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Estudo da Prevent aponta menos internações para quem usou hidroxicloroquina

Por conta das limitações no estudo, os resultados não comprovam a eficácia, apenas indicam esperança - Brasil2/iStock
Por conta das limitações no estudo, os resultados não comprovam a eficácia, apenas indicam esperança Imagem: Brasil2/iStock

Giulia Granchi

Do VivaBem, em São Paulo

17/04/2020 16h00

Resumo da notícia

  • Estudo da Prevent Senior acompanhou pacientes com suspeita da covid-19 por telemedicina
  • Aqueles que aceitaram um termo de conscientização foram tratados com hidroxicloroquina + azitromicina
  • Resultados apontam 2,8 menos internações para quem usou as drogas
  • Estudo contém limitações no modo de pesquisa e levanta dúvidas sobre o uso precoce do remédio (sem a confirmação da doença)
  • Pesquisadores respondem dúvidas e justificam possíveis falhas pela urgência da situação
  • O estudo ainda não foi publicado em nenhum periódico científico

A eficácia do uso do medicamento hidroxicloroquina (amplamente usado no tratamento de lúpus e artrite reumatoide) para combater a Covid-19 já foi testada em diversos estudos. Até o momento, alguns trabalhos científicos concluíram que o remédio pode ajudar no combate à doença causada pelo novo coronavírus, enquanto outros não mostraram melhora alguma.

Mas se o foco dos artigos anteriores era pacientes já em estado grave (ou caminhando para tal), agora, uma nova pesquisa feita pela rede Prevent Senior aponta resultados positivos em idosos que apresentavam apenas os sintomas e foram medicados com a droga e o antibiótico azitromicina (prescrito para o tratamento de várias infecções de origem bacteriana).

No estudo, o uso dos medicamentos foi capaz de reduzir em mais de duas vezes o número de internações, comparado com pacientes que não tomaram os remédios. É importante ressaltar que a pesquisa tem uma série de limitações, conforme explicamos mais abaixo, como não saber se os pacientes que receberam o tratamento estavam infectados com coronavírus nem ter sido aceita ainda em um periódico científico.

Segundo os pesquisadores, o tratamento pode evitar ao menos uma internação em cada grupo de 28 pessoas que recebe os medicamentos, diminuindo o sofrimento dos pacientes e liberando mais leitos nos hospitais. Para explicar esse número de forma bem básica, a cada 28 voluntários que não usaram a hidroxicloroquina + azitromicina, 1,5 foi internado. Já a cada 28 que receberam o tratamento, 0,5 foi hospitalizado.

Abaixo, VivaBem explica como os testes foram feitos e responde às principais dúvidas sobre os questionamentos de limitações do estudo — já que a análise não seguiu alguns pontos que cientistas consideram importantes.

Como o estudo foi feito

  • A pesquisa incluiu 636 pacientes beneficiários da Prevent Senior.
  • Os 412 pacientes (64,7% do total) que foram avaliados por equipes de telemedicina e sugeridos a iniciar o tratamento com hidroxicloroquina associada à azitromicina assinaram um termo de autorização previamente ao início da prescrição dos medicamentos.
  • 224 pacientes (35,2%) decidiram por bem não aceitar a medicação. Eles se tornaram o grupo de controle do trabalho, tendo sido tratados exclusivamente via terapias tradicionais.
  • Todos foram acompanhados.
  • A idade média dos 636 pacientes era de 62,5 anos e 400 (64%) eram mulheres. Adicionalmente, 85 (13,4%) pacientes foram diagnosticados com diabetes mellitus 2, 168 (26,5%) tinham histórico de hipertensão, 49 (7,7%) eram obesos e 17 (2,7%) fumantes.

O que os resultados apontam

De acordo com o que foi documentado pelos pesquisadores, entre os 412 pacientes que fizeram uso precoce da medicação, apenas 1,9% precisaram de internação.

Entre os 224 pacientes do grupo controle, 5,4% tiveram que ser internados —uma necessidade 2,84 vezes maior.

Quais são as limitações do estudo?

Por enquanto, a análise não está disponível em nenhum periódico científico e aguarda a publicação do pre-print no MedRXiv, um portal que aceita a divulgação de pesquisas sem a "revisão por pares", um método usado para a confirmação da validade da ciência relatada.

De acordo com Rachel Riera, coordenadora do Núcleo de Avaliação de Tecnologia em Saúde do Hospital Sírio-Libanês e professora de medicina baseada em evidências da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), maioria dos estudos feitos com os medicamentos, a falta de randomização (a determinação dos grupos não foi aleatória e sim feita pelos próprios paciente, de acordo com o seu consentimento) é um dos problemas. "As pessoas não poderiam saber em qual grupo estavam e uma forma de fazer isso é o placebo, que não foi usado", indica.

A médica aponta também que por não serem casos definidos da doença (os pacientes não tinham diagnóstico confirmado), a probabilidade de ter um desfecho melhor é maior. "Um dado fundamental seria saber o número de pacientes não internados que realmente tinha a Covid-19", explica.

Pesquisadores reconhecem limitações e as justificam pela urgência

Em entrevista ao VivaBem, o cardiologista Rodrigo Barbosa Esper, diretor-científico do grupo Prevent Senior, responde às principais dúvidas sobre a confiabilidade do estudo:

Por que o estudo não fez randomização ou ofereceu placebo a um terceiro grupo de pacientes?

RB: Normalmente, dividiríamos os grupos em números iguais e daríamos placebo para metade dos pacientes. Mas os resultados de uma abordagem assim demorariam meses e a situação é extrema. Em menos de um mês, a pandemia matou centenas no Brasil e milhares no mundo. Apesar de não ser uma metodologia perfeita, é uma tentativa de trazer respostas mais rápidas.

Também fazemos parte de outros estudos empíricos com Einstein e outros hospitais, que levarão meses e trarão respostas mais concretas.

Por que tomaram a decisão de administrar as drogas em pacientes apenas com a suspeita?

RB: O que observamos no tratamento de pacientes é que, para os casos graves, a hidroxicloroquina talvez não tenha tanto efeito, por que o principal problema é a inflamação dos pulmões.

Nos casos mais leves, o obstáculo é o vírus se espalhando e o efeito do remédio é justamente impedir a replicação viral.

Sabemos que a hidroxicloroquina oferece riscos como distúrbios de visão, irritação gastrointestinal, alterações cardiovasculares e neurológicas. É seguro oferecer a droga a pacientes que nem mesmo tenham a confirmação da Covid-19 e que são idosos?

RB: Se chegarem ao estado que necessita de internação, a chance de morte desses pacientes com mais de 60 anos é alta. Além disso, os efeitos colaterais geralmente acontecem quando a pessoa faz o uso contínuo do medicamento, por um mês ou mais.

Em nosso estudo, os participantes usaram apenas por sete dias. Eles também foram acompanhados por médicos durante todo o processo e nenhum efeito colateral grave foi relatado (o mais comum foi diarreia).

Por que o estudo ainda não foi publicado em periódicos científicos?

RB: O processo de uma publicação científica pode demorar meses e o caminho perfeito da ciência infelizmente não tem a mesma velocidade da pandemia.

Entendemos que é nossa responsabilidade social divulgar algo que consideramos uma boa resposta mesmo que não seja algo definitivo. Isso pode ajudar colegas em cidades onde muitos estão morrendo e não há testes para confirmar os casos.

Não há cloroquina suficiente para tratar todos os pacientes no Brasil

A Prevent Senior alerta que, no momento, não existem no país estoques de hidroxicloroquina suficientes para tratar todos os doentes de Covid-19 que recorrem ao sistema de saúde.

A razão para isto é o fato de o sal de cloroquina, insumo básico a partir da qual é feita a hidroxicloroquina, só ser produzido na Índia, país que embargou todas as exportações do produto devido à pandemia.