Qual a relação entre obesidade e gordura no fígado, uma doença silenciosa

A obesidade é um problema de saúde que não para de crescer e, junto com ela, outros doenças tornam-se mais comuns. É o caso da esteatose hepática, popularmente conhecida como "gordura no fígado".

Estudos estimam que 35% dos brasileiros com mais de 35 anos têm a doença hepática. Além disso, a América do Sul foi o continente que registrou maior crescimento do problema (39%) entre 1990 e 2019.

A esteatose hepática é caracterizada pelo acúmulo anormal de gordura nas células do fígado, provocado pelo excesso de álcool e por causas não alcoólicas —entre elas, sobrepeso e obesidade, diabetes, colesterol alto, má alimentação, uso de certos medicamentos e inflamações crônicas associadas à hepatite ou a outras doenças hepáticas.

"A obesidade está associada a um risco aumentado importante para desenvolver a doença hepática gordurosa metabólica, que tem evolução silenciosa, muitas vezes sem sintomas associados." Henrique Carvalho Rocha, hepatologista do Hospital Brasília Águas Claras, no Distrito Federal.

Em longo prazo, a gordura no fígado causa uma inflamação crônica que prejudica o funcionamento do órgão —o que pode, inclusive, levar a outros problemas mais graves, como hepatite gordurosa, cirrose hepática e até câncer.

Estima-se que um terço dos transplantes de fígado no Brasil seja feito em pacientes que tiveram complicações após o diagnóstico de esteatose hepática.

E os problemas não ficam restritos ao fígado. O acúmulo de ácidos graxos no órgão prejudica a função da insulina, aumentando o nível de glicose (açúcar) no sangue, a piora da coagulação e a inflamação do organismo, o que eleva o risco de infarto e AVC, conforme explicou Paulo Rosenbaum, endocrinologista do Centro de Prevenção e Tratamento da Obesidade Einstein, à Agência Einstein.

Obesidade x gordura no fígado

O fígado é uma glândula localizada no lado direito do abdome e possui diversas funções, como desintoxicar o organismo, produzir colesterol, sintetizar proteínas e armazenar glicose, na forma de glicogênio.

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O órgão também produz a bile, um composto que ajuda no processo de eliminação de toxinas e na digestão dos lipídios. Assim, a presença de um pouco de gordura no fígado é absolutamente normal. Mas, quando o índice de infiltração de gordura ultrapassa 5% do seu volume, a situação começa a se complicar.

A relação entre a obesidade e a esteatose hepática ocorre pois a gordura acumulada no corpo, especialmente na região abdominal, não fica só no tecido adiposo e pode se infiltrar nas células dos órgãos, incluindo aí o fígado e até o coração.

Mas engana-se quem acha que somente pessoas com IMC altíssimo correm risco. Segundo Henrique Sérgio Coelho, hepatologista do Hospital São Lucas Copacabana (RJ), muitas vezes, basta o paciente estar com sobrepeso ou ter grande quantidade de gordura visceral (a que se acumula no abdome, entre vísceras e órgãos) para ter um risco considerável de desenvolver a esteatose hepática.

Diagnóstico e evolução

Como muitas doenças que acometem o fígado, a esteatose hepática não apresenta sintomas na maioria dos casos iniciais. "Geralmente, a doença é silenciosa e a pessoa acumula gordura no fígado sem saber", explica Coelho.

O acúmulo de gordura no órgão pode ser visualizado em ultrassom abdominal e, em cerca de 40% dos casos, provocar alterações nas enzimas hepáticas como a TGO, TGP, fosfatase alcalina, gama glutamil transferase e as bilirrubinas (o que pode ser conferido em exame de sangue).

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Em alguns casos, o quadro inicial pode causar sintomas, mas bastante inespecíficos, ou seja, que também estão presentes em outros quadros de saúde, inclusive algumas infecções virais. "Podemos falar em fadiga, falta de apetite, náuseas e dores abdominais", afirma Rodrigo Surjan, médico cirurgião do Hospital Nove de Julho, de São Paulo.

Já nas fases avançadas, quando pode haver complicações como a cirrose, Surja explica que há sintomas mais típicos, como urina escurecida, pele e mucosas amarelas e a presença de fezes claras, entre outros.

Como é feito o tratamento?

A principal causa da esteatose hepática é a obesidade. Por isso, a melhor forma de prevenir e também tratar o problema é justamente reduzir a gordura corporal.

"Todo o tratamento gira em torno da perda de peso que, como consequência, leva à diminuição de gordura no fígado. A partir de 5% de perda do peso corporal já se percebe melhora da doença." Henrique Carvalho Rocha, hepatologista do Hospital Brasília Águas Claras (DF)

O tratamento da obesidade envolve várias abordagens, conduzidas por diferentes especialistas:

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É preciso manter uma alimentação equilibrada e balanceada —e, por isso, recomenda-se o acompanhamento com nutricionista, especialmente para quem precisa passar por um processo de reeducação alimentar.

O acompanhamento psicológico pode também ser importante, especialmente se o excesso de calorias vem de episódios de compulsão alimentar ligados a situações emocionais.

Além disso, é preciso praticar atividade física de forma regular, não ingerir bebida alcoólica e não fumar para não levar a uma piora progressiva da doença.

Também é importante melhorar a qualidade do sono e controlar o estresse.

"É preciso entender que a obesidade é uma doença crônica e que, por isso, precisa ser tratada por toda a vida", relata Coelho.

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