Como tentativa de ataque hacker no Ipen pode impactar tratamento de câncer

Uma tentativa de ataque cibernético ao Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) na sexta-feira (28) provocou a suspensão temporária da produção de medicamentos radioativos essenciais para tratamentos médicos no Brasil. A interrupção impacta cerca de 90 mil pacientes que dependem desses fármacos.

Os medicamentos afetados são os chamados radiofármacos de meia-vida superior a duas horas. Eles são usados principalmente para o diagnóstico e tratamento de alguns tipos de câncer.

Entre os que deixaram de ser produzidos nos últimos dias estão o Iodo-131, usado contra câncer de tireoide; o Lutécio-177, aplicado em tumores neuroendócrinos; e o Gerador de Tecnécio-99m, usado em exames de imagem. Também estão suspensas a produção de Tálio-201, usado em diagnóstico cardíaco; Guan-IPEN-131 (MIBG) para tratamento de neuroblastoma e Citrato de gálio-67 usado no diagnóstico de infecções e cânceres.

"A produção desses medicamentos é semanal já que eles possuem baixa durabilidade devido ao decaimento radioativo. Os insumos base para a produção desses radiofármacos são importados e o prejuízo estimado é de R$ 3 milhões", explica Francisco Rondinelli Júnior, presidente da Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear), a VivaBem.

No Brasil, a produção e distribuição desses radiofármacos é monopólio da União, ou seja, é exclusiva de órgãos públicos do governo federal. Autarquia gerida pela Cnen, o Ipen atende 85% da demanda nacional de medicina nuclear.

A paralisação da produção e do fornecimento está prevista para durar pelo menos mais uma semana.

Erick Rauber, radio-oncologista, diretor de Comunicação da Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT) explica que pacientes que estão passando por tratamentos de radioterapia não serão afetados. Esses fármacos são usados naqueles que estão passando por terapia de medicina nuclear.

Para ele, se o problema for resolvido no tempo estimado pelo Ipen, o impacto será pequeno para os pacientes.

"Normalmente essa terapia é complementar e realizada após a cirurgia para retirada do tumor. Isso significa que a doença não está mais ativa e crescendo, por isso, suspender o tratamento por uma ou duas semanas, tem como impacto o fato de retardar o tratamento", diz.

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De acordo com a Cnen, as tentativas de invasão foram detectadas na rede da instituição, exigindo medidas emergenciais para conter uma invasão e ataque hacker. Equipes de tecnologia da informação foram mobilizadas para corrigir as vulnerabilidades e minimizar os impactos.

Como precaução, a conexão com a internet foi interrompida, impedindo acessos externos até que a segurança do sistema seja totalmente restabelecida.

"Sabemos que hackers fazem ataques desse tipo para pedir resgate posteriormente. Mas detectamos antes deles se instalarem em nossos sistemas. Porém é preciso fazer uma vistoria minuciosa em toda a rede e banco de dados para termos certeza de que não há nenhum vírus instalado", acrescenta Rondinelli Júnior.

A SBMN (Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear) também vem colaborando com o Ipen para resolver o problema e reestabelecer o sistema.

"A SBMN está colaborando ativamente para ajudar na resolução do problema e reduzir os impactos da suspensão no fornecimento de radiofármacos. A SBMN tem mantido diálogo contínuo com o Ipen/Cnen e com profissionais da área para buscar alternativas que reduzam os prejuízos à cadeia de abastecimento e contribuam para a manutenção do atendimento médico", disse em nota.

O caso foi encaminhado à Polícia Federal que investiga de onde partiu ataque. Ainda não há informações sobre sua autoria.

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O que são os radiofármacos

Os radiofármacos são agrupados de acordo com o tempo de seu decaimento radioativo, ou seja, ele é dividido em dois grupos distintos conforme o tempo em que os átomos reduzem suas emissões radioativas.

O primeiro grupo é formado por radiofármacos com meia-vida igual ou inferior a duas horas. Isso significa que a cada duas horas há um decaimento radioativo de metade de sua carga, o que exige que a produção e o uso sejam calibrados de forma a tirar o melhor proveito das suas características.

Nesse grupo estão aqueles usados na tomografia por emissão de pósitrons, conhecido pela sigla PET, que é utilizada em diagnóstico para avaliar a estrutura dos ossos e de órgãos como pulmão, fígado e cérebro.

O outro grupo é formado pelos radiofármacos com meia-vida superior a duas horas. São esses os que tiveram a produção e distribuição afetadas.

Esse grupo é composto por 37 radiofármacos, cada um com características próprias de meia-vida. Alguns deles, como o Tecnécio-99m, por exemplo, tem decaimento radioativo a cada seis horas.

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