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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Quem é muito sensível pode se sentir excluído ou rejeitado; terapia ajuda

fizkes/Getty Images/iStockphoto
Imagem: fizkes/Getty Images/iStockphoto

Roseane Santos

Colaboração para o VivaBem

19/03/2021 04h00

A pensionista Maria da Penha Matias Santos, 77, conta até hoje com tristeza como uma amizade foi encerrada. "Eu tinha por volta de 20 anos e a Tereza vivia na minha casa", lembra. Só que no dia do casamento da amiga, Maria não compareceu à cerimônia. "Meu pai tinha morrido há pouco tempo e estava em uma situação financeira péssima. Não tinha roupa para ir. Antigamente era vergonha pedir algo emprestado", lembra. A amiga ficou tão ofendida que não quis saber nem o motivo da ausência dela na igreja. As duas se encontraram algum tempo depois, mas a amizade acabou. "Juro que não fiz pouco caso, não era desprezo, mas ela entendeu como se estivesse a rejeitando e se magoou muito", disse Maria.

Sentimentos de rejeição têm a ver com a característica de sensibilidade emocional de cada um, o que explica por que uns sofrem mais com determinadas situações do que outros, como foi o caso da amiga de Maria, que decidiu romper a amizade. Segundo Diogo Lara, psiquiatra pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), pessoas sensíveis se culpam com mais facilidade e são mais suscetíveis ao estresse e a traumas. "É como andar num carro sem amortecedor, você sente todos os buracos da rua, por menores que sejam", explica.

Lara diz que, muitas vezes, essas pessoas passaram por situações de abuso emocional, como ter sido alvo de ofensas, rótulos e comparações e negligência na família, ou seja, não se sentiram amadas e aceitas como são e receberam menos atenção do que precisavam.

Já a psicóloga Fabíola Luciano, especializada em terapia cognitivo-comportamental pela USP (Universidade de São Paulo), chama a atenção para uma motivação totalmente contrária. "Há pessoas que foram extremamente mimadas, elogiadas e valorizadas e se mostram sensíveis quando há falta desse hiperestímulo positivo. Elas também podem interpretar um silêncio como uma rejeição", explica.

A especialista acrescenta que pessoas que tiveram um histórico de rejeição acabam desenvolvendo uma percepção seletiva em relação a esse sentimento. "Vamos supor que eu acho que estou grávida e, quando saio na rua, começo a encontrar várias grávidas, a ver bebês, ligo a TV e só encontro programas ligado a crianças. Isso que dizer que o número de gestantes aumentou? Não. Significa que eu pinço essa percepção no ambiente e realmente parece que aumentou", exemplifica. Resumindo, uma pessoa que tem a "ferida emocional" em sua vivência pode perceber mais a rejeição e dar um valor muito maior a ela.

Desafios de quem se sente rejeitado

Existem várias situações em que algumas pessoas se sentem desprezadas de forma inusitada. Há quem fique afetado até quando uma mensagem é visualizada no WhatsApp e a resposta não vem de imediato, ou quando um amigo não curte seu post na rede social. "A gente tem uma necessidade de validação cada vez maior. Isso tem muito a ver com a aprovação social e acaba afetando a autoestima. Seja real ou imaginária, essa pessoa vai interpretar uma rejeição, tomar aquilo como verdade e passar a questionar os seus próprios valores", analisa a psicóloga.

Já a rejeição afetiva provoca uma dor profunda na maioria de nós. "Essa é uma característica do ser humano e não há nada de errado com isso. Em situações assim, tentar simplesmente mudar o pensamento não é fácil e raramente resolve a questão. Essa dor emocional está acontecendo em regiões profundas do cérebro que não são acessíveis", diz Lara. Ele explica que o pensamento, que é processado no córtex cerebral, reflete o que está acontecendo nessas regiões de emoções, por isso que os conselhos de alguém que está de fora surtem pouco efeito e podem até irritar quem foi rejeitado, porque ele não se sente compreendido.

Lara frisa que em situações de rejeição afetiva, o que precisa acontecer é um processo mais longo e complexo de luto, que envolve várias fases, passando por barganha, raiva e tristeza até se chegar à aceitação. "Daí sim se pode ter um pensamento mais claro sobre tudo que aconteceu. Esse processo costuma levar dias ou até meses, mas pode ser bastante abreviado com terapia".

O rejeitado deve passar por um trabalho terapêutico para mudar a sua visão, para entender outras perspectivas ou para que aprenda a gerenciar isso, porque rejeição faz parte da vida. Também vale olhar de uma forma neutra o ocorrido, de um modo que tenha a sua visão e também a da pessoa que o fez se sentir mal. É importante buscar mais evidências do que só se concentrar na sua vivência pessoal. Ninguém nunca vai gostar de se sentir rejeitado. O que é necessário fazer é desenvolver tolerância para lidar com isso.