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Limpeza do ânus: Quebrar tabu e falar do tema evita doenças, diz médica

Lorena Barros e Luccas Lucena

Do UOL, em São Paulo

17/06/2022 04h00Atualizada em 17/06/2022 14h25

O vídeo de uma fisioterapeuta pélvica ensinando usuários do TikTok a limpar a região do ânus bateu a marca de um milhão de visualizações em poucos dias e levantou nas redes sociais uma discussão sobre a forma correta de higienizar a área. Mais que um simples desconforto com o odor na região, a falta de limpeza adequada pode causar doenças, que têm dados nebulosos por causa do tabu em torno do assunto, conforme explicou uma médica a VivaBem. Já a autora do vídeo revelou que recebeu ofensas, mas se sentiu satisfeita na missão de esclarecer o tema.

Camila Gutz conta ao UOL que não esperava esse sucesso todo com o vídeo no TikTok, pois o postou "despretensiosamente" no domingo de manhã. "Era uma demanda que eu já estava devendo há três semanas para o pessoal que me segue no Instagram. Postei, fiz minhas coisas e quando vi o vídeo fez um milhão de visualizações". O conteúdo agora tem mais de 10 milhões de views.

Apesar disso, ela foi ofendida por abordar o assunto abertamente. "Gente vindo no direct, comentários nos vídeos, nas matérias, achando isso um absurdo e falando que eu tava fazendo isso para me aparecer. Mas meu foco nem é esse, o que importa é divulgar essa informação pra milhares e ajudar homens e mulheres com isso".

Ela diz que é necessário falar mais sobre esse tema. "O fato desse assunto ter feito sucesso mostra que é um tabu falar sobre sexualidade e higiene íntima. As pessoas ainda não têm o hábito de falar sobre isso de forma aberta, tudo ainda é muito proibido e vulgar. Tem a necessidade de levar isso mais para as escolas e os pais comentarem mais essas coisas com os filhos. No futuro precisamos tratar tudo isso com naturalidade".

Médica explica

Segundo a médica Bruna Carminatti Cavaresco, Coloproctologista do HCGS (Hospital e Clínica São Gonçalo), a higiene na região do ânus deve ser realizada após a evacuação e durante o banho com água e sabão. Apesar da higienização da área ser importante, não é preciso esfregá-la vigorosamente, pois a limpeza excessiva também pode trazer problemas.

"Se a área for vigorosamente esfregada, a pele fica desengordurada. Isso pode resultar em dermatite de contato, um tipo de inflamação da pele", explica em conversa com o UOL. No lugar de esterilizar totalmente a área, é importante que a retirada do sabão seja feita com água corrente e em abundância.

Ainda que a explicação não seja complexa, Camila afirma que há jeito de parar de ter o "cheiro de bunda". "Muitas pessoas me agradeceram, pois sempre lavaram de maneira errada a vida toda. As pessoas sempre dizem que 'nessa vida a gente não tem solução pra duas coisas: pro cheiro de bunda e pra morte'. Pro cheiro de bunda eu discordo".

Para as mulheres cisgênero, que devem evitar o contato das bactérias do ânus com a área vaginal, a médica lembra que é importante redobrar a atenção. "A limpeza deve ser feita no sentido 'da frente pra trás'", informa.

Doenças

A médica do HCGS lembra que infecções por bactérias e parasitoses são as maiores manifestações causadas pela falta de higiene na região do ânus.

Como a área é cheia de dobras (as "pregas" apontadas pela fisioterapeuta no vídeo popular do TikTok), isso demanda uma atenção maior. "A área frequentemente fica quente e úmida e a falta de higiene pode causar infecções fúngicas e bacterianas na região perineal que podem manifestar vermelhidão, coceira e até mesmo lesões ulcerosas [feridas] em casos mais graves", detalhe Bruna.

Tão importante quanto o tratamento é o diagnóstico preciso das doenças causadas pela falta de higiene. "Cada doença e seus diferentes patógenos causadores são tratados de forma diferente. Assim, é essencial a avaliação de um coloproctologista. O tratamento pode variar desde uso de cremes tópicos, orientações de ajustes em relação à higiene, até tratamento com antibióticos e antiparasitários orais", explica a médica.

Tentar derrubar o tabu em torno do assunto também é um obstáculo a ser superado pela comunidade médica.

"Infelizmente, até mesmo pela falta de diagnóstico preciso, pelo grande tabu envolvido com as doenças desta região e dificuldade em procurar atendimento médico, não existem dados precisos sobre a incidência e prevalência dessas doenças. Há muito o que melhorar em relação à quebra de paradigmas e educação em relação aos cuidados de higiene básica em nosso país, principalmente quando falamos em populações vulneráveis", conclui a médica.