'Bed Rotting': tendência de ficar na cama pode ser considerada autocuidado?

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Quem nunca quis passar o dia inteiro enfiado debaixo das cobertas? Muitas vezes o ritmo frenético com que levamos nosso dia nos faz desejar momentos de pausa para recarregar as energias.
Porém, uma tendência surgida nas redes sociais elevou essa vontade a outro patamar. A expressão "bed rotting", que pode ser traduzido do inglês como "apodrecendo na cama", refere-se a passar horas (ou até o dia inteiro) deitado sem fazer nada, apenas mexendo no celular.
Essa ideia começou como uma forma de protesto, principalmente entre os jovens, contra a pressão e a correria da vida moderna. Com a ajuda da internet, ela se espalhou e passou a ser vista por muitos como um tipo de autocuidado.
"Mas é uma distorção, não tem a ver com autocuidado, mas com procrastinação", analisa o psiquiatra Henrique Bottura. Para o médico, procrastinar é definido como o espaço de tempo entre a consciência de que se tem afazeres e o não agir para solucioná-los.
Fuga para debaixo do cobertor
Quando se estuda ou trabalha demais, tirar um tempo livre de vez em quando faz bem e pode, sim, ser considerado um tipo de autocuidado. Isso ajuda tanto o corpo quanto a mente — melhora o sono, relaxa, dá espaço para fazer coisas de que gostamos.
Agora, "apodrecer" na cama é um mau sinal. "É um ato de autossabotagem que nos faz adiar tarefas, encontros, decisões, deixar atividades para última hora, o que resulta em ansiedade, estresse, culpa, perda da produtividade", explica a terapeuta clínica Larissa Fonseca.
Segundo a psicóloga, o "bed rotting", quando adotado como hábito, pode levar a um ciclo vicioso de evasão que impede o enfrentamento e a resolução de desafios. Como consequência, sem saber lidar com responsabilidades, problemas e obrigações, sentimentos conflitantes tendem a se acumular e ficar mais intimidadores.
Celular piora a falta de vontade

A falta de vontade de sair da cama e enfrentar o dia pode ter várias causas:
Cansaço emocional — quando estamos sobrecarregados, tendemos a adiar compromissos.
Dificuldade de se organizar
Falta de foco
Medo de fracassar
Baixa autoestima
São sinais de adoecimento psicoemocional e que podem agravar com uso do celular.
Passar horas e horas na cama com a tecnologia digital pode gerar dependência. Esta, por sua vez, pode causar perda de interesse pelo mundo real e, em casos graves, transtornos e quadros psicóticos, fora má postura e dores. Bruno Pascale Cammarota, psiquiatra e mestre em saúde pública
Smartphones ainda são prejudiciais sobretudo se manipulados antes de dormir, pois a luz azul de suas telas reduz a produção de melatonina, o hormônio do sono. Mesmo durante o dia, se usado continuamente na cama, o celular pode hiperativar e condicionar o cérebro a conteúdos incessantes e recompensas não funcionais, e fazer você não associar mais sua cama exclusivamente à sensação de descanso.
Como sair da cama e garantir bem-estar
Se a procrastinação advém do desejo de escapar de pressões que podem ser tanto externas como internas, o primeiro passo é reconhecer a presença de problemas e buscar solução para eles.
"É necessário identificar se o quadro é decorrente de transtorno ou não. Se for, seria importante uma abordagem psicoterápica e medicamentosa. Do contrário, identificar qual a motivação e enfrentá-la com suporte profissional", orienta José Brasileiro, psiquiatra e professor.
É igualmente importante equilibrar o tempo livre com atividades físicas, exposição à luz natural, passatempos e interações sociais para preservar tanto a saúde mental quanto a física. Definir também limites para não exceder na produtividade, afinal muitas horas de trabalho levam a mais cansaço, que leva à procrastinação.
Outras mudanças que podem evitar uma fuga para debaixo das cobertas incluem:
Não faça tudo de uma vez: dê pausas entre as tarefas, isso ajuda a recarregar as energias e diminuir o risco de procrastinação.
Fuja do perfeccionismo: a insegurança de falhar ou não corresponder às expectativas pode levar ao adiamento de afazeres.
Mantenha um calendário ou agenda com datas, prazos, prioridades: isso evita sobrecargas desnecessárias.
Organize o local de estudo ou trabalho: isso melhora a produtividade e evita distrações.
Aproxime-se de pessoas ativas, dinâmicas: inspire-se nos hábitos delas.
Desative notificações no celular: vale reservar momentos específicos para verificar mensagens e redes sociais. E evite usar o celular para entretenimento excessivo.
Estabeleça uma rotina diária: ela deve incluir horários fixos para se deitar e levantar.
Em vez de falar sobre o que deseja fazer, aja: comece devagar e progrida.
Aproveite o foco: use os momentos de maior disposição para cumprir o que é trabalhoso.
Fuja um pouco das telas para se divertir: pense em atividades de que você gosta e que não envolvam o uso de telas.
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