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Prazo de 120 dias para ButanVac é apertado e otimista, dizem especialistas

Diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas (à esq.), e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), mostram caixa da ButanVac - Divulgação/Governo do Estado de São Paulo
Diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas (à esq.), e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), mostram caixa da ButanVac Imagem: Divulgação/Governo do Estado de São Paulo

Lucas Borges Teixeira

Do VivaBem, em São Paulo

16/06/2021 04h00

O prazo de 120 dias para a entrega dos resultados da ButanVac, como prometeu o governador João Doria (PSDB-SP), é otimista e apertado, avaliam especialistas. O período também não engloba a estimativa do Instituto Butantan, que produz a vacina.

A ButanVac foi liberada para estudo clínico na semana passada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). O instituto abriu um pré-cadastro de voluntários para a fase 1. O projeto precisa passar ainda pelos comitês de ética das universidades e poderá ser iniciado nesta semana.

Doria fez a promessa de resultados para outubro, "no máximo", em um evento na última segunda (14). Segundo ele, a expectativa é de Dimas Covas, diretor do Butantan.

É um anúncio com uma aritmética de tempo absolutamente otimista, esquecendo que o tempo da ciência nem sempre obedece a anseios políticos, vontade de controle de pandemia ou qualquer outro desejo. É possível? É. Mas você só pode acelerar o processo [de produção], não a ciência na comprovação da sua eficácia.
Renato Kfouri, diretor da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações)

Quando a ButanVac foi anunciada, em 26 de março, o governo de São Paulo previu o início da distribuição para julho. Em abril, a produção foi iniciada, e o cronograma, recalculado para setembro.

"O mais apertado é ver como a vacina vai se comportar nos indivíduos, o grau de proteção nas pessoas. É possível, mas é um estudo que realmente é bem apertado. Tem de ter um desenho muito adequado para chegar a um resultado fidedigno", afirma o virologista Fernando Spilki, professor da Universidade Feevale (RS).

Kfouri compara ainda com a CoronaVac, que também teve a expectativa adiada por mais de uma vez. "Naquela época [segundo semestre de 2020], os testes estavam em fase 3, aqui não está nem em fase 1", avalia o imunologista.

José Eduardo Levi, virologista do Instituto de Medicina Tropical da USP (Universidade de São Paulo), diz concordar que seja um prazo "bem otimista", mas não acha "de todo impossível".

"O estudo fase 1, que avalia dosagem e segurança, pode ser feito tranquilamente em um mês. Se acelerar a fase 2, mais um mês. Depois, teria de correr com a fase 3 em 60 dias. Esse é o mais complicado porque é ela que avalia a eficácia", diz Levi.

O plano inicial do Butantan era iniciar as fases 1 e 2 dos testes em humanos concomitantemente para pedir, após a 16ª semana, o registro para uso emergencial na Anvisa. Agora, procurado pela reportagem, o instituto disse apenas que "os testes clínicos de fase 1 e 2 da ButanVac têm previsão de quatro meses de duração".

Só este período já abraça o prazo de Doria. O Butantan não respondeu, no entanto, se pretende tentar aprovação sem a fase 3 (caso queira cumprir esta meta), algo descartado pela agência reguladora, como o UOL mostrou em maio.

Como funcionam as fases de estudo

Nas duas primeiras etapas, os pesquisadores testam grupos menores (de dezenas a centenas de voluntários) para avaliar se a vacina causa algum efeito colateral, se é tolerável ao nosso corpo e se causa resposta imune ao sistema (imunogenicidade).

É na fase 3, já com milhares de voluntários, que há a melhor avaliação sobre a segurança da vacina e, em especial, sobre a eficácia. Nesta fase, aplicam doses do imunizante e de placebo nos voluntários para avaliar o número de infectados e chegar a quanto ela, de fato, protege.

Neste período, são mais quatro a seis meses, pelo menos, para ter um resultado sólido —o que poderia jogar a conclusão com os resultados só para o início de 2022.

Uma facilidade, argumenta o Butantan, é que o instituto domina a tecnologia de produção com ovos embrionários, já usada na vacina da gripe, e que a ButanVac já é uma vacina de "segunda geração", testada depois da primeira leva de vacinas contra a covid.

Os pesquisadores preferiram não estabelecer prazos, mas ponderam que a principal dificuldade do instituto será encontrar um número robusto de voluntários que não tenham se vacinado —algo farto nos primeiros estudos.

O Butantan procura pessoas que nunca tiveram a doença, que já foram infectadas e que já foram imunizadas.

Antes, esse grupo [não imunizado] era farto. Como imagino que eles não queiram uma vacina apenas como reforço, vão levar mais tempo para encontrar diferentes grupos para contemplar, com o avanço da vacinação. Talvez testem em outros países. De qualquer forma, leva mais tempo.
José Eduardo Levi, virologista da USP

Uma opção, avalia o pesquisador, seria fazer estudos concentrados em um local específico, como o próprio Butantan fez com a CoronaVac em Serrana ou a Fiocruz com a AstraZeneca em Botucatu, ambas cidades do interior paulista após a aprovação das vacinas. A diferença é que os municípios eleitos serviriam para o estudo antes da liberação pela Anvisa.