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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


'Rage room', sala para destruir objetos, alivia mesmo o estresse?

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Imagem: iStock

Isabella Abreu

Colaboração para o VivaBem

14/07/2021 04h00

Quem nunca ficou tão irritado a ponto de querer sair quebrando tudo? Pois saiba que existem locais onde pessoas pagam para realizar essa vontade. São os "rage rooms" (salas da raiva), estabelecimentos em que os visitantes podem destruir eletrodomésticos, eletroeletrônicos, louças e garrafas usando tacos de beisebol, pés de cabra e barras de ferro. É possível também levar seus próprios itens para a destruição.

O negócio surgiu em 2008, no Japão, e logo se espalhou para outras partes do mundo. Recentemente, a cidade de São Paulo ganhou um desses espaços. Batizado Rage Room CT e localizado no bairro Cidade Tiradentes, a proposta é permitir um escape para aliviar o estresse da pandemia.

O conceito, entretanto, é mais antigo: surgiu no século 19 e era defendido pelo psicanalista Sigmund Freud. A ideia é de que alguns sentimentos são como uma panela de pressão e, de tanto se acumularem, eventualmente chegam a um ponto em que vão explodir.

"As pessoas vão colocando pra fora todas as suas frustrações e seus sentimentos de impotência frente a muitas situações, sentindo assim um alívio momentâneo. Muitas vezes, as pessoas se sentem cansadas de cumprir regras e essa é uma forma de se sentirem mais livres e mais fortes", diz Liliana Seger, psicóloga e coordenadora do Programa para o Transtorno Explosivo Intermitente do Pro-Amiti (Programa Ambulatorial dos Transtornos do Impulso) do IPq-FMUSP (Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).

Quebrar tudo não resolve

Embora os rage rooms pareçam uma alternativa perfeita para extravasar e acabar com os problemas, é necessário ter cautela. Destruir coisas pode ser libertador, mas também perigoso!

Não há dúvida quanto ao fato de que a raiva reprimida pode ter efeitos muito negativos no nosso funcionamento, tanto na mente (na forma de depressão) como no corpo (infarto, hipertensão arterial ou câncer). Porém, na opinião de Marilda Novaes Lipp, psicóloga do Instituto de Psicologia e Controle do Stress e autora do livro "O Treino Cognitivo da Raiva", o efeito positivo que essa quebradeira pode proporcionar é de curto prazo.

"O ideal é buscar saber o que está gerando a raiva e descobrir meios de colocá-la para fora de modo construtivo. Um jeito de fazer isso é utilizar a comunicação assertiva, dizer o que pensa, defender seus direitos, falar dos seus sentimentos, sem necessariamente precisar explodir", aconselha Lipp.

Além disso, a especialista ressalta que não só as salas da raiva têm efeito somente temporário, mas também elas podem representar um grande risco para algumas pessoas. "Aquelas pessoas que usualmente perdem controle, explodem, quebram coisas ou agridem fisicamente, podem se tornar mais violentas ainda, porque a experiência de quebrar tudo serve como um reforço para a expressão livre da agressividade", alerta.

Na Rage Room de Cidade Tiradentes (SP), bastões e ferramentas para quebrar os objetos - Arthur Lamas/UOL - Arthur Lamas/UOL
Na Rage Room de Cidade Tiradentes (SP), bastões e ferramentas para quebrar os objetos
Imagem: Arthur Lamas/UOL

A psicóloga Liliana Seger também avalia que, no longo prazo, isso pode resultar na aparição de sentimentos de raiva de forma mais frequente. "Para os indivíduos que têm uma impulsividade agressiva acentuada pode acabar gerando uma sensação de que ele só vai conseguir relaxar se brigar, xingar ou quebrar algo", diz.

De acordo com Patrícia Santos, especialista em gerenciamento de raiva pela Nama (National Anger Management Association) e coautora do livro "Raiva, quem não tem?", há três maneiras como as pessoas lidam com a raiva: explodindo, engolindo (ambas fazem muito mal) ou gerenciando.

Para gerenciar é preciso aprender qual o sentimento que está por trás da raiva, já que, apesar de ser uma emoção básica, a raiva geralmente é secundária, escondendo uma outra emoção ou sentimento. "Por trás da raiva pode ter medo, rejeição, frustração, tristeza, mágoa, culpa, vergonha, constrangimento, indignação por injustiça, ciúme, humilhação, estresse avassalador... Se a pessoa não souber primeiro identificar o gatilho, o que ocasionou sua raiva, não saberá lidar com ela", explica.

Melhores estratégias para lidar com a raiva

A seguir, as especialistas ensinam como evitar a perda do controle emocional devido à raiva:

  • Se você teve um aborrecimento com alguém, tente se acalmar primeiro antes de reagir. Se você se irritou enquanto estava conversando, respire profundamente, conte até 10 e lembre-se de que não adianta perder o controle, pois isso provavelmente não resolverá o problema;
  • Pratique exercícios respiratórios. Puxe o ar em quatro tempos, segure-o em quatro tempos, solte pela boca em seis tempos e recomece por umas 20 vezes. Isso ajuda a ativar o córtex pré-frontal do cérebro, região importante para o bom desempenho de nossas habilidades cognitivas, como atenção, resolução de problemas e tomada de decisão;
  • Faça relaxamento muscular: tensione cada músculo do corpo e, então, relaxe-os conscientemente para ajudar a se acalmar mentalmente e fisicamente;
  • Saia do ambiente, se isso for possível;
  • Reflita: será que há outro modo de ver o que está acontecendo?
  • Tome uma atitude quanto ao que o está aborrecendo que seja aceitável, como sair de perto, pedir explicações, falar de seus sentimentos e conversar abertamente sobre o assunto;
  • Exponha-se ao estressor. Isso é recomendado para muitos problemas, incluindo ansiedade, e envolve enfrentar algo que causa estresse, em doses pequenas, mas crescentes, até que você se sinta menos estressado e mais capaz de lidar com o estressor;
  • Invista no autoconhecimento. A psicoterapia é um ótimo caminho para começar a se entender mais e lidar melhor com os sentimentos;
  • Faça uma atividade divertida: assista a uma comédia, desenhe, dance, brinque com uma criança. Vale até ir com um grupo de amigos conhecer uma rage room. Se a intenção for uma brincadeira pontual, a experiência está indicada. Mas não esqueça de agendar também a sessão de terapia!