Ela teve diarreia, foi diagnosticada com virose, mas era o coração parando
Simone Machado
Colaboração para VivaBem, em São José do Rio Preto (SP)
23/04/2025 05h30
A microempreendedora Ana Luiza Freitas, 22, precisou passar por um transplante de coração no ano passado. A moradora de Belo Horizonte relata que inicialmente foi diagnosticada com virose e, após diversas idas ao pronto-socorro, descobriu que tinha uma doença cardíaca grave.
Oito dias depois de ela entrar na fila à espera de um novo coração, Ana recebeu o órgão. A VivaBem, ela contou sua história.
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'Fui diagnosticada com virose'
Em agosto do ano passado, em uma quarta-feira, enquanto eu voltava da academia, comecei a sentir bastante dor abdominal e naquela noite não consegui dormir bem.
Na manhã seguinte, não consegui ir trabalhar: além das dores eu também estava com diarreia e depois passei a ter vômitos.
Por não apresentar melhora, busquei atendimento em um posto de saúde do bairro e fui diagnosticada com virose. O médico receitou soro e remédio para a dor.
Ana Luiza Freitas
Chegando em casa, continuei passando mal e, mesmo tomando as medicações, minha dor não melhorava. No mesmo dia, à noite, eu procurei uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento).
Lá a médica pediu vários exames, como de sangue, de urina e um raio-x. Segundo a profissional, eu estava com uma infecção de urina que poderia ser resultado da virose. Mais uma vez, fui medicada e voltei para casa.
Porém, a minha saga não terminava. Com cada vez mais dores e me sentindo mais fraca, fui mais uma vez à UPA no dia seguinte. Dessa vez em outra unidade, e lá meu diagnóstico foi de gastrite. Mais uma vez, tomei soro, medicamentos e retornei para casa.
'Meu corpo começou a inchar'
Quatro dias depois desse vai e vem de atendimentos, meu estado só piorava. Meu corpo começou a inchar e eu já estava com dificuldades para andar.
Consegui marcar uma consulta e alguns exames em um médico particular e, quando ele viu os resultados, veio o susto: eu estava com água no pulmão e meu coração estava inchado, com os batimentos alterados.
Ana Luiza Freitas
Retornei à UPA com os exames em mãos e o médico então decidiu me encaminhar para a internação para que o líquido do meu pulmão fosse retirado com medicações.
Durante a internação, fiz alguns exames e foi quando os médicos viram que a função do meu coração estava só em 14%. Permaneci internada e logo fui transferida para outro hospital com mais estrutura.
Lá fiquei sabendo que meu coração não estava respondendo à medicação e que precisaria de um transplante. O meu diagnóstico foi de insuficiência cardíaca com causa idiopática, ou seja, sem causa definida.
Foi um susto e chorei demais porque não queria aceitar. Eu estava com muito medo.
'Fui colocada na fila de transplante'
A equipe, que incluía uma psicóloga, passou a me acompanhar e fui inserida na fila de transplante.
Oito dias depois, eu estava dormindo quando a enfermeira entrou no quarto, me acordou e disse que havia um coração para mim. Foi um misto de susto e alegria.
Fui para a sala de cirurgia e, oito horas depois, eu estava com um coração novo. Fiquei no CTI (Centro de Terapia Intensiva) por 11 dias me recuperando da cirurgia e depois pude ir para o quarto.
Uma semana depois, tive alta e finalmente voltei para casa. Agora, seis meses após o transplante, minha vida está voltando ao normal.
Tomo alguns medicamentos para que meu corpo não rejeite o novo órgão e preciso cuidar melhor da minha alimentação, evitando açúcar, gordura e alimentos que não fazem bem à saúde.
O médico já me liberou para fazer pilates e aos poucos vou retomando a minha rotina."
Diarreia e vômitos podem ser sinais de problemas cardíacos
Vômito e dor abdominal são sintomas muito associados a infecções gastrointestinais, intoxicações alimentares ou viroses, mas também podem indicar problemas cardíacos —principalmente quando eles já estão avançados. Isso acontece porque, quando a irrigação sanguínea, feita pelo coração, é comprometida, diferentes órgãos podem ser afetados, incluindo os do trato gastrointestinal.
Problemas cardíacos que levem a uma menor ejeção de sangue pelo coração podem levar a sintomas como náuseas e fraqueza. A falta de suprimento sanguíneo cerebral e abdominal explica isso.
Sérgio Curcio, cirurgião cardiovascular com especialização em assistência circulatória mecânica e transplante cardíaco do Instituto de Doenças Valvares do Hospital Moriah
Diversas condições podem levar à insuficiência cardíaca. Algumas deles são: doenças genéticas, doenças estruturais do coração (doenças das válvulas cardíacas), hipertensão crônica mal controlada, doença coronariana, maus hábitos como tabagismo e alcoolismo. "No entanto, sabemos que, das miocardiopatias dilatadas (tipo de doença do músculo cardíaco que mais leva à insuficiência cardíaca no mundo), 50% delas ocorrem sem causa definida e, portanto, são definidas como idiopáticas", diz Curcio.
Quando é caso de transplante?
O transplante do órgão é indicado àqueles pacientes que têm alguma doença cardíaca grave, em que o tratamento com medicamentos não esteja fazendo efeito. Há também outras condições que podem fazer com que a pessoa precise de um transplante de coração, como a hipertensão e obstruções no órgão.
O transplante é indicado quando todo o tratamento foi esgotado, quando não há mais perspectiva de melhora do ponto de vista de medicamento ou outra cirurgia ou procedimento.
Fernando Bacal, cardiologista e coordenador do Programa de Insuficiência Cardíaca e Transplante do hospital Israelita Albert Einstein
Pessoas com a situação de saúde mais grave e com maior risco de morte vão para o início da fila de transplantes. Grupo sanguíneo, peso e altura são avaliados na hora de fazer a compatibilidade do órgão.
Tão ou mais importantes que a cirurgia do transplante cardíaco são os cuidados pós-operatórios. Eles começam desde o primeiro dia após a cirurgia e se estendem para a vida toda, segundo os especialistas. Dentre os cuidados, está o uso de imunossupressores, medicamentos que impedem que o organismo rejeite o novo órgão.
O paciente pós-transplante tem uma vida muito próxima da normalidade, inclusive liberado para atividade física. A questão é que ele vai tomar remédios para evitar rejeição do órgão e são muitos imunossupressores que devem ser tomados durante a vida toda. Existe uma tendência à diminuição da dose desses medicamentos depois do sexto mês do transplante.
Fernando Bacal, cardiologista