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Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Podcast para a saúde mental tem benefícios? Quais são eles?

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Imagem: iStock

Lívia Inácio

Colaboração para VivaBem

08/12/2021 04h00

Uma carreira dinâmica como jogador de rugby, uma jornada musical brilhante com direito a um posto no programa "The Voice". Quem poderia imaginar que, por trás dos holofotes, o irlandês Niall Breslin, 41, travava uma luta contra a própria mente? Após um ataque de pânico pouco antes de uma entrada ao vivo na TV, ele quis repensar sua trajetória. E foi no podcast que encontrou um recomeço.

Criador do "Wake Up, Wind Down", produção original Spotify, que ganhou a versão brasileira "Liga/Desliga", Breslin resolveu olhar mais para si, dar pequenas pausas para o autocuidado e incentivar outras pessoas a fazerem o mesmo.

Promoveu lives no Instagram durante a pandemia e elas repercutiram tanto que o irlandês foi convidado pela plataforma de streaming para abrir um programa diário em duas etapas: uma reflexão de manhã para começar o dia e outra à noite, para desligar. O sucesso mundial da proposta aponta uma tendência: cada vez mais pessoas têm buscado nos podcasts uma maneira de relaxar e se conhecer.

Isso vale para produções ligadas à meditação, mas também para aquelas com dicas de autocuidado ou discussões filosóficas que ajudam a nomear sensações e enfrentá-las com mais nitidez.

Mas até que ponto essa receita é eficaz?

Funciona mesmo?

Embora ainda não haja estudos comprovando o efeito dos podcasts na mente, já se sabe que a simples pausa durante o dia pode melhorar a qualidade do sono e prevenir a exaustão, a ansiedade e a depressão a longo prazo, explica o neurocientista Marcelo Lima, professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná).

A atividade do cérebro é definida pelas chamadas bandas de frequência. Em situações corridas, há o predomínio da banda gama, cuja intensidade ultrapassa 35 Hz. O relaxamento leva à alfa, com ritmo que vai de 8 a 12 Hz. E aqui é que seu corpo agradece. Na hora de dormir, se você reduz mais um pouquinho a frequência, chegará à delta, que beira os 5 Hz, promovendo o descanso de que você necessita.

Nesse sentido, Lima reforça que precisamos, sim, de períodos de alta atividade cognitiva, mas as pausas são fundamentais. "O cérebro deve dar vazão a toda plenitude de seu funcionamento, seja na vigília atenta, na vigília relaxada ou no sono. Para funcionar bem, também precisa funcionar devagar", destaca.

Breslin enxerga na prática os benefícios dessa desaceleração. "Não é sustentável estar tão ativo o tempo todo", argumenta. Para o podcaster, tudo tende a ficar mais leve quando você pausa, encarando a angústia como uma resposta humana saudável em vez de seguir entorpecendo a dor. Por serem intimistas, os podcasts são bons caminhos nesse processo.

Durante a pandemia, com o isolamento social, os estímulos do entorno diminuíram e as pessoas precisaram conviver consigo mesmas, acrescenta a psicóloga Carla de Oliveira Vaz Chiarello, da UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná). Podcasts com reflexões e meditações (guiadas ou não) passaram a ser especialmente bem-vindos nessa fase e a busca tende a crescer. "A gente precisou se olhar para descobrir que somos boas companhias para nós mesmos ou ao menos procurar formas de sermos".

Não é terapia

Especialistas e o próprio Breslin alertam, entretanto, que nada substitui um tratamento médico ou psicológico. Então, o podcast deve entrar como estratégia complementar. Conforme menciona Chiarello, a forma de integrar soluções em prol da saúde tem sido muito bem vista por vários campos dentro do segmento.

Não por acaso, o SUS (Sistema Único de Saúde) aderiu recentemente às chamadas PICs (Práticas Integrativas e Complementares), admitindo a importância de ferramentas como acupuntura e meditação na promoção do bem-estar integral do indivíduo. Mas nunca é demais ressaltar que, embora venha para somar, o podcast não resolve nada sem o devido acompanhamento profissional.

A psicóloga Roberta Von Zuben, do Vera Cruz Hospital, de Campinas (SP), lembra da expressão oral. Por mais que meditar ou ouvir uma discussão de cunho existencial possa trazer insights relevantes, quase sempre é por meio da fala que o sujeito se reconhece. Nesse sentido, a psicoterapia é determinante na prevenção e no tratamento de transtornos mentais.

O mindfulness, que tem como um dos pilares a meditação, é outra fórmula presente em podcasts e que precisa ser melhor compreendida, alerta o psiquiatra Kayo Barboza, da clínica Holiste, de Salvador (BA).

Em primeiro lugar, a técnica deve complementar o acompanhamento especializado. Em segundo lugar, não é porque escuta uma produção com base na atenção plena que você está praticando o mindfulness. A ferramenta engloba todo um estilo de vida que vai além do meditar. Assim, esse tipo de programa é um bom ponto de partida, mas é necessário ir além e combinar esforços.

Como incorporar os podcasts no seu dia a dia?

Confira 4 dicas de especialistas para usar os podcasts a favor da sua saúde mental.

  • Escolha o tipo de programa que mais combina com você: Chiarello lembra, por exemplo, que muita gente pode se incomodar com uma meditação guiada. Outras pessoas ficam ansiosas com a ausência de uma voz orientando a meditação. Por isso, conheça as diferentes opções na internet e selecione a que mais tem a ver com seu perfil.
  • Crie uma rotina: coloque na sua agenda quanto tempo você vai dedicar ao seu autoconhecimento. O tempo mínimo indicado é duas vezes por semana, mas tudo vai depender da sua condição psíquica ou intenção.
  • Não se compare: muitos podcasts de saúde mental se baseiam na vivência ou no ponto de vista do apresentador. Isso pode ser bom porque o universo de pessoas (mesmo as mais diferentes entre si) têm muitas intersecções, o que tende a gerar identificação e a possibilidade de se nomear os próprios sentimentos. Por outro lado, sobretudo em tempos de mídias sociais, em que a comparação com o outro é cada vez mais comum, eles podem levar a generalizações rasas e nocivas para você. Apenas cuide para evitar isso. Você é um ser único.
  • Não queira buscar a positividade a qualquer custo: Breslin lembra que o grande mercado do bem-estar (a também chamada indústria do "wellness") não raro quer empurrar para as pessoas a ideia de que a felicidade está ao alcance de todos sempre. O que não é verdade. A saúde mental plena passa também por entender que a dor faz parte de nós. O grande segredo é encontrar formas de encará-la e conviver com ela.

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Liga/desliga

Apresentado por Leo Hwan, essa produção original Spotify é a versão brasileira do podcast "Wake Up, Wind Down", do irlandês Niall Breslin. Todos os dias, são disponibilizados dois episódios de aproximadamente 7 minutos: um para você relaxar e refletir ao acordar e outro para antes de dormir. O tom leve vem acompanhado de reflexões profundas, que podem deixar sua mente mais limpa.

É Nóia Minha?

A roteirista Camila Fremder traz à tona diversas polêmicas sobre comportamento e relacionamentos. Embora a apresentadora parta de percepções pessoais, promove debates consistentes para além de si mesma, o que é um prato cheio aos que gostam de dar nome aos sentimentos e entender a condição humana na contemporaneidade.

Sobre a Vida

Em seu canal no YouTube, "Sobre a Vida", o psicólogo e escritor Fred Mattos apresenta ricos insights sobre nossa forma de viver e construir relações. No podcast de mesmo nome, disponível no Spotify, o influenciador mescla meditações guiadas e orientações para aliviar as tensões e trabalhar aspectos como a autoaceitação e a maturidade emocional.

Quem Somos Nós?

Apresentado pelo empresário Celso Loducca, o "Quem Somos Nós" investiga a existência humana por meio de entrevistas com pesquisadores da área de filosofia, além de artistas, políticos e personalidades diversas com densa bagagem intelectual. Os programas são boas oportunidades para refletir sobre o que estamos fazendo aqui e como podemos transformar o mundo e a nós mesmos.