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Por que assistir a vídeos de cravos e espinhas sendo espremidos dá prazer?

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Imagem: iStock

Flávia Santucci

Colaboração para o VivaBem

20/04/2022 04h00

Certamente, enquanto descia a tela do seu celular despretensiosamente, você já se deparou com algum vídeo de alguém espremendo cravos e espinhas. Esse tipo de conteúdo é cada vez mais acessado e até páginas específicas sobre o assunto foram criadas nos últimos anos.

De acordo com o YouTube, o interesse pela palavra "cravo" bateu recorde de buscas em 2021 e teve alta de mais de 10% se comparado a 2019. Já as buscas por "espinha" aumentaram nove vezes nesse período e também bateram recorde em 2021. Esses assuntos têm mais interesse na busca do site do que outros termos de destaque da vertical como depressão, dieta e ansiedade.

No Google, o interesse por "cravo" foi cinco vezes maior em 2021. O pico de buscas foi atingido em 2020. Já o interesse por "espinha" aumentou três vezes nesse período e também bateu recorde em 2020. Na busca do Google, as pesquisas por "cravo" e "espinha" com frequência também mencionam "vídeo", em especial as dos últimos 12 meses. As pesquisas por "cravo + vídeo" foram quatro vezes maiores nos últimos cinco anos e as pesquisas por "espinha + vídeo" foram duas vezes maiores no mesmo período.

Fato é que ninguém fica imune a vídeos de cravos e espinhas espremidos. E o que, para alguns, pode causar uma sensação de nojo e repulsa, para outros pode ser imensamente satisfatório. Mas isso não quer dizer que a pessoa que acessa esse tipo de conteúdo espontaneamente tem algum tipo de transtorno psicológico. Muito pelo contrário. Segundo a psicóloga Lais de Meneses Carvalho Arilo, do HU-UFPI (Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí), filiado à Ebesrh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), não existem evidências científicas que associem esse comportamento diretamente a algum problema.

"Na verdade, o que acontece parece estar mais relacionado a uma canalização de alívio e prazer. Para algumas pessoas, pode representar um alívio de sintoma da ansiedade". Ainda segundo Arilo, assistir a esses vídeos não traz prejuízos para a vida, nem para o cotidiano e muito menos para as relações. "Seria apenas uma forma escolhida para aliviar suas tensões ou até mesmo uma forma de sentir prazer", explica a psicóloga.

Aumento da dopamina e diminuição da tensão

A sensação de alívio que esses vídeos proporcionam, de acordo com Fernando Gomes, neurocirurgião do Hospital das Clínicas de São Paulo, é explicada porque há uma diminuição do nível de tensão e estimulação do funcionamento do sistema nervoso autônomo parassimpático (que faz o organismo se acalmar após uma situação de estresse ou emergência).
"Geralmente, as substâncias que são liberadas em momentos como esse são a dopamina, a própria serotonina, e a gente tem uma redução do nível da liberação da adrenalina", explica.

Para a psicóloga Monica Machado, especialista em psicanálise e saúde mental pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein, quando a pessoa assiste a algum conteúdo, está concentrando energia em algo que quer para si mesma. "É como se estivéssemos liberando algo de ruim, como se nossa angústia estivesse sendo retirada de dentro de nós. Pelo olhar da ciência, o ato de espremerem cravos faz com que o cérebro libere grande quantidade de dopamina, esse hormônio provoca a sensação de prazer e aumenta a motivação pelo ato de assistir", diz.

Gomes destaca também que quando se assiste um vídeo que, para a pessoa, tem um efeito considerado como satisfatório, o circuito cerebral de recompensa é acionado.
"Isso, obviamente, depende muito do gosto individual e do jeito que a pessoa lida com as coisas da vida. O circuito cerebral de recompensa é acionado naquele momento, principalmente com a liberação de dopamina, então é uma sensação agradável durante o assistir. É lógico que coisas, principalmente relacionadas com a sensação de alívio, de descontração, e que são consideradas engraçadinhas, têm um poder muito maior e relaxante do que as demais".

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Para algumas pessoas, esses vídeos podem representar um alívio de sintomas da ansiedade
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Sensação de satisfação é curta, mas pode ser prolongada

Gomes ressalta que a sensação de satisfação proporcionada por esses vídeos, para quem gosta, é curta, mas pode ser potencializada quando a pessoa comenta e compartilha o conteúdo. "Dura aqueles instantes, mas pode ser potencializada quando a pessoa, por exemplo, compartilha ou fala sobre o conteúdo, acionando a memória e tendo ali, como se fosse um flashback daquela sensação agradável".

Segundo o neurocirurgião, é por isso que, muitas vezes, as próprias redes sociais imitam a forma como o cérebro funciona. "Você vê um vídeo que considera satisfatório, dá um like. Se gostou muito, chega a fazer um comentário e se você também gosta muito e gostaria de compartilhar aquela sensação, geralmente encaminha para as pessoas que partilham da mesma forma de pensar, ou até mesmo que pensam de uma forma diferente, para, então, provocar".

Dessa maneira, ainda segundo Gomes, existe uma descarga de substâncias e uma satisfação que é momentânea. "Dura de segundos a minutos, mas pode ser potencializada quando você leva essa informação adiante".

Espremer cravos e espinhas pode ser prejudicial à pele

Apesar de satisfatório para o cérebro, espremer cravos e espinhas pode ser extremamente prejudicial à pele. Segundo a dermatologista Edileia Bagatin, coordenadora do Departamento de Cosmiatria da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia), a ação é sempre errada, independentemente das circunstâncias. "Não se deve nunca manipular essas lesões por duas questões. Primeiro, porque você agrava o processo inflamatório, você traumatiza. Segundo, porque você pode ferir a pele e aprofundar essas lesões e aí provocar o desenvolvimento de cicatrizes".

Além disso, Bagatin ressalta que, muitas vezes, as pessoas espremem cravos e espinhas com as unhas contaminadas, o que eleva o risco de danos causados à pele. "Nem sempre tomam o cuidado de lavar muito bem as mãos antes de mexer nas espinhas, essa unha pode estar contaminada com bactérias e você pode levá-las para esse local e acabar transformando uma doença inflamatória em uma doença infecciosa, que seria uma foliculite bacteriana".

O melhor é mesmo procurar ajuda de um profissional para tratar a acne. "Em casa, o que a pessoa pode fazer é uma higiene não exagerada. Se lavar muito a pele, principalmente com sabonetes para pele oleosa, com água quente, você vai danificar mais ainda a barreira cutânea, e isso pode aumentar a inflamação, facilitar as infecções e a dermatite de contato", diz ela.

Então, em casa, faça uma higiene moderada com produtos suaves, use hidratantes leves e filtros solares. "Mas produtos específicos para acne são de prescrição médica. E também não é legal copiar a prescrição de outras pessoas", alerta.