Topo

Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


O que de mais promissor aconteceu no maior congresso de oncologia do mundo

iStock
Imagem: iStock

Sarah Alves

Do VivaBem, em São Paulo

13/06/2022 11h45

O congresso da Asco (Sociedade de Clínica Oncológica Americana, na tradução do inglês) terminou na última semana em Chicago (EUA). Trata-se do maior evento de oncologia do mundo que é conhecido por apresentar as principais atualizações e novidades sobre o tratamento do câncer. Após dois anos, em 2022 o encontro voltou a ser presencial.

Nesta edição, as principais pesquisas trouxeram descobertas importantes em abordagens que podem reduzir os efeitos colaterais, além de apontar com maior precisão se há ou não necessidade de quimioterapia, por exemplo.

A apresentação mais promissora, destacam oncologistas ouvidos por VivaBem, registrou remissão do câncer em todos os 12 pacientes com câncer de reto participantes, sem evidência do tumor em exames físicos, endoscopia, tomografia por emissão de pósitrons (PET scans) e ressonância magnética.

A pesquisa usou por seis meses doses do imunoterápico dostarlimab, —um anticorpo monoclonal—, já liberado no Brasil, mas que chegará em agosto para ser usado contra um tipo raro de câncer no endométrio (tecido que reveste a parede interna do útero).

Esses pacientes de câncer retal enfrentam tratamentos extenuantes —quimioterapia, radiação e cirurgias que podem resultar em disfunção intestinal, urinária e sexual. Alguns precisam de bolsas de colostomia.

Eles entraram no estudo pensando que quando terminasse teriam que passar por esses procedimentos, porque ninguém esperava realmente que seus tumores desaparecessem. Mas tiveram uma surpresa: nenhum tratamento adicional foi necessário.

A medicação foi dada a cada três semanas durante seis meses e custou cerca de US$ 11 mil (cerca de R$ 52 mil) por dose. Ele desmascara as células cancerosas, permitindo que o sistema imunológico as identifique e destrua.

No caso da pesquisa em questão, os pacientes com câncer colorretal foram tratados em períodos diferentes e são acompanhados desde dois anos até seis meses pós-tratamento, por enquanto sem relatos de eventos adversos graves.

O tratamento é limitado a uma parcela de 5% a 10% das pessoas com câncer de reto, pois é preciso ter síndrome de Lynch, uma condição genética que causa predisposição à doença. Mas a nova prática empolga, principalmente pelo nível de efeitos colaterais toleráveis, podendo abrir caminhos a novas abordagens contra a doença.

No estudo apresentado, o método experimental substituiu o protocolo padrão, que costuma aliar radioterapia, quimioterapia e cirurgia. A intervenção é geralmente muito agressiva e o paciente precisa de colostomia (processo em que o intestino é "exteriorizado" e uma bolsa coleta resíduos do sistema digestivo).

"Câncer colorretal traz morbidade muito grande, com sequelas a longo prazo importantes, principalmente para quem faz cirurgias radicais, que comprometem o músculo do reto e necessita de colostomia para o resto da vida", diz o cirurgião oncológico Samuel Aguiar, membro da SBCO (Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica).

Quimioterapia: técnicas mapeiam se é dispensável

Novas tendências também se empenham em mapear a necessidade ou não de quimioterapia, com foco naquela indicada para tratamento adjuvante (usada pós-cirurgia como forma preventiva contra células cancerosas remanescentes). Por mais que o tratamento seja seguro e eficaz, muito se questiona sobre a qualidade de vida dos pacientes devido aos efeitos colaterais.

"Conseguimos estratificar e poupar pacientes de quimioterapia quando algum biomarcador não está presente. Com isso, ganhamos ferramentas para dar segurança e descalonar tratamento em cânceres muito comuns", indica a oncologista Angélica Nogueira Rodrigues, doutora pelo Inca (Instituto Nacional de Câncer) e membro da SBOC (Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica).

Um dos principais estudos mapeou a presença de um DNA "oculto" no sangue de pacientes com câncer colorretal tipo 2. A equipe do Hospital Johns Hopkins (EUA) analisou os níveis de ctDNA (DNA tumoral circulante), quantidade do material genético com pequenas porções do tumor em circulação no sangue. Aqueles que tivessem resultado negativo, não precisariam da terapia adicional pós-cirurgia.

Após a avaliação, o estudo não identificou diferenças que comprometessem a saúde daqueles que não realizaram químio. As taxas de sobrevida e recorrência do câncer foram 92,4% contra 93,5%, sendo a última porcentagem referente à abordagem focada no ctDNA. Agora, explicaram os pesquisadores, a expectativa é expandir o rastreamento para outros tipos de cânceres.

Outro estudo semelhante também avaliou o risco em liberar da quimioterapia pacientes a partir dos 70 anos com câncer de mama, sem observar mudanças na sobrevida pelo período de quatro anos. Assim como a abordagem com pacientes que tinham tumores pequenos, sem comprometimento da axila, que substituiu tratamento subsequente à cirurgia com radioterapia por hormonoterapia. Após a intervenção, das 500 mulheres acompanhadas apenas 2,3% registraram recidiva da doença em cinco anos.

Progressão do câncer de mama

Sobre o câncer de mama raro, uma medicação chamada trastuzumab deruxtecan foi indicada como tratamento capaz de estender a vida das pacientes em seis meses, após diminuir a progressão da doença e o tamanho do tumor.

O estudo analisou 557 pacientes, divididas em dois grupos, com um tipo de tumor classificado como HER2-low (anteriormente, elas eram descartadas para este tipo de tratamento, mas a nova pesquisa indicou que poderiam se beneficiar da abordagem), todas com metástase, quando a doença já se espalhou para outros órgãos e/ou tecidos.

De acordo com os pesquisadores, aquelas que receberam a medicação tiveram a piora da doença evitada por 10 meses, enquanto o outro grupo registrou diminuição por metade do período. Os efeitos colaterais observados foram dentro dos padrões, tratados com remédios focados nos sintomas.

Novidade no tratamento de próstata

Uma proposta de novo protocolo para o tratamento de câncer de próstata metastático também foi apresentado durante o congresso da Asco. Geralmente, as abordagens dos tumores em níveis avançados utilizam um tipo de terapia hormonal como tentativa de conter o avanço da doença.

Desta vez, a pesquisa usou um conjunto de três medicações, entre elas a darolutamida, como combinação para ter ação direta contra as células cancerosas.

"Percebemos que, além de impedir a produção de testosterona, o bloqueio da sua ação na célula tumoral faria o paciente responder melhor e viver mais tempo", afirma o oncologista Diogo Rosa, do Grupo Oncoclínicas (RJ), e que integrou a equipe de pesquisa com participantes brasileiros. Segundo o estudo, o medicamento reduziu o risco de morte em 32,5%.

Para o uso do protocolo no Brasil, é preciso que a medicação seja aprovada para este fim específico pela Anvisa. "Esperamos que entre no rol da ANS porque as operadoras vão ter que dar para o paciente quando houver indicação", considera Rosa.

Tratamento promissor para câncer raro

Também foram apresentados os resultados primários do estudo SHINE fase 3, feito em pacientes com 65 anos ou mais com linfoma de células do manto (MCL) recém-diagnosticado. A pesquisa demonstrou que a combinação de oral de ibrutinibe uma vez ao dia mais bendamustina-rituximabe (BR) e manutenção com rituximabe reduziu significativamente o risco de progressão da doença ou morte em 25% em comparação com pacientes que receberam placebo mais BR e manutenção com rituximabe.

O linfoma de células do manto, raro, acontece nas células B e está dentro do grupo do linfoma não-Hodgkin (LNH). Esse câncer pode se apresentar com características variadas, inclusive podendo evoluir com mais velocidade (agressivo) ou mais lentamente (indolente). Justamente devido a essa diversidade, os sintomas podem se manifestar de diferentes maneiras e o tratamento é adaptado para cada caso específico.

Apesar de haver um grande leque de opções para a terapia, na maioria dos casos, essa neoplasia não é curável. Por isso, o principal objetivo é aumentar a sobrevida, com qualidade, do paciente.

Este estudo é um dos maiores ensaios clínicos já realizados em MCL de primeira linha e o primeiro para um inibidor de tirosina quinase de Bruton (BTKi) —uma enzima importante para o desenvolvimento e diferenciação dos linfócitos B.

Geralmente afeta pessoas com mais de 65 anos, que normalmente não toleram quimioimunoterapia intensiva e transplante de células-tronco, resultando em resultados clínicos ruins e contribuindo para a necessidade de desenvolver opções de tratamento adicionais para esses pacientes.

"Existe uma necessidade urgente de melhorar os resultados para pacientes mais velhos com MCL", disse Michael L. Wang, professor do Departamento de Linfoma e Mieloma do MD Anderson Cancer Center, da Universidade do Texas (EUA), e principal investigador do estudo. "Dada a mediana sobrevida livre de progressão de 6,7 anos, a combinação de ibrutinibe demonstrou o potencial de ser um tratamento de primeira linha nesta população."

O estudo recrutou 523 pacientes com 65 anos ou mais. Todos os participantes foram aleatoriamente designados para receber ibrutinibe ou placebo mais BR por no máximo seis ciclos de 28 dias; participantes com resposta completa ou resposta parcial continuaram a receber terapia de manutenção com rituximabe a cada segundo ciclo por um máximo de 12 doses adicionais.