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Bebê recebe transplante duplo inédito nos EUA e ganha coração e timo

Easton Sinnamon, bebê americano que recebeu transplante duplo de coração e timo. - Divulgação/Duke University
Easton Sinnamon, bebê americano que recebeu transplante duplo de coração e timo. Imagem: Divulgação/Duke University

Colaboração para o UOL, em São Paulo

09/03/2022 10h09Atualizada em 09/03/2022 19h07

Um bebê se tornou a primeira pessoa no mundo a receber um transplante combinado de coração e timo, um procedimento que traz esperança para milhões de pacientes. Apesar de ter ocorrido em 2021, o anúncio foi feito na segunda-feira (7), pelos Médicos da Universidades Duke, nos Estados Unidos, após comprovado o sucesso do procedimento.

O pequeno Easton Sinnamon tinha apenas 6 meses quando recebeu, em agosto passado, o transplante duplo. Ele nasceu com um coração e sistema imunológico fracos e passou os seus primeiros sete meses no hospital. Foram necessárias também diversas operações cardíacas, bem como tratamento para infecções recorrentes que seu corpo não conseguia combater sozinho.

Os médicos da Duke University solicitaram a aprovação de um tipo experimental de transplante que não havia sido feito em combinação com humanos antes. Especialmente diante da gravidade do problema cardíaco e das falhas no sistema imunológico.

O garoto também teve infecções recorrentes, e a partir desse quadro, os especialistas perceberam que seu timo não estava funcionando corretamente. Por isso, além de um novo coração, seria necessário também um transplante para o timo.

"Foi uma daquelas coisas que poderiam ajudá-lo e, se funcionasse não apenas o ajudaria, mas também pode ajudar milhares de outras pessoas com seus filhos que precisam de transplantes", disse Kaitlyn Sinnamon, mãe de Easton, à universidade.

O que é o timo?

Com uma grande importância para o funcionamento do sistema imunológico, o timo é um órgão minúsculo e achatado, localizado entre os pulmões e na frente do coração. Em bebês e crianças, o timo é relativamente grande, mas durante o crescimento do corpo, ele vai diminuindo de tamanho, comparativamente.

Depois de seis meses, os exames realizados em Easton comprovaram que o novo timo está funcionando bem. O menino agora já completou um ano de idade, e os médicos acreditam que as condições de saúde tendem a melhorar após o transplante.

Tecido do timo transplantado em bebê em agosto de 2021.  - Shawn Rocco/Duke Health - Shawn Rocco/Duke Health
Tecido do timo transplantado em bebê em agosto de 2021.
Imagem: Shawn Rocco/Duke Health


Avanço na medicina

Para Joseph Turek, médico de Easton, o procedimento com coração e timo tem o potencial de mudar o futuro dos transplantes de órgãos. Principalmente porque as partes recebidas pelo bebê vieram do mesmo doador. Dessa maneira, há uma grande probabilidade do timo se adaptar facilmente ao sistema imunológico do receptor, como se fosse o do doador, evitando, portanto, a rejeição do coração.

"Isso permite que o timo reconheça por si mesmo o coração", declarou Turek, em um vídeo divulgado pela Duke University.

Anteriormente, a técnica havia sido bem-sucedida em experimentos com animais, inclusive em muitas pesquisas de Turek. Contudo, não havia sido testada antes em um receptor de órgão vivo.

Por outro lado, os especialistas indicam que a vitória de Easton simboliza um grande avanço na medicina. Mas, acreditam que outros fatores ainda estão pendentes.

Os médicos afirmam que após o transplante, os pacientes ainda precisam de novos tratamentos para garantir o bom funcionamento dos novos órgãos e evitar possíveis reações. No caso de Easton, o pequeno ainda necessita de drogas imunossupressoras. Para evitar essa dependência, eles defendem a ideia de aplicar a chamada "tolerância imunológica a um transplante".

"Com essa abordagem bem-sucedida, isso significaria que os receptores de transplante não rejeitariam o órgão doado e também não precisariam se submeter a tratamento com medicamentos de imunossupressão de longo prazo, que podem ser altamente tóxicos, principalmente para os rins", explicou Turek. "Esse conceito de tolerância sempre foi o Santo Graal no transplante, e agora estamos na porta."

Se essa técnica funcionar, ela pode ser aplicada em transplantes de outros órgãos. No caso do coração, por exemplo, transplantados costumam ter uma vida útil média de 10 a 15 anos - com a durabilidade limitada pela toxicidade dos medicamentos imunossupressores.

"Se isso puder ser extrapolado para pacientes que já têm um timo funcional, poderia permitir que eles reestruturassem seus sistemas imunológicos para aceitar órgãos transplantados com substancialmente menos dependência de medicamentos antirrejeição. O método de processamento usado para o tecido do timo parece ser crítico e de grande interesse", apontou Allan D. Kirk, presidente do Departamento de Cirurgia de Duke.

Procedimento delicado

O trabalho dos pesquisadores da Duke University contou com a parceria da empresa Enzyvant Therapeutics para desenvolver implantes cultivados em laboratório de tecido de timo doado. Com isso, seria possível tratar bebês que nascem sem o órgão.

Na cirurgia de Easton, em primeiro lugar, os médicos transplantaram um novo coração, enquanto o timo doado era enviado para um laboratório. Duas semanas depois, o bebê passou por uma segunda cirurgia para implantar o tecido do timo processado. Seu próprio timo foi removido para que novas células imunológicas se estabelecessem.

A principal função do timo é o processamento e maturação dos linfócitos T. Quando ainda estão dentro do órgão, os linfócitos não respondem a patógenos e agentes estranhos.

Depois que amadurecem, entretanto, eles vão para a corrente sanguínea e, em seguida, se deslocam para outros órgãos do sistema linfático, ajudando então a fornecer defesa contra doenças. O timo também produz um hormônio, a timosina, que estimula a maturação dos linfócitos em outros órgãos linfáticos.

Cerca de 6 meses depois da cirurgia, os exames mostram que o tecido do timo está construindo novas células T que funcionam bem em Easton. Ele parece estar funcionando como deveria, produzindo células imunológicas que não tratam o novo coração do bebê como tecido estranho.

"Casos como esse ressaltam a importância de novos entendimentos quando a cirurgia e a ciência são praticadas habilmente juntas", disse Allan D. Kirk. "Este caso tem implicações para mais do que apenas transplante de coração - pode mudar a maneira como muitos transplantes de órgãos sólidos são feitos no futuro."