Pirulla saiu da UTI: como funciona a reabilitação após um AVC?
Após sair da UTI no dia 13, o biólogo e divulgador de ciência Paulo Miranda Nascimento, conhecido como Pirulla, já começou a reabilitação, que vai ajudar na recuperação do AVC (acidente vascular cerebral). Ele teve um derrame no dia 25 de maio, em sua casa, em São Paulo.
Entenda a reabilitação
Busca recuperar aquilo que foi perdido. É preciso entender qual região do cérebro foi afetada pelo AVC, porque cada uma coordena uma função. Se o dano foi no hipocampo, por exemplo, a memória pode ficar comprometida. Há regiões que regulam comportamento, fome e saciedade, visão, linguagem, parte motora, sensibilidade e dor. As terapias serão aplicadas conforme a necessidade.
Plano de tratamento depende das causas e consequências do AVC. Existem dois tipos de AVC: o isquêmico, quando há obstrução de uma artéria por um coágulo, e o hemorrágico, quando um vaso sanguíneo cerebral se rompe e provoca hemorragia. O primeiro é mais comum, representa 85% dos casos. Já as consequências são variadas. "Tem AVC que não deixa sequelas e outros levam a um quadro muito grave", diz Ana Rita Donati, fisiatra da AACD.
Mesmo sem sequelas, tempo de internação pode demandar reabilitação. Ainda na UTI, pode-se fazer fisioterapia passiva, caso o paciente esteja desacordado ou sem condições de se mexer sozinho. "O profissional faz mobilidade articular da perna e do braço para evitar deformidade e rigidez, que pode atrapalhar depois. Cuida também da pele, mudando a pessoa de posição a cada duas horas para evitar úlceras por pressão, que podem infectar e causar sepse", explica Donati.
Se a pessoa está em coma, com dois ou três dias já tem alteração de circulação vascular, na composição do colágeno e se instala um processo de rigidez muscular e articular. Se não tem cuidado com isso na UTI, muitas vezes tem dano grande no corpo. Ana Rita Donati, fisiatra
Reabilitação é progressiva. Com a pessoa acordada, verifica-se se ela consegue ficar sentada, o que ajuda a controlar a pressão arterial e estimular o corpo. Se não, é preciso treinar a força do abdome e do tronco para que ela consiga se sustentar aos poucos. Pode começar com apoios nas laterais e nas costas, que vão sendo retirados até que ela consiga se manter sozinha.
Após ficar em pé, caminhadas são próximo desafio. Quando a pessoa consegue se sustentar, próximo passo é ficar em pé, também com exercícios de fortalecimento e percepção corporal, para que se inicie caminhadas logo que possível. Esse movimento pode ser treinado com andador, órteses ou com auxílios de robôs. A fisioterapia aquática também ajuda a treinar movimentos e organizar o cérebro. "A gente quer que a pessoa volte para a sociedade", afirma Donati. "Começa com tarefas mais simples e vai incrementando. Se a pessoa já anda, tenta fazer com que ande e segure um corpo de água ao mesmo tempo."
Sequelas comuns
Perda de força e movimento do braço ou da perna. A ligação é cruzada, então se o dano do AVC foi no lado direito do cérebro, os membros esquerdos serão comprometidos, e vice-versa. Se a sequela afetou o lado dominante da pessoa (se é destra ou canhota), a reabilitação tem o desafio a mais de mudar a dominância e fazer com que, primeiro, ela realize atividades simples, como colocar creme dental na escova, pentear os cabelos e segurar um talher para comer.
Visão e audição. O AVC pode causar um déficit auditivo e comprometer a capacidade de enxergar ou interpretar imagens. A pessoa pode enxergar com duplicidade ou não ver mesmo.
Sensibilidade e equilíbrio. "A pessoa perde a noção de onde o corpo está no espaço e pode cair", diz a médica.
Linguagem. Pode ocorrer afasia de compreensão, quando o paciente não entende o que falam para ele, ou afasia de expressão, que é a dificuldade para falar —as duas podem acontecer juntas. Paralisia facial também vai dificultar a fala e o ato de engolir. Aqui, o trabalho de fonoaudiologia é essencial.
Respiração. Segundo a fisiatra, às vezes é difícil para a pessoa entender como se respira, embora pareça intuitivo. Nesses casos, a fisioterapia respiratória entra em ação.
Distúrbios de comportamento. Depressão, irritabilidade e transtorno de personalidade podem ocorrer se o dano cerebral foi na região que controla as emoções. Em toda a reabilitação, o acompanhamento psicológico é importante. "A pessoa tem de entender o que está fazendo, ter um planejamento antes de executar o movimento. Para andar sem cair, tudo é pensando. O psicólogo também faz avaliação neuropsicológica, avalia memória, atenção e ajuda a construir o plano de terapias", diz Donati.
Reabilitação pode ser mais leve. Além de exercícios de força, trabalhar equilíbrio e mobilidade, arteterapia, musicoterapia e dança podem oferecer alívio para o paciente. "Fazer reabilitação exige muito da pessoa, então a gente tenta buscar os resultados com caminhos lúdicos também", afirma a médica.