O que acontece no seu corpo quando você vomita depois de tomar remédio
Cristina Almeida
Colaboração para VivaBem
28/01/2025 05h32
Você precisa usar um determinado medicamento, quer colaborar com o tratamento, mas na hora de tomá-lo sente náusea e vomita? Saiba que, na maioria das vezes, tal reação não se trata de um problema grave e ele pode ser controlado.
Vomitar é um sintoma que tem entre suas variadas causas o uso de medicações, destacando-se entre elas as indicadas para tratar a dor (analgésicos), mas entram nessa lista até alguns remédios vendidos sem receita médica, como os suplementos de ferro e potássio, e ainda os AINE (anti-inflamatórios não esteroidais), como o AAS (ácido acetilsalicílico).
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Esse tipo de manifestação é mais frequente entre pessoas que são naturalmente mais sensíveis aos fármacos, e também entre as que fazem uso de vários remédios ao mesmo tempo, ou quando as doses dos medicamentos são altas. Vômitos após tomar medicações não estão associados a alergias.
Entenda o mecanismo do vômito
O sintoma decorre de uma contração do estômago capaz de empurrar o seu conteúdo em direção ao esôfago, expelindo-o pela boca.
Na maioria das vezes o sintoma é acompanhado pelo enjoo (náusea), aquela sensação desagradável que sinaliza que você vai vomitar.
A sua função é esvaziar o estômago, promovendo a melhora da náusea.
Vomitar pode ser uma defesa natural do corpo pela ingestão de algum tipo de toxina. Mas também pode estar associado ao uso de medicamentos, ao movimento, à anestesia, ao estresse e até ao medo.
Essa resposta do organismo depende da ação coordenada pelo SNC (sistema nervoso central), em uma região do cérebro conhecida como centro do vômito —que se comunica com o sistema gastrointestinal.
Por que seu corpo reage assim aos remédios
Algumas classes específicas de fármacos estão associadas ao sintoma, e esse efeito pode estar mais ou menos presente a depender da presença de variados fatores, como sensibilidade natural ou doenças pré-existentes, sobretudo no sistema gastrointestinal, como a úlcera.
Conheça alguns desses medicamentos:
- Quimioterápicos
Náuseas e vômitos são efeitos esperados após a administração desse tipo de medicamento, e os sintomas podem aparecer de forma tardia e até antecipada.
Neste último caso, algumas circunstâncias, como sentir odores associados ao hospital, ou mesmo ouvir o barulho de instrumentos médicos podem atuar como um gatilho, mesmo antes do início da administração do medicamento.
Náuseas e vômitos são considerados os mais temidos e também os mais comuns efeitos adversos desse tipo de tratamento.
Sabedores disso, os médicos têm à disposição estratégias para driblar esses sintomas.
São exemplos a educação dos pacientes sobre medidas práticas (como tomar determinado medicamento de estômago cheio); uso de antieméticos, remédios que previnem e controlam esse tipo de manifestação.
São fatores que aumentam a probabilidade de vomitar: ter tido o sintoma em ciclo de quimioterapia anterior; tipo de antiemético usado (eles possuem diferentes mecanismos de ação); sexo; idade; uso de álcool, vômito associado à gravidez e enjoo do movimento. Dados publicados pelo Cancer Treatment and Research Communications.
- Antibióticos
Embora sejam úteis para o tratamento de variadas enfermidades, esses fármacos podem causar efeitos indesejados. Como não dá para prever se eles serão graves ou não, a melhor saída é usá-los pelo menor tempo possível e sob as orientações de um médico.
Uma pesquisa publicada na revista oficial dos Médicos da Família do Canadá esclarece que todos os antibióticos podem causar efeitos gastrointestinais; na maioria das vezes eles decorrem de alterações da microbiota intestinal.
Náuseas e vômitos, diarreia, dor abdominal, perda do apetite e gases são os sintomas mais comuns.
- Analgésicos opioides
Essa classe de medicamentos é utilizada para o tratamento da dor associada a variadas enfermidades e se relaciona a diferentes efeitos adversos. Os mais frequentes são náuseas e vômitos. As razões para isso podem ser:
Esses medicamentos podem irritar o estômago.
E também a orelha interna (ouvido interno), onde se localiza o sistema de equilíbrio do corpo, provocando tontura, náusea e vômito.
Eles ainda interferem nos movimentos intestinais: gases e enjoo são as queixas associadas.
São exemplos dessas medicações: hidrocodona, morfina, oxicodona.
- Antidepressivos
Uma recente revisão de estudos científicos levantou dados sobre a relação entre o uso desse tipo de medicamentos e efeitos adversos no sistema gastrointestinal. Entre todos os tipos hoje disponíveis, os ISRS (inibidores seletivos da recaptação da serotonina) são os mais associados às náuseas e vômitos, principalmente entre as pessoas que usam fluoxetina.
O uso de venlafaxina apresentou maiores taxas desses sintomas quando comparado com outros ISRS e a duloxetina, que integra outra classe de antidepressivos.
Entre os medicamentos atuais, observou-se que entre as pessoas que usam vortioxetina, esses efeitos indesejados são mais comuns na primeira semana do tratamento e eles ainda se relacionam à dose indicada pelo médico.
Nesta revisão, a sertralina e o escitalopram foram os antidepressivos menos tolerados pelo trato gastrointestinal. Dados publicados pela revista médica Progress in Neuro-Psychopharmacology and Biological Psychiatry.
Vomitei, devo tentar de novo?
Depende. Se o vômito era uma reação esperada, você pode ter recebido orientações de seu médico sobre a melhor estratégia para evitar o sintoma. Assim, você deve colocar em prática essas orientações.
Já nos casos de automedicação, evite tomar outra dose e busque a avaliação de um médico para que ele possa investigar as possíveis causas dessa reação e indicar o tratamento que você precisa.
Saiba quando falar com o seu médico
Os especialistas consultados são unânimes: caso você não consiga tomar o medicamento indicado porque vomita imediatamente, o melhor a fazer é falar com o médico que o prescreveu para que ele investigue a causa dessa reação e possa verificar a possibilidade de mudar a estratégia de tratamento.
Busque por orientação médica imediata caso esteja vomitando por mais de 4 horas, as náuseas não passem, ou no caso de você observar a presença de sangue no vômito.
Semaglutida (Ozempic e Wegovy) pode ter esse efeito?
Sim, efeitos gastrointestinais (leves a moderados) podem aparecer.
Náusea e vômito entram na lista, mas a literatura médica também inclui diarreia, constipação, queimação no estômago (dispepsia), além de dor abdominal.
Ainda não foi totalmente esclarecido porque isso acontece, mas os cientistas acreditam que seja o resultado do retardo do esvaziamento do estômago (gástrico) promovido pelo medicamento.
Na maioria das vezes, esses quadros são temporários, gerenciáveis e podem ser resolvidos sem que seja necessário parar o tratamento.
Sem medo de vomitar
Para reduzir esse risco, a regra geral é evitar a automedicação e fazer uso racional de medicamentos, utilizando-os na forma e pelo tempo prescrito pelo seu médico, e com a orientação de um farmacêutico de sua confiança.
O uso inadequado de medicamentos aumenta a probabilidade de efeitos indesejados e danos à saúde.
Observe sua reação nos primeiros dias após o início do tratamento, ou quando houve aumento da dose do medicamento. A depender de como seu organismo se comporta, converse com seu médico para saber se existem medidas que poderiam driblar o mal-estar.
Pessoas com constipação devem investir em uma dieta rica em fibras, boa hidratação e exercícios físicos para manter as idas ao banheiro em dia.
Caso tenha dúvidas sobre determinado medicamento, volte a falar com o médico ou o farmacêutico para que eles esclareçam a forma correta de tomar o medicamento, possíveis reações e interações com outros medicamentos.
Fontes: Amouni Mourad, farmacêutica, assessora técnica do CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo) e coordenadora do curso de farmácia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); Miguel Angelo Nobre e Souza, médico gastroenterologista, professor associado da Faculdade de Medicina da UFC (Universidade Federal do Ceará), chefe da Unidade de Gastroenterologia e Cirurgia Digestiva do Hospital Universitário da mesma instituição, e que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); e Natan Chehter, clínico geral e geriatra membro da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia) e do Hospital Estadual Mário Covas (Santo André/SP). Revisão técnica: Amouni Mourad.
Referências:
Qin W, Yang J, Deng C et al. Efficacy and safety of semaglutide 2.4 mg for weight loss in overweight or obese adults without diabetes: An updated systematic review and meta-analysis including the 2-year STEP 5 trial. Diabetes Obes Metab. 2024. Disponível em https://doi.org/10.1111/dom.15386
Gupta K, Walton R, Kataria SP. Chemotherapy-Induced Nausea and Vomiting: Pathogenesis, Recommendations, and New Trends. Cancer Treat Res Commun. 2021. Disponível em
https://doi.org/10.1016/j.ctarc.2020.100278
Oliva V, Lippi M, et al. Gastrointestinal side effects associated with antidepressant treatments in patients with major depressive disorder: A systematic review and meta-analysis. Prog Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry. 2021. Disponível em https://doi.org/10.1016/j.pnpbp.2021.110266
Mohsen S, Dickinson JA, Somayaji R. Update on the adverse effects of antimicrobial therapies in community practice. Can Fam Physician. 2020. Disponível em https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC7491661/