Há duas proteínas envolvidas na doença de Alzheimer: amiloide e tau. A maioria dos remédios - inclusive os aprovados recentemente pela FDA (Food and Drug Administration), a instituição que administra alimentos e medicamentos nos Estados Unidos - estão concentrados na remoção da amiloide. Até o momento, no entanto, houve pouco foco na eliminação dos "emaranhados" da proteína tau. A novidade é que o novo spray nasal concentra-se justamente nela.
Em um cérebro saudável, a tau, entre outras coisas, ajuda a manter a estrutura de suporte dos neurônios (células cerebrais). Na doença de Alzheimer e em outros males neurodegenerativos, essas proteínas se acumulam no interior das células, torcem-se de forma anormal e formam estruturas semelhantes a fios, conhecidas como emaranhados neurofibrilares. Esses emaranhados não são eliminados com eficiência pelos processos normais para retirada de resíduos do cérebro, o que causa danos e morte das células. Isso leva à perda de memória.
Portanto, o direcionamento da tau pode ser um tratamento eficaz para várias enfermidades neurodegenerativas, incluindo Alzheimer, demência frontotemporal, demência com corpos de Lewy e paralisia supranuclear progressiva.
Conforme mencionado acima, o Alzheimer não está associado apenas ao acúmulo de tau dentro dos neurônios, mas também ao de placas amiloides entre os neurônios, levando-os à morte.
Até hoje, a maioria dos tratamentos tem como objetivo a extração da amiloide do cérebro. Entre eles, estão os medicamentos lecanemab e donanemab, que foram aprovados nos Estados Unidos e estão sendo avaliados no Reino Unido. No Brasil, cerca de 1,2 milhão de pessoas vivem com algum tipo de demência e 100 mil novos casos são diagnosticados por ano.
O lecanemab e o donanemab foram eficazes em retardar a progressão do declínio cognitivo em estudos clínicos; no entanto, há muitas limitações, incluindo acessibilidade, preço e o fato de que eles só são eficazes em um estágio inicial de diagnóstico.
Alguns argumentam que a desaceleração do avanço da doença é tão leve que não seria percebida por alguém com Alzheimer em estágio inicial. E ninguém sabe, ainda, se a progressão lenta da doença é mantida a longo prazo.
Infelizmente, os tratamentos que têm como alvo a tau se mostraram menos eficazes em testes em humanos e tiveram dificuldades devido à sua capacidade limitada de penetrar justamente nas partes do neurônio onde a tau está se acumulando. Lembre-se, a amiloide se acumula fora dos neurônios, enquanto a tau se acumula dentro deles.
Eficaz em camundongos
Os pesquisadores da University of Texas Medical Branch apresentaram resultados positivos na redução do acúmulo da proteína tau e na melhora da memória em modelos de camundongos idosos vítimas de doenças neurodegenerativas. Por isso, os estudos resultaram em um spray nasal inovador.
Primeiramente, os pesquisadores otimizaram os anticorpos (proteínas criadas pelo sistema imunológico) que se prendem às proteínas tau, e as eliminam. Eles conseguiram isso ao adicionar os anticorpos em placas de Petri (utensílio usado em laboratório de microbiologia) contendo tecido nervoso humano e proteínas tau.
Uma vez identificado o anticorpo mais eficaz para atingir a tau (chamado TTCM2), os pesquisadores embalaram os anticorpos em pequenas bolhas de gordura (lipídios) que conseguem atravessar a barreira hematoencefálica e entrar nos neurônios. Essa última parte foi o maior desafio para atingir os emaranhados. Uma vez no cérebro, a camada externa da bolha se dissolveu, liberando os anticorpos e eliminando o acúmulo de tau.
A administração por meio de um spray nasal em modelos de camundongos com Alzheimer mostrou que uma única dose reduziu significativamente o acúmulo de tau em seus cérebros. Os mesmos resultados também foram descobertos ao aplicar o spray em amostras de tecido nervoso humano.
O spray nasal também apresentou melhorias significativas na memória e na cognição desses camundongos. Isso foi verificado através do teste de reconhecimento de objetos novos, que revela se os ratos conseguem identificar um objeto novo em comparação com um objeto familiar.
Embora tudo isso pareça muito empolgante, é importante considerar que essa pesquisa ainda não foi testada em seres humanos. É sabido que os camundongos são modelos valiosos para o estudo de possíveis tratamentos, mas há diferenças significativas entre eles e os seres humanos.
Cerca de 70% dos medicamentos na "fase pré-clínica" não chegam a ser testados em humanos. A taxa de sucesso de testes clínicos (os feitos em humanos), é ainda menos otimista, com 90% dos medicamentos não conseguindo chegar ao mercado.
Dito isso, esse método de spray nasal abre caminho para a administração não invasiva de anticorpos tau diretamente no cérebro, oferecendo um potencial promissor para o tratamento de várias doenças neurodegenerativas afetadas pelo acúmulo de tau.
Rahul Sidhu é pesquisador de pós-doutorado em neurosciência da Universidade de Sheffield, Neuroscience,
Este artigo é republicado do The Conversation sob a licença Creative Commons. Leia o artigo original.
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