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Só queríamos um filho: brasileira relembra em livro luta para engravidar

Arquivo pessoal/Reprodução/RFI
Imagem: Arquivo pessoal/Reprodução/RFI

Cleide Klock

Correspondente da RFI em Los Angeles

16/01/2021 14h20Atualizada em 18/01/2021 14h40

Uma saga que durou oito anos. Além das dores físicas, uma montanha-russa de emoções. Foram 2.250 injeções e incontáveis procedimentos, exames, consultas e tratamentos. Cerca de 350 entrevistas para encontrar a barriga de aluguel perfeita, disputas entre médicos, dramas em salas de emergência. A trama que parece de filme, mas que também faz com que muitos casais se identifiquem, acaba de ser lançada no livro "Tudo o que queríamos era um filho", da brasileira Cirla Cole.

Além de publicar de forma independente a obra em português, inglês e espanhol, a escritora também escreveu uma versão para o público infantil, "A Galinha Prestativa". Os livros levaram mais de cinco anos para ficarem prontos. Cada vírgula vinha repleta de sentimentos e escrevê-las foi uma forma de revisitar a dor para tentar cicatrizá-la e uma maneira de compartilhar com casais que também não conseguem ter filhos, para que não se sintam sozinhos.

"São fatos verídicos, que machucam e tocam muito numa ferida e é uma ferida dolorosa. Então não era uma coisa simples de escrever. Quando eu escrevia eu parava para chorar. Muita gente não toca nesse assunto quando os prematuros morrem. Então não é uma coisa fácil para ninguém conversar sobre esse assunto."

Aos 18 anos, Cirla já sonhava em ser mãe, mas aos 32, após achar o pai perfeito, começou a longa caminhada à maternidade. Consultou médicos nos Estados Unidos, onde mora há mais de 30 anos, e também peregrinou pelos consultórios brasileiros.

De forma espontânea e sem medir palavras para falar como se faz e como nascem os bebês, em "Tudo o que queríamos era um filho", Cirla descreve o doloroso processo pelo qual passou: das incertezas pelos motivos de não engravidar, às inseminações, fertilizações in vitro, perdas nos primeiros meses de gravidez, o parto de gêmeos aos seis meses —que sobreviveram cinco minutos— e o fato de o marido apagar da memória que viu as crianças.

Barrigas de aluguel

Em muitas das 140 páginas na versão adulta, a história toma forma de aventura, como quando a mãe dela embarca em um avião com o tubo que levava os embriões para serem injetados na barriga de aluguel no Brasil. A saga também toma ares de novela mexicana, já que foram várias tentativas que não deram certo no Brasil e também nos Estados Unidos.

"Eu entrevistei 350 mulheres, mas era tudo muito rápido. Quando na primeira frase elas perguntavam quanto iriam ganhar, eu dizia 'nada, muito obrigada pelo seu tempo' e desligava. Porque se a primeira coisa que você pensa é o dinheiro, não é a pessoa ideal."

A barriga que parecia ideal, também não levou a uma gravidez perfeita.

"Ela era mexicana. Foi uma montanha-russa bem alta durante o tratamento porque essa pessoa se transformou. Ela queria me sugar cada vez mais, fazia chantagem emocional fingindo que estava doente, me usava bastante para ajudar a família dela inteira. Você não tem controle se essa pessoa vai beber, usar drogas, se vai andar de moto correndo, pintar o cabelo. Então, tem muitas coisas que você não tem controle e você tem que ser muito delicada nessa hora porque ela está com seu filho na barriga."

Versão infantil

Cirla também quis contar essa história para as crianças. Tirou fotos de animais e de brinquedos para ilustrar o próprio livro infantil e de maneira fácil conta esse drama em "A Galinha Prestativa", no qual uma galinha não conseguia chocar o próprio ovo, por isso pediu ajuda a uma amiga, fazendo referência à barriga de aluguel.

"Eu acho que muitas crianças não devem entender porque um pai e uma mãe não podem ter um filho ou porque são casados e não têm uma criança na vida. O livro é uma forma de explicar essa situação para uma criança pequena de uma forma bem sutil, bem alegre e não muito triste."

Já "Tudo o que queríamos era um filho", segundo Cirla, foi escrito para mostrar para as pessoas que passam pela mesma situação que elas não estão sozinhas e que ter e buscar apoio é fundamental, assim como persistir e não perder a esperança.

"Também tentamos adotar, tentamos de vários ângulos. Eu percebi que a gente não poderia ter somente o plano A, tínhamos que ter o B, C, D, E, o F até acontecer. Agora nunca pode existir na sua mente a palavra desistir, porque no momento que você desiste, você não venceu. Na minha mente não existe essa palavra desistir, tudo tem um propósito, uma mágica para ser compartilhada com alguém."