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'Da 1ª consulta, lembro do terrorismo': diabetes requer educação em saúde

Walquíria: "Na primeira consulta, só levei bronca sem saber direito o que era a doença" - Arquivo pessoal
Walquíria: 'Na primeira consulta, só levei bronca sem saber direito o que era a doença' Imagem: Arquivo pessoal

Cristina Almeida

Colaboração para VivaBem

28/11/2022 04h00

Raiva, angústia, falta de confiança. Essas são algumas das possíveis emoções que uma pessoa pode vivenciar após receber o diagnóstico de diabetes. Mas dá para entender. A doença é crônica e se relaciona com desfechos assustadores como a cegueira, amputações e diálises.

No entanto, a ciência garante: comunicação, educação, acesso a informações e letramento em saúde (também chamado de literacia) podem reduzir esse mal-estar e ainda potencializar os resultados terapêuticos.

De médico em médico

A literatura médica aponta que menos de 7% dos pacientes podem contar com esse tipo de informação no primeiro ano após o diagnóstico. Este foi o caso de Walquíria Pinheiro Lopes Ávila, 64, de São Paulo. Atualmente aposentada, ela descobriu que tinha diabetes do tipo 2 no trabalho, ao fazer exames preventivos.

Além de ter uma rotina estressante, ela era sedentária, fumante, estava acima do seu peso saudável e ainda tinha histórico familiar da doença. Walkíria afirma que da sua primeira consulta ela lembra do "terrorismo". "Só levei bronca: eu tinha de perder peso, fazer exercício, sem saber muito bem o que era a doença ou o que poderia acontecer", conta.

Mesmo medicada, a glicemia de Walkíria não baixava. Ela então foi trocando de médico, até que encontrou um clínico geral. Ele não só explicou qual era exatamente o seu quadro, como ofereceu informações impressas sobre como proceder. O profissional também a ajudou a buscar por informações em sites confiáveis para entender melhor a doença. O tratamento, enfim, começou a dar resultados.

Consciência coletiva

Injeção diabetes, perda de peso - iStock - iStock
Imagem: iStock

Sem nunca ter ouvido falar sobre o diabetes do tipo 1, que pode se manifestar desde a infância e é autoimune, a confeiteira Bárbara Rufino Xavier, de Guarulhos, só descobriu sua existência quando seu filho Rafael, aos 6 anos, recebeu o diagnóstico no hospital após uma descompensação.

Nesse caso, o acesso às informações foi imediato: os pais foram acolhidos e orientados pela endocrinologista de plantão.

Na primeira visita médica posterior, a família saiu do consultório com as mãos cheias de papéis. Eram conteúdos que ajudaram, e ainda ajudam, a conhecer o diabetes em todos os seus aspectos e fases, orientaram o acesso a medicações pelo SUS e também possibilitaram uma jornada partilhada com outras pessoas na mesma situação, por meio do conhecimento da ADJ - Associação de Diabetes Juvenil - e seus vários programas educativos.

"A única coisa que faltou, foi a empatia e o apoio na escola", relata Bárbara.

Para Marco Akerman, professor titular da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), em situações como estas, os pais devem provocar ações de promoção da saúde nas escolas para aprimorar a consciência coletiva e a educação em saúde de professores, crianças, pais e mães.

"É possível que a iniciativa não desse em nada. Mas este poderia ter sido um encontro no qual o grupo poderia trocar receitas de doces que Rafael comeria nas festinhas dos colegas. A medida envolveria todo o grupo em um processo de aprendizado e inclusão."

Comunicação positiva

Marcio Krakauer, diretor da SBEM-SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes), afirma que saber como o paciente se sente nessas horas e estabelecer com ele uma comunicação positiva faz toda a diferença.

Ter essa sensibilidade pode definir como se dará o tratamento, mesmo entre indivíduos que, no início, se mostram incrédulos, como uma de suas pacientes que um dia declarou: "No início, o diabetes era um bicho papão; agora, ele é um bicho de estimação".

Embora a enfermidade acometa, no Brasil, o equivalente a pouco mais que toda a população do município de São Paulo (16 milhões de pessoas), "ela não é —nunca foi— um atestado de óbito, de perda de nada", fala Krakauer.

"Ao contrário, o que o paciente precisa saber é que o diabetes é o início de uma vida nova e mais saudável. Bem informado, ele não tem como piorar, só melhorar", completa o médico.

Mais conhecimento, mais benefício

O diabetes mellitus é um grupo de doenças (são exemplos o diabetes do tipo 1 ou 2, e o gestacional) relacionadas ao metabolismo da glicose que leva ao acúmulo do açúcar no sangue.

O tratamento se fundamenta em quatro pilares: o uso de medicamentos, mudanças na dieta, atividade física, além da educação para o autocuidado. As explicações são de Levimar Rocha Araújo, paciente com diabetes do tipo 1 e presidente nacional da SBD.

"Para controlar a doença, tiramos o máximo proveito das intervenções mais poderosas: o acesso a informações e a compreensão da importância das mudanças do estilo de vida, o que é feito por meio da construção de conhecimentos sobre o que é a doença e como ela se comporta", fala Araújo.

Essa ênfase na educação se justifica pelo fato de as evidências científicas sugerirem que a autogestão da doença reduz as taxas de glicemia —e, portanto, previnem complicações— além do risco de morte por todas as causas. Os dados foram publicados no periódico Endocrine. Quanto mais informado o paciente for, melhores serão as respostas clínicas e psicossociais, bem como a qualidade de vida.

O valor do letramento em saúde

Walquíria Pinheiro Lopes Ávila 1 - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Walquíria não conseguiu encontrar informações 'mastigadas' sobre diabetes na internet
Imagem: Arquivo pessoal

O diabetes é uma doença que possui conceitos complexos, e ainda requer do paciente que ele seja minimamente hábil com cálculos. Por isso, Walkíria e Bárbara se valeram da internet para entender mais sobre ela. A primeira relata não ter tido sucesso, enquanto a segunda pôde esclarecer dúvidas sobre os conteúdos que encontrou com a médica.

A verdade é que não faltam dados sobre a doença na rede, mas a depender do grau do letramento em saúde, ou seja, as habilidades e competências pessoais para buscar, compreender, avaliar e dar sentido a essas informações, eles não atenderão às necessidades de quem mais precisa, em razão de fatores como linguagem e formato inadequados e hierarquia dos tópicos no site, que desencorajam a continuidade da pesquisa.

Para aumentar as chances de melhor entender as informações sobre o diabetes, busque por fontes especializadas e confiáveis (veja os exemplos abaixo). Caso não entenda algum tópico, registre sua dúvida. Isso ajudará a equipe responsável pelo conteúdo a rever a informação para torná-la cada vez mais clara.

Referências: He X, Li J, Wang B, Yao Q, Li L, Song R, Shi X, Zhang JA. Diabetes self-management education reduces risk of all-cause mortality in type 2 diabetes patients: a systematic review and meta-analysis. Endocrine. 2017 Mar;55(3):712-731. doi: 10.1007/s12020-016-1168-2. Epub 2016 Nov 12. PMID: 27837440; CDC. Diabetes Self-Management Education and Training Among Privately Insured Persons with Newly Diagnosed Diabetes — United States, 2011-2012. MMWR Vol. 63, n. 46. 2014.