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Diretor do Butantan diz que tomaria vacina segura, mesmo que imperfeita

Do VivaBem, em São Paulo*

07/10/2020 17h16Atualizada em 07/10/2020 20h26

Convidado desta quarta-feira (7) do ciclo "Conversas na Crise - Depois do Futuro", organizado pelo IdEA (Instituto de Estudos Avançados) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) em parceria com o UOL, Dimas Tadeu Covas, médico e diretor do Instituto Butantan (SP), deu detalhes sobre a vacina que está sendo produzida para combater a covid-19.

O programa também contou com a participação da jornalista Lúcia Helena, colunista de VivaBem, Maurício Nogueira, professor da Famerp (Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto), e Carlos Vogt, presidente do Conselho Científico e Cultural do IdEA, além da apresentação de Paulo Markun.

De acordo com Covas, os testes da chamada vacina CoronaVac, realizados em parceria com a empresa chinesa Sinovac, superaram as expectativas e ela está muito próxima de ser produzida. "Iniciamos os processos para a fase final da vacina. A expectativa é que fique pronta até o final do ano".

Para Covas, a vacina é segura e é uma das mais desenvolvidas do mundo, atualmente.

A vacina é necessária para diminuir a mortalidade e a gravidade dos casos. Se tivesse 40% de eficácia, eu seria o primeiro a tomar.

A eficácia mínima exigida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para registro de um imunizante é de 70%, mas Covas crê que pode haver uma flexibilização, movimento que já vem acontecendo com o FDA (órgão regulador dos EUA), por exemplo, que reduziu para 50%. "Isso é algo que precisa ser discutido do ponto de vista regulatório", mencionou.

Ele afirma que a imunização é a única forma de conter a disseminação da covid-19. "Estamos no meio de uma pandemia. Há um grande esforço mundial de recursos nunca vistos antes para a vacina chegar. Por isso, não é algo habitual. A vacina pode reduzir pela metade a mortalidade".

Transferência de tecnologia e registro

"Devemos começar a produção, de fato, em outubro, assim que chegar o primeiro lote de matéria-prima da China. A grande questão é se essa vacina estará aprovada ou não pela Anvisa, essa é a dúvida. Essa aprovação depende dos resultados do estudo clínico de fase 3 com 13 mil voluntários em 15 centros em 7 estados do Brasil", frisou.

Para ele, se os resultados de eficácia forem positivos e a Anvisa ajudar no registro, teremos um imunizante pronto no começo do ano para vacinar a população.

Até 3 meses atrás não se falava do Brasil em termos de vacina, estávamos sendo considerados retardatários. A posição do Brasil hoje é de destaque mundial.

O diretor do Butantan comentou que, na fase 2, a indução de resposta imune de anticorpos em 50 mil pessoas vacinadas na China foi superior a 98% após a segunda dose. "Estamos diante de dados que indicam que temos uma candidata vacinal muito sólida", disse. "Não podemos desconsiderar a possibilidade da introdução do uso emergencial das vacinas. Se tenho alguma coisa que seja segura e pode ajudar, eticamente isso me obriga a usá-la", explicou.

Tipos de vacinas

Segundo Covas, dentre as várias vacinas que estão sendo estudadas e desenvolvidas no mundo, as mais promissoras são baseadas em vírus inativados, como a CoronaVac.

"Sobre as vacinas com componentes genéticos e de proteínas, não há muita experiência anterior, por isso a preocupação mundial", disse.

Ele também comentou que as duas vacinas mais avançadas do mundo são a da Sinovac e a de Oxford, porém ambas têm matéria-prima vinda da China, já que a fábrica da AstraZeneca, que fornecerá para a Fiocruz produzir o imunizante aqui, fica no país da Ásia.

Ou seja, as duas vacinas são chinesas, mas uma tem um carimbo inglês.

Protocolo de imunização

Muita gente se pergunta sobre a quantidade de doses que serão necessárias e a prioridade na fila da vacinação contra o coronavírus. Covas explicou que quem decide isso é uma comissão do PNI (Programa Nacional de Imunizações), e tal protocolo ainda não existe.

"Espero que a comissão defina como prioridade os grupos que têm maior risco e, progressivamente na medida da disponibilidade, aos demais grupos. Nenhuma vacina é para toda a população", afirmou.

Ela comparou a futura vacina com a da gripe, cujo imunizante o Butantan produziu 80 milhões de doses este ano, o que dá 1 vacina para cada 3 brasileiros.

"Não temos certeza ainda do número de doses. Nesse momento, são 2 doses intervaladas de 14 dias, mas não sabemos a duração da proteção. Se teremos que tomar novamente daqui 6 meses, 1 ano, ou se não precisaremos mais tomar... Todas as questões serão respondidas pelos estudos clínicos", explicou.

Distribuição no país

Covas está preocupado com a distribuição no país de uma futura vacina, o que é feito pelo Ministério da Saúde. "Aqui no Brasil temos muita gente que ajudou bem o vírus, de alta patente. Nós poderíamos ter tido menos casos e mortos, mas faltou ação coordenada. Faltou o general da tropa que desse ordens coerentes a todo o Exército. Os estados estão deixados cada um por si. Cada um tem uma política e estratégia, mas não há uma ação coordenada, uma forma única de combater a epidemia", afirmou.

Ele disse que, até o momento, o Butantan ainda não tem um acordo com o Ministério da Saúde para o fornecimento da vacina que será produzida no instituto. "Isso preocupa muito e tem motivado o governador de São Paulo a dizer que, se a vacina não for incorporada pelo ministério, será incorporada no estado, o que na minha opinião seria um tiro no SUS. Estaríamos decretando o fim do SUS. Espero que haja um entendimento claro das autoridades federais que não estamos trabalhando por ideologia, mas, sim, por uma vacina eficaz", disse.

Outra questão abordada na entrevista foi o fenômeno da criação planejada de fake news para circular a desinformação. "Essa questão da cloroquina foi muito paradigmática, gastou-se milhões na promoção de uma coisa absolutamente inócua e prejudicial. A anti-ciência foi promovida a política de estado", disse.

*Com colaboração de Samantha Cerquetani