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Desodorante, cigarro, naftalina, gás: algum cheiro é capaz de matar?

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Imagem: iStock

Marcelo Testoni

Colaboração para VivaBem

17/04/2023 04h00

No começo de março, foi noticiado que uma adolescente britânica teve uma parada cardíaca e morreu após inalar desodorante em spray. A garota, de 14 anos, era autista e borrifava o produto no quarto para acalmar a ansiedade, pois a fragrância era a mesma que sua mãe usava. Sua família afirma que ficou sabendo de outras pessoas que morreram da mesma forma.

De fato. Em agosto de 2022, um garoto morreu em Belo Horizonte após entrar em um guarda-roupa e respirar desodorante aerossol. Segundo a Polícia Civil, havia a possibilidade que ele estivesse cumprindo algum desafio das redes sociais. No mês seguinte, em setembro, outro menino morreu, no Pará, com suspeita de intoxicação também por desodorante aerossol.

Entretanto, é válido esclarecer que tragédias como essas não ocorrem por causa de algum cheiro específico, seja perfumado, ou o contrário, extremamente fedorento. O que leva eventualmente a óbito são as reações bioquímicas que muitas substâncias com odor podem desencadear no nosso organismo. E quanto maior a concentração, maiores os riscos imediatos.

Por que desodorante em spray pode matar?

Mulher passa desodorante spray nas axilas - gpointstudio/ Freepik - gpointstudio/ Freepik
Imagem: gpointstudio/ Freepik

Falta de informação é um dos principais motivos para fatalidades. Para se ter ideia, somente em 2022 a Anvisa tornou obrigatória a presença de advertências visíveis nos rótulos de desodorantes em aerossóis. Entre as quais: "evitar a inalação direta", "manter fora do alcance de crianças", "proteger os olhos durante a aplicação".

O risco de morte corresponde a algumas fórmulas, também presentes em outros produtos em spray, como fixadores de cabelo. Gases como propano, butano e isobutano quando inalados juntos, em grandes quantidades em um único dia, ou por anos, de forma moderada, podem levar a uma série de problemas, pois são transportados para o organismo em vez do oxigênio.

Num cenário agudo e grave, a pessoa em questão de segundos a minutos, pode se sentir sem ar, perder a consciência e falecer por parada cardiorrespiratória. Agora, se a inalação desses gases mais outros componentes, como álcool, fragrâncias, alumínio, ocorrer no longo prazo, é possível desenvolver alergias, ansiedade, alterações cardiovasculares, câncer e lesões cerebrais.

Substâncias fedidas também são perigosas

Produto químico utilizado em desinfetantes, descolorantes e tubulações de freezers industriais, a amônia (NH3) possui um cheiro forte e desagradável, mas que pode passar despercebido por quem lida diariamente com ela a níveis baixos. Caso seja inalada, pode desencadear tosse seca, chiado no peito, falta de ar, asfixiar, queimar vias aéreas superiores e, em extremos, até matar.

Outra substância fedorenta, com cheiro de ovo podre e letal, é o sulfeto de hidrogênio (H2S), ou ácido sulfídrico. Em baixa concentração, ele provoca irritação nos olhos, dor de garganta e faz a pressão arterial cair. Em alta, fecha as vias respiratórias sem que se possa agir, como em 1950, em que um vazamento de H2S no México matou mais de 20 e feriu outras 300 pessoas.

Resultante da combustão incompleta de materiais combustíveis, inalar fumaça também pode fazer muito mal, tanto que é a principal causa de asfixia e morte em incêndios. O cheiro de queimado somado aos subprodutos tóxicos provoca ardência de mucosas, tosse, cansaço, falta de ar, dor de cabeça, lacrimejamento e vermelhidão ocular e câncer, após longo tempo.

Cuidado com cheiros químicos que agradam

Litro de gasolina sobe - iStock/Getty Images - iStock/Getty Images
Imagem: iStock/Getty Images

Algumas substâncias com odor liberam neurotransmissores produtores de sensações de prazer e recompensa, portanto são viciantes. Um exemplo é a nicotina, o princípio ativo das folhas de tabaco, mas o cuidado se estende para combustíveis, tintas, removedores e até naftalina, que se for inalada em grande quantidade causa anemia hemolítica e lesões em fígado e rins.

No geral, envenenamentos leves cursam com falta de ar passageira, enxaqueca, palidez, enjoo, vômito e diarreia. Contudo, a exposição intensa gera confusão mental, falta de ar severa, dor no peito, convulsões, perda da consciência e, por fim, coma e morte, caso não haja socorro. Gasolina contém benzeno, que pode agradar o olfato, mas tem alto potencial alucinógeno.

Por outro lado, odores químicos às vezes podem ser bastante úteis. Por exemplo, embora em estado bruto gás natural (GN), encanado e gás liquefeito de petróleo (GLP), usado em botijão, sejam inodoros, posteriormente eles recebem a adição de mercaptano, um composto de enxofre, cujo odor serve para alertar sobre vazamentos e evitar asfixias, incêndios e explosões.

Fontes: Andy Vicente, médico pela FURB (Fundação Universidade Regional de Blumenau) e Cícero Matsuyama, médico pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), ambos otorrinolaringologistas do Hospital Cema, em São Paulo; e Júlio Barbosa, médico pela UFBA (Universidade Federal da Bahia) e especialista em neurocirurgia pela UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles).