disso, ela atua fluidificando o muco, facilitando a eliminação das secreções e tornando a respiração mais livre.

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Mas nem sempre é preciso correr para a farmácia: em fases leves, nebulizações com soro fisiológico, chás quentes ou até um banho morno já ajudam a aliviar a irritação. No entanto, se os sintomas não melhorarem em poucos dias, é importante procurar um especialista, que pode ser um pneumologista ou otorrinolaringologista, para evitar complicações e garantir que o tratamento seja o mais eficaz possível.

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Como prevenir?

Para controlar a tosse alérgica, observe com atenção o ambiente onde você vive. Locais fechados, com poeira, mofo ou umidade, são o cenário ideal para ácaros e fungos, grandes inimigos das vias respiratórias. Por isso, manter a casa limpa, bem ventilada e livre de itens que acumulam poeira, como cortinas, tapetes e bichos de pelúcia, faz toda a diferença.

"Medidas ainda como lavar roupas guardadas há muito tempo, preferir pisos lisos e de fácil limpeza, trocar e lavar roupas de cama com frequência e utilizar umidificadores de ar para evitar os efeitos do clima seco, ajudam bastante", orienta a alergista Rafaella Leão.

Hidratar-se bem também é fundamental. Beber bastante água ajuda a manter as vias respiratórias úmidas e menos irritadas. Prefira uma alimentação leve, evitando excessos de temperos fortes e alimentos ultraprocessados, que podem agravar a inflamação. E, sempre que possível, faça nebulizações com soro fisiológico —elas ajudam a umedecer as mucosas e reduzem aquela coceira incômoda na garganta.

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Além disso, se a tosse estiver relacionada a rinite ou asma, o tratamento dessas condições também ajuda a reduzir os episódios. Para quem convive com sintomas frequentes, pode valer a pena investigar com um especialista a possibilidade de fazer imunoterapia, uma espécie de "vacina" personalizada contra o alérgeno específico e que ensina o organismo a não reagir de forma exagerada. "Primeiro é preciso identificar a causa, se é poeira, pelo de animal, ácaro, para, então, desenvolver a vacina sob medida", explica o médico Cícero Matsuyama.

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