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'Fumei cigarro por 20 anos e a abstinência do vape tem sido muito pior'

Nicole Balestro, 36, teve muitos tremores quando parou com o cigarro eletrônico - Arquivo pessoal
Nicole Balestro, 36, teve muitos tremores quando parou com o cigarro eletrônico Imagem: Arquivo pessoal

De VivaBem, em São Paulo

11/08/2022 04h00

Por 20 anos, Nicole Balestro fumou cigarro. O hábito começou quando ainda era adolescente, aos 15, e escondido dos pais. O tempo foi passando e o vício continuou. Quando percebeu que fumava por tantos anos e, logo após o nascimento do filho, resolveu parar —e conseguiu.

Mas depois de 1 ano, a empresária, 36, conheceu os cigarros eletrônicos e ficou "alucinada". Só que o vício ficou ainda pior. Quando quis parar, achou mais difícil do que os cigarros comuns. "Fumei por 20 anos e não tive a tremedeira que senti com o vape", diz. Abaixo, leia o relato completo de Nicole:

"Comecei a fumar cigarro adolescente, quando eu tinha 15 anos, e escondida dos meus pais, obviamente. Os anos foram passando e nunca conseguia largar. Nessa, passaram-se 20 anos. Era um vício real. Cheguei a fumar 40 cigarros por dia, principalmente por ter um trabalho estressante como empresária musical.

Quando completei 35 anos, percebi que já fumava cigarro há 20. Também tinha um filho pequeno e percebi que era hora de parar. Fumava tanto que tinha ressaca do cigarro. Mas aí cansei e joguei meu maço de cigarro no lixo. E foi exatamente assim que consegui, até cheguei a usar o adesivo de nicotina. Depois disso, nunca mais coloquei um cigarro na boca.

Isso tudo ocorreu em novembro de 2020 e, quando foi o Réveillon, viajei de São Paulo ao Rio de Janeiro com umas amigas e uma delas fumava pod [um dos modelos de cigarro eletrônico]. Peguei para experimentar e fiquei alucinada, pensei: 'Nossa, que coisa boa!'.

Depois disso, não parei de comprar. Comecei a escolher os recarregáveis, então gastava uma fortuna. Só que chegou um momento que fiquei com preguiça de carregar, aí comprei os que são descartáveis [esses produtos têm limite de tragadas].

O problema é que comecei a ficar 'noiada' com a quantidade de embalagem que jogava no lixo. Também lia notícias sobre os produtos que, mesmo sem muitas pesquisas ainda, eram preocupantes. Uma amiga disse, um dia, que preferia o cigarro normal ao eletrônico, pois pelo menos ela sabia que o cigarro 'mata a longo prazo', mas o vape ninguém sabe de nada ainda.

Quando acabava um, eu já comprava outro, não importava o valor. É fácil pedir por aplicativos de entrega. Meu vício era tão grande que não existia a possibilidade de esperar chegar um pod. Gastava muito dinheiro.

Nicole Balestro, empresária - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Empresária fumou cigarro comum por 20 anos
Imagem: Arquivo pessoal

Um dia, tive uma crise de enxaqueca e pensei que poderia ser o pod —mas não fui atrás para saber. Só que fiquei pensando nisso e resolvi parar também.

Na cama, no banheiro, em qualquer lugar...

Além disso, a facilidade de poder fumar em qualquer lugar colaborou para meu vício ser maior. Com o vape, você não precisa sair do ambiente para fumar; é possível fazer isso em qualquer lugar. Com o pod, dá para fumar na varanda, no banheiro, na cama vendo um filme, no parquinho com meu filho, pois não tem o cheiro forte igual ao cigarro.

A abstinência tem sido muito pior. Fumei cigarro comum por 20 anos e nunca tive tremedeira, igual sinto na abstinência de pod. Já estou 11 dias sem, passando por três 'provações', como sair para beber. Mas consegui ficar sem fumar, passei ilesa.

Algo que foi igual ao cigarro comum foi a indisposição que senti. Minha decisão de parar não foi por ter algum problema de saúde pelo cigarro eletrônico, mas foi uma decisão muito assertiva, tanto pelo acúmulo de lixo que causa, como pelas notícias negativas que venho lendo. A gente fica fumando algo que nem sabe o que tem dentro —apesar de saber que as essências que eu usava tinham nicotina.

Esse conceito de 'redução de danos' foi algo que pegou muito, mas já sei que não é bem assim, na verdade. Existem situações, como deitar para ver uma série, em que já esticava a mão e pegava o cigarro eletrônico na mesa. Então, dissociar esse hábito é o que tem sido mais difícil."

Vape; cigarro eletrônico - iStock - iStock
Imagem: iStock

Abstinência de nicotina com cigarro eletrônico é pior?

Depende do uso, mas, segundo os especialistas ouvidos por VivaBem, sim, pode ser pior, principalmente como foi o caso de Nicole, que utilizava o DEF (dispositivo eletrônico para fumar) o tempo todo —diferente do que ocorria com os os cigarros comuns. Neste ritmo, a pessoa recebe uma quantidade maior de nicotina (presente na maioria dos produtos vendidos), substância responsável por causar a dependência.

"Com isso, ela pode ter uma abstinência maior, que é pesada, dura cerca de 1 mês. A abstinência de tabaco [planta da qual é extraída a nicotina] é mais longa do que de outras drogas, que duram 7 dias, por exemplo", explica o psiquiatra João Castaldelli-Maia, orientador de pós-graduação do departamento de psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).

Os sintomas mais comuns são:

  • Irritabilidade
  • Ansiedade
  • Insônia
  • Sintomas depressivos (com ideação suicida)
  • Aumento do apetite, com ganho de peso
  • Dificuldade de concentração
  • Sudorese
  • Tremores

De acordo com o médico, é possível passar por essa fase com auxílio médico, que pode prescrever remédios que ajudam a amenizar os sintomas. "A terapia de reposição da nicotina, com adesivos e gomas de mascar, além de medicamentos específicos para o tratar o tabagismo, também ajudam neste momento", diz o médico.

Cigarro eletrônico do tipo juul - Josie_Desmarais/Istock - Josie_Desmarais/Istock
Cigarro eletrônico do tipo juul, que parece um pendrive
Imagem: Josie_Desmarais/Istock

Cigarro eletrônico traz riscos à saúde

Além de não ser um tratamento para o tabagismo, os DEFs podem causar diversos problemas ao corpo, pois possuem outras substâncias, além da nicotina, que são tóxicas e perigosas. No Brasil, esses produtos são proibidos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) desde 2009.

"A propaganda do vape entrou neste lugar de ser 'não ser tão ruim como o cigarro', mas esse é um discurso construído pela indústria do tabaco. É uma forma de dar continuidade para um negócio bilionário", afirma o médico epidemiologista Alfredo Scaff, consultor médico da Fundação do Câncer.

O que o uso desses produtos pode causar?