Do Cretáceo ao tratamento: como dinossauros ajudam a combater o câncer

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Até pouco tempo, estudar dinossauros significava, quase sempre, analisar fósseis ósseos — que revelam detalhes sobre o físico e comportamento dessas criaturas pré-históricas. Mas uma nova frente de pesquisa vem ganhando espaço: o estudo dos tecidos moles preservados nos fósseis.
Esses tecidos podem conter proteínas que resistiram ao tempo e permanecem intactas por milhões de anos, guardando pistas preciosas sobre a biologia desses animais e as doenças que enfrentavam.
Como o DNA se degrada com relativa rapidez ao longo das eras, são as proteínas que oferecem hoje a melhor chance de entender como funcionavam os corpos desses gigantes — inclusive como reagiam a condições como o câncer.
A descoberta de um tumor pré-histórico
Em 2016, pesquisadores encontraram na Romênia um fóssil de Telmatosaurus transsylvanicus, dinossauro herbívoro de 70 milhões de anos, do período Cretáceo, com um raro detalhe: um tumor na mandíbula.
Intrigado, o cientista Justin Stebbing, professor de ciências biomédicas da Universidade de Cambridge (Inglaterra), liderou uma equipe que fez um furo do tamanho de um fio de cabelo no fóssil, para extrair uma amostra do tumor.
Com microscópios de alta precisão, analisaram células sanguíneas fossilizadas e as proteínas preservadas, em busca de pistas sobre como o câncer se desenvolvia nesses animais e como seus corpos reagiam. O estudo foi publicado em abril deste ano.
Já em 2020, outro avanço: um caso de osteossarcoma (tipo agressivo de câncer ósseo) foi identificado em um fóssil de Centrosaurus. Para o ortopedista Seper Ekhtiari, um dos autores, a descoberta reforça os laços biológicos entre os seres vivos e a ideia de que o osteossarcoma tende a surgir em ossos que crescem rapidamente.

O que os dinos podem ensinar à medicina
Talvez se pergunte o que um câncer de milhões de anos atrás tem a ver com os tratamentos de hoje. Apesar da distância evolutiva, dinossauros e humanos compartilham mecanismos biológicos essenciais.
Ao estudar proteínas associadas a tumores em fósseis, os cientistas buscam identificar padrões naturais de defesa contra o câncer, semelhantes aos observados em animais grandes e longevos, como baleias e elefantes, que surpreendentemente desenvolvem menos câncer do que se esperaria pelo tamanho e expectativa de vida.
A medicina já recorre à natureza em busca de respostas: medicamentos como a trabectedina, usada no tratamento de sarcomas, foram extraídos de organismos marinhos. Expandir essa busca para espécies extintas, como os dinossauros, pode revelar estratégias de resistência ao câncer que evoluíram há milhões de anos — e que ainda têm muito a ensinar.
Ainda estamos nos estágios iniciais dessa jornada. Como em tantas descobertas científicas, são necessários tempo, paciência e tecnologia. Mas o potencial é promissor: entender como o câncer surgiu e evoluiu ao longo da história da vida pode abrir novos caminhos para enfrentá-lo no presente.
*Com informações de reportagem publicada em 04/08/2020
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