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Cavernoma cerebral fez Vivian passar por cirurgia delicada aos 17 anos

Vivian Medeiros, 22, teve um cavernoma cerebral - Arquivo pessoal
Vivian Medeiros, 22, teve um cavernoma cerebral Imagem: Arquivo pessoal

Giulia Granchi

Do VivaBem, em São Paulo

27/06/2021 04h00

Enxaquecas crônicas acompanhavam Vivian Medeiros, 22, desde criança.

Em 2016, aos 17 anos, buscando um medicamento mais efetivo para as dores, durante uma consulta médica na qual o especialista havia pedido exames, descobriu um cavernoma cerebral muito pequeno e localizado no tronco cerebral —um local considerado arriscado para cirurgia.

O cavernoma acomete uma a cada 200 pessoas. É uma malformação vascular que pode ser microscópica ou ter alguns centímetros. Semelhante a uma uma caverna, como o nome sugere, ele é formado por vários pequenos vasos sanguíneos que dilatam e podem sangrar.

Vivian em 2019, horas antes de entrar no centro cirúrgico às pressas - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Vivian em 2019, horas antes de entrar no centro cirúrgico às pressas
Imagem: Arquivo pessoal

"Pelo tamanho, o risco era considerado baixo e o benefício da cirurgia também. A indicação era apenas acompanhar a cada semestre", lembra.

Seis meses depois, ela teve uma semana difícil —foram três dias de dores intensas, indo e voltando do hospital para buscar ajuda.

A suspeita de algo mais grave surgiu após o incômodo não cessar nem com a ajuda de morfina.

"Quando saiu o exame, o médico falou sobre o cavernoma e eu disse que já sabia. Aconselhada por ele, voltei a marcar com o profissional que já me acompanhava e antes da data da consulta me ligaram do hospital. Queriam que eu fosse internada na UTI no mesmo dia. Não entendi nada", conta.

O neurocirurgião foi logo dizendo a Vivian que o caso era grave e a cirurgia, urgente. A mudança do quadro se deu por que o cavernoma cresceu muito e rapidamente.

De acordo com Roberto Carneiro, neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP), que não acompanhou o caso de Vivian especificamente, ao longo da vida o cavernoma pode se romper. "Imagine um pequeno buraco dentro do cérebro com uma veia dentro. Por ser uma veia, há uma pressão naquele espaço, podendo causar hemorragia", indica o médico.

Carneiro explica que para um cavernoma como o da jovem, no tronco cerebral, o normal é não operar. "A indicação muda se ele sangra ou se o tamanho pode comprimir outras estruturas. Por estar localizado próximo a estruturas nobres, a operação pode deixar sequelas", esclarece.

A primeira reação de Vivian, que estava com viagem marcada para fazer um intercâmbio de estudo fora do país, foi entrar em estado de negação. "Embora falassem que minha vida estaria em risco se o cavernoma estourasse, não queria me preocupar com isso. Fui procurar outras opiniões e todos os médicos diziam que meu caso era urgente."

Aos poucos, com o aconselhamento dos pais, ela foi cedendo às mudanças na vida que tinha —precisou abrir mão da viagem, parar de lutar jiu-jítsu e até raspou parte do cabelo durante a internação. "Era adolescente e não tinha maturidade para lidar com nada disso", diz.

A cirurgia de seis horas de duração foi feita em outubro de 2016 e por estar muito agitada depois que acordou, Vivian precisou ser induzida ao coma. "Foram 14 dias. Nesse tempo, tive hidrocefalia e edema na laringe. Meu estado era muito delicado", conta.

Vivian durante sessão de fisioterapia - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Vivian durante sessão de fisioterapia no hospital
Imagem: Arquivo pessoal

Para a recuperação completa, foram necessários mais 45 dias na UTI, se alimentando por sonda. "Ao todo, contando as semanas na enfermaria, foram dois meses no hospital. Dependia dos outros para tudo e entrei em depressão. Não queria ver fonoaudióloga, fisioterapeuta... Minha aparência também mudou bastante. A cola de um dos equipamentos que precisou ser usado na minha cabeça exigiu que eu raspasse parte do cabelo, o que me impactou bastante."

O quadro e a longa internação deixaram algumas sequelas: falta de equilíbrio, visão dupla e o uso permanente de uma válvula para drenar o líquido do cérebro devido à hidrocefalia.

Os médicos não sabiam explicar —não tinha nenhum caso na família e era muito jovem. Fiz muita terapia depois dessa primeira internação, fiquei revoltada. Foram dois anos em negação.

Nova cirurgia

No terceiro ano pós-cirurgia, 2019, Vivian passou a sentir muito sono. "Um dia dormi durante quase 24 horas. Minha mãe insistiu para que eu fosse ao médico", conta.

A válvula que tinha a função de drenar o líquido e deveria durar 25 anos havia entupido após apenas três. Nas horas seguintes, ela passou a não conseguir enxergar, andar e passou a vomitar muito. Uma nova operação foi marcada às pressas.

"Não me lembro direito desse dia. Todo o quadro afetou muito minha memória. Quando acordei, tinha sequelas. A visão dupla estava ainda mais agravada, mas a recuperação foi mais rápida. Em uma semana saí do hospital e continuei a osteopatia, um tipo de fisioterapia de manipulação craniana", explica.

O problema causado na visão a impede de realizar atividades como dirigir e a solução mais rápida seria fazer uma cirurgia. "Não quero passar por isso de novo. Fico na esperança que possa melhorar aos poucos, uma possibilidade apontada pelos médicos."

"Minha história pode fazer a diferença"

Passei por um longo processo para aceitar o que tive, agradecer a vida, por que eu tive várias oportunidades, e me entender comigo mesma. Parei de ficar questionando por que eu. Agora penso diferente, posso ser o exemplo para outros.

Para a jovem, hoje estudante de direito, a família foi o pilar que a manteve em pé.

"Adolescente, queria sair, curtir com meus amigos, não dava muita atenção à minha família. Mas na doença, embora ainda tivesse amigos, foi minha família que estava lá por mim. Meu pai, caminhoneiro, ficou dois meses sem trabalhar para poder ficar comigo. Conheci meu noivo antes da segunda cirurgia e ele também me deu muito apoio."

Vivian ao lado de seu cachorro  - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Vivian, jovem que teve cavernoma cerebral
Imagem: Arquivo pessoal

Embora tenha passado por um período sem aceitar o cavernoma cerebral, hoje Vivian se sente confortável em contar sua história. "Quando comecei a compartilhar, vi que minha história fazia diferença para outras pessoas que pensam que vão ter sequelas ou que não vão sobreviver."

Hoje, Vivian toma remédios para controlar as dores de cabeça todos os dias, não pode mais lutar jiu-jítsu por conta do impacto e da falta de equilíbrio, mas ela garante que vive bem.

"Não digo que é fácil, que todos os dias acordo agradecendo, sem dor. Mas passa. Tenho a saúde mais frágil, mas tenho qualidade de vida. Você aprende a conviver com isso."