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Grupo de pesquisadores defende mudar classificação da covid-19

Coronavírus tem causado trombose em muitos pacientes com covid-19 - iStock
Coronavírus tem causado trombose em muitos pacientes com covid-19 Imagem: iStock

Colaboração para o UOL

14/04/2021 16h20Atualizada em 15/04/2021 11h21

Um importante grupo de pesquisadores brasileiros entende que a covid-19 tem mostrado ser uma doença muito mais complexa do que parecia antigamente. Por isso eles defendem que a classificação dela deve ser alterada. Em vez de ser tratada como uma SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave), a covid-19 pode ser classificada como febre viral trombótica, segundo esses pesquisadores. Tal mudança aconteceria por causa da hipercoagulação causada pela doença, que se manifesta em diversos órgãos, do cérebro ao aparelho gastrointestinal.

Essa possibilidade foi levantada por especialistas de seis instituições de assistência médica e pesquisa científica no Brasil. São elas: Hospital Pró-Cardíaco, IOC/Fiocruz (Instituto Oswaldo Cruz), Unifase (Faculdade de Medicina de Petrópolis), Inca (Instituto Nacional do Câncer), Fiocruz Paraná (Instituto Carlos Chagas) e United Health Group.

Em um artigo recém-publicado na revista científica Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, esse grupo de cientistas defende que o novo coronavírus seja o primeiro agente reconhecido por atuar aumentando a formação de coágulos (também chamados de trombos) que podem obstruir a circulação.

O estudo se baseia em pesquisas feitas na Holanda e na França, que apontam altos índices de complicações ligadas à formação excessiva de coágulos na corrente sanguínea. As pesquisas indicam que o vírus favorece um estado de hipercoagulação.

"Em pacientes internados, vemos manifestações trombóticas a despeito da prática clínica usual de tromboprofilaxia (terapia para prevenir a formação de coágulos). Também há descrição de eventos tromboembólicos após a alta hospitalar, e a formação excessiva de coágulos é observada nas análises histopatológicas em casos de óbito por Covid-19", afirma Rubens Costa Filho, primeiro autor do artigo e coordenador da UTI do Hospital Pró-Cardíaco.

A mudança de classificação da covid-19 pode contribuir para o manejo clínico dos casos e para as pesquisas científicas, de acordo com os pesquisadores.

"Essa definição coloca em evidência a necessidade de medidas para monitorar e tratar as alterações da coagulação e aponta para questões que precisam ser esclarecidas, como a identificação de biomarcadores de gravidade, que possam ser utilizados para orientar as condutas terapêuticas", esclarece o autor sênior do estudo, José Paulo Gagliardi Leite, pesquisador do IOC.

Os pesquisadores também explicaram que a possível mudança de classificação não impactaria os atuais sistemas de monitoramento.

"A SRAG é uma nomenclatura utilizada para retratar um acometimento clínico inespecífico, uma vez que pode abranger uma série de manifestações. Já a febre viral trombótica, representaria uma síndrome específica. Essa definição é fundamental na área da Saúde", ressalta Costa Filho.

Outro avanço que a mudança de classificação causaria, de acordo com o estudo, é o desenvolvimento de testes. Entre eles, os pesquisadores chamaram atenção para o potencial de uma metodologia antiga e de fácil acesso, a tromboelastometria rotacional. Estudos recentes demonstram que essa técnica é capaz de detectar a hipercoagulação em pacientes com covid-19.

O estudo também aborda um potencial alvo terapêutico para os casos de hipercoagulação. Combater a enzima MPro pode ajudar na terapia dos doentes. "É possível que essa proteína atue como uma mola propulsora dos fenômenos trombóticos e vamos investigar essa hipótese. Os pacientes com Covid-19 ainda sofrem com a falta de tratamentos específicos. Um fármaco com ação sobre a MPro poderia atuar contra a infecção e ter efeito protetor contra a trombose", declara Hugo Castro Faria Neto, pesquisador do Laboratório de Imunofarmacologia do IOC.

Apesar de sugerir a mudança, o estudo também lembra que outros componentes da enfermidade não devem ser esquecidos.

"O comprometimento pulmonar é certamente muito relevante na Covid-19. O que o artigo destaca é que, nos quadros mais graves, de difícil tratamento, com exacerbação inflamatória grande, há coagulopatia", afirma o pesquisador do Laboratório de Inflamação do IOC Marco Aurélio Martins.