'OAB da medicina': o que é a proposta, quem apoia e quem critica?

Um projeto de lei (PL 2294/2024), de autoria do senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP), propõe a criação do Exame Nacional de Proficiência em Medicina, exigido para o profissional conseguir o CRM e exercer a profissão no Brasil —uma espécie de "OAB da medicina".

Aprovada na Comissão de Educação do Senado, a proposta aguarda análise na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) e, por ter caráter terminativo, pode seguir direto para a Câmara dos Deputados. Entenda a proposta e o que dizem entidades ligadas ao setor.

Entenda a proposta

Se a proposta for aprovada, o exame seria coordenado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina). A entidade ficaria responsável pela gestão e aplicação da prova em parceria com os conselhos regionais de medicina.

A aprovação no exame será obrigatória para exercer a medicina, segundo a proposta. Somente os candidatos aprovados poderão obter registro no CRM e atuar profissionalmente, de acordo com o texto do projeto.

O projeto prevê a aplicação da prova duas vezes ao ano. O exame ocorreria em todos os estados e no Distrito Federal, permitindo que formandos realizem a avaliação logo após a graduação.

O objetivo, segundo o projeto, é garantir competências mínimas. A ideia é que o teste avalie conhecimentos teóricos, habilidades clínicas e competências profissionais e éticas para assegurar um padrão mínimo na formação médica.

Quem apoia e quem é contra?

O projeto tem forte apoio do CFM. A entidade defende a medida como uma forma de garantir a qualidade dos profissionais e evitar que médicos sem preparo adequado ingressem no mercado.

A ideia é ser mais ou menos como uma OAB dos médicos. É um exame que vai definir quem tem a qualificação mínima para poder se inscrever no CRM e trabalhar como médico.
Francisco Cardoso, conselheiro federal de medicina por São Paulo e vice-corregedor do CFM

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O exame ajudaria a controlar a proliferação de escolas médicas sem estrutura, na opinião do CFM. "Atualmente, muitas faculdades são abertas sem nenhum tipo de controle, o que já impacta a qualidade dos profissionais. O exame garantiria um padrão mínimo e daria mais segurança para a sociedade", diz Cardoso.

O CFM acredita que a medida protege os pacientes. "O paciente só tem a ganhar porque vai ter acesso a médicos com a qualificação mínima necessária para um bom exercício da medicina", acrescenta Cardoso.

O Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) sugere um modelo de avaliação seriada. "O ideal seria que os alunos fossem avaliados desde a faculdade, com três provas ao longo da graduação. Assim, haveria mais tempo para correção e aprimoramento", afirma Angelo Vattimo, presidente do Cremesp.

A medicina está cada vez mais cara com novas tecnologias. Profissionais mal formados podem aumentar ainda mais os custos para o SUS e a saúde suplementar ao pedirem exames desnecessários.
Angelo Vattimo, presidente do Cremesp

A APM (Associação Paulista de Medicina) também é favorável. "Infelizmente, a má qualidade dos cursos de medicina no país tem gerado profissionais com uma formação abaixo das necessidades do Sistema Único de Saúde e atendimento no geral", afirma Antonio José Gonçalves, presidente da APM a VivaBem.

Já as associações que representam faculdades particulares veem a medida como uma barreira. "Já existem atualmente mecanismos e legislações específicas para assegurar a qualidade da atuação médica no país, com fiscalização realizada pelos conselhos federal e regionais de medicina, além de órgãos governamentais, como o Ministério da Saúde. O aprimoramento desses instrumentos tende a gerar resultados mais consistentes e duradouros do que a simples aplicação de uma prova ao final da graduação", afirma Celso Niskier, diretor presidente da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior) a VivaBem.

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A criação de uma nova etapa entre a conclusão do curso e o início do exercício profissional pode representar uma barreira de entrada significativa, especialmente após anos de dedicação à formação. A aplicação de uma prova teórica ao final do curso não contempla de forma eficaz as necessidades dos estudantes e nem da sociedade.
Celso Niskier, diretor presidente da ABMES

O Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo) afirmou que é contra a criação do exame nacional de medicina. Para a entidade, a proposta é desnecessária, "representa retrocesso e não traz benefícios aos profissionais de saúde e à população".

Para o Semesp, as diversas avaliações durante o período de curso são suficientes para garantir a qualidade de formação. "Os estudantes de medicina já passam por um rigoroso processo de avaliações ao longo dos seis anos de formação. As instituições de ensino superior seguem diretrizes curriculares estabelecidas pelo MEC e têm seus cursos avaliados a cada três anos", diz o Semesp, em nota a VivaBem.

Já existem instrumentos como o Enade [Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes], o Revalida [para avaliar médicos formados no exterior] e o Enare [Exame Nacional de Residência], em que os formandos são submetidos a rigorosos exames que garantem e atestam a qualidade do ensino.
Semesp, em nota

A prova não vai refletir a qualidade real dos estudantes em formação, de acordo com o Semesp. Para Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp, "submeter os estudantes a mais uma prova, após seis anos de avaliações sistemáticas e monitoradas pelo MEC, é uma medida sem embasamento e que não refletirá as reais competências e habilidades necessárias para o exercício profissional".

Para a Anup (Associação Nacional das Universidades Particulares), entre outros pontos, a prova poderia dificultar a presença de profissionais em áreas remotas do país. "A imposição de uma prova final poderia agravar a escassez de médicos em regiões remotas, aumentar a desigualdade de acesso à profissão e desincentivar a formação de novos profissionais", diz a Anup por meio de nota.

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