Anos ouvindo: veja o que psicólogos e terapeutas aprenderam no consultório

Depois de anos ouvindo histórias de vida no consultório, psicólogos e terapeutas acumulam não apenas experiência clínica, mas também preciosos aprendizados sobre comportamento humano. A seguir, veja reflexões e conselhos que esses profissionais descobriram ao longo de suas carreiras e que podem ajudar você a se entender melhor e ter relacionamentos mais saudáveis.

As pessoas têm muito menos conversas significativas do que deveriam

"Uma das conclusões mais interessantes a que cheguei é a de que a psicoterapia não depende tanto da técnica ou teoria, mas boa parte do que satisfaz as pessoas nesse processo é simplesmente ter um espaço para conversas significativas", conta Guilherme Spadini, médico psiquiatra, psicoterapeuta e professor da The School of Life. "Na vida cotidiana, jogamos conversa fora ou brigamos. Dificilmente nos sentamos com alguém importante para nós para conversarmos profundamente sobre a vida quando tudo está bem", afirma.

Segundo ele, essa é uma dinâmica muito comum em casais: as "DRs" acontecem só quando alguém está muito ferido, chateado ou nervoso, e elas raramente são produtivas. A solução? Parar com mais frequência para conversar sobre o que mais nos importa com as pessoas com quem mais nos importamos, quando tudo está bem e ambos estão tranquilos. "Eu costumo brincar que um gravador tocando a frase 'Mas você já conversou com ele/ela sobre isso?' substituiria 90% do meu trabalho", diz.

Relacionamentos não sobrevivem sem diálogo

Elídio Almeida, psicólogo formado pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), também acredita que a comunicação está na raiz da maioria dos conflitos da relação —e na forma de resolver essas questões e melhorar o relacionamento. Ele conta que, ao longo de sua prática, conheceu muitos casais que, apesar de não terem mais aquela paixão avassaladora do início do namoro, se amavam e ainda conseguiam manter uma relação funcional porque sabiam dialogar e negociar suas diferenças. Por outro lado, também encontrou diversos casais que estavam apaixonados, mas presos a padrões de comunicação destrutivos, egocêntricos e agressivos, o que minava a relação a ponto de torná-la insustentável.

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Imagem: Getty Images

"Os sentimentos podem mudar ao longo do tempo, mas a forma como um casal se comunica é o que determina a qualidade e a longevidade da relação", garante. Ele explica que quando o diálogo se perde, qualquer dificuldade se transforma em um problema maior do que realmente é. "Os casais vão acumulando frustrações não resolvidas, mágoas não tratadas e há uma sensação de que a relação se sustenta em fragilidades que podem ceder a qualquer momento", diz.

Uma mágoa não conversada pode se transformar em indiferença, e, com o tempo, a relação pode se tornar apenas uma convivência desgastada, onde os parceiros continuam juntos não porque se fazem bem, mas porque não sabem como sair dessa dinâmica. Elídio Almeida, psicólogo formado pela UFBA

Relacionamentos não precisam ser perfeitos, mas precisam ser seguros

É comum acreditar que o amor, por si só, pode superar qualquer obstáculo. Mas, segundo a psicóloga Desirée Cassado, mestre pela USP e professora da The School of Life, o que realmente sustenta uma relação saudável não é a ausência de conflitos, e sim a presença de segurança emocional.

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"Isso significa saber que você pode expressar suas necessidades sem medo, que seus sentimentos serão levados a sério e que há respeito mútuo. Se uma relação te faz sentir constantemente inseguro, em alerta ou com medo de errar, isso não é normal, é um sinal de que algo precisa ser revisto. Amor sem segurança emocional pode ser intenso, mas dificilmente será sustentável ou saudável", enfatiza.

A voz de dentro da sua cabeça não é a verdade absoluta

Muitas pessoas vivem presas em narrativas internas autocríticas, convencendo-se de que não são boas o suficiente, que vão fracassar ou que não merecem certas coisas. Segundo Cassado, essas vozes não surgem do nada —elas são aprendidas ao longo da vida e reforçadas por experiências dolorosas.

"Um pensamento não é um fato. Questionar essas narrativas internas, observar de onde vêm e desenvolver um diálogo mais compassivo consigo mesmo pode transformar profundamente a forma como nos relacionamos com o mundo. Se você não falaria com um amigo da forma como fala consigo mesmo, talvez seja hora de mudar esse discurso interno", aconselha.

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Nem todo conflito precisa ser resolvido imediatamente

A urgência em consertar desentendimentos pode levar a diálogos forçados e mal resolvidos. Para Yuri Busin, psicólogo e doutor em neurociência do comportamento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, essa pressa fala muito mais sobre nossas angústias e necessidade de controle do que realmente o entendimento das situações. "Algumas questões precisam de tempo, maturação e, às vezes, até da distância necessária para que sejam compreendidas. O silêncio e a pausa não significam indiferença, mas sim um espaço para reorganizar pensamentos e emoções antes de uma conversa mais produtiva", diz.

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Você não é obrigado a perdoar ninguém

Freud disse que tudo compreender não é tudo perdoar. "Perdão tem um componente subjetivo, será de um jeito para cada pessoa, significará uma coisa para cada pessoa, e não é necessário que perdoemos alguém para elaborar nossas questões e viver uma vida mais autêntica. O perdão é da seara religiosa, enquanto a elaboração e integração estão na seara psicológica", diz Thais Basile, psicanalista e autora do livro "Atravessando o Deserto Emocional".

Segundo a especialista, inclusive, quando falamos em trauma e questões difíceis da infância, o mais importante é se perdoar, trabalhando as culpas inconscientes, porque podemos entender que causamos aquilo que nos aconteceu porque éramos difíceis, não-amáveis, incapazes etc.

Também é importante conseguir diminuir o tamanho daquele que nos causou mal, entendendo que as questões daquela pessoa respingam em nós, mas não são um problema exatamente conosco. As pessoas deslocam para nós suas questões mal resolvidas da própria infância. Uma relação é feita de comprometimento e esforço dos dois lados, não pode ser unilateral. Existem casos em que isso não será possível. Thais Basile, psicanalista e autora do livro "Atravessando o Deserto Emocional"

Não tome grandes decisões movido por emoções intensas

Segundo Liliana Seger, psicóloga e coordenadora do Programa para o Transtorno Explosivo Intermitente do Pro-Amiti (Programa Ambulatorial dos Transtornos do Impulso) do IPq-FMUSP (Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP), emoções como a raiva e a paixão alteram nossa percepção da realidade, levando a atitudes impulsivas que muitas vezes geram arrependimentos. Quando estamos com raiva, é comum agir de forma reativa, dizendo ou fazendo coisas que não refletimos com clareza. Já a paixão pode criar uma falsa sensação de urgência e idealização.

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"Respire, dê um tempo e espere passar", sugere, destacando que o distanciamento emocional permite que as decisões sejam tomadas de forma mais clara.

Pais que escutam constroem conexão, não perdem autoridade

Para o psicólogo Alexandre Coimbra Amaral, autor dos livros "Toda Ansiedade Merece Um Abraço" e "Cartas de Um Terapeuta", quando nossos filhos apontam nossas incoerências, estamos diante de uma oportunidade valiosa: abrir um diálogo genuíno.

"É um tipo de conversa pouco comum, em que o papel de autoridade cede espaço à escuta verdadeira —e, naquele momento, nos tornamos aprendizes", diz. Ele ressalta que ouvir os filhos com respeito não diminui a autoridade dos pais —ao contrário, as fortalece. "A conexão se dá pelo respeito, o que só aumenta quando o erro pode virar palavra, pode virar reparação e pode terminar com um abraço honesto. Reaprender a ser autoridade é daqueles momentos em que podemos, como em poucos outros, sentirmo-nos renascendo para a vida", diz.

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