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Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


UOL Debate: evidências sobre cloroquina são pobres, mas foco é salvar vidas

Do VivaBem, em São Paulo

16/04/2020 14h23Atualizada em 17/04/2020 20h21

Na edição desta quinta-feira (16) do UOL Debate, especialistas discutiram o que a ciência já sabe e ainda tem a descobrir sobre o uso da cloroquina contra o coronavírus, além de sua eficácia e os prós e contras de utilizá-la para tratar a covid-19. A mediação do painel ficou a cargo da jornalista Lúcia Helena, colunista de VivaBem.

Todos os médicos participantes concordaram que as evidências científicas apresentadas até agora sobre a hidroxicloroquina e a cloroquina são pobres, mas que trata-se de uma doença desconhecida e todas as armas devem ser usadas porque o foco é salvar vidas.

"Certezas são poucas. O nível de evidência até agora, apresentado para a cloroquina, é pobre. Existem alguns estudos com resultados ambíguos. Aí entra um outro lado: há uma ansiedade de chegar a um tratamento de uma doença desconhecida. Nesse tipo de situação, muitas vezes fazemos coisas que não seriam esperadas diante das evidências apresentadas", explicou Estevão Portela Nunes, infectologista do Instituto Nacional de Infectologia da Fiocruz.

"Hoje a medicina mudou, é baseada em protocolos. Essa doença é nova e pegou o mundo inteiro de surpresa e estamos aprendendo a lidar com ela agora. Estudo sério, demora. Só daqui a uns meses, saberemos se tem uma eficácia ou não. Nós não temos uma arma direta contra esse vírus, não temos vacina. Se sabe que é uma gama de tratamentos, a hidroxicloroquina é uma parte desse pacote, e suporte de UTIs e hospitais também. É um debate em cima de um remédio que virou questão nacional. Faz parte das medicações que teriam que ser usadas em pacientes mais graves. Estudos demoram e os pacientes morrem, mas em ambiente hospitalar, a chance de complicação é muito pequena", afirmou Roberto Kalil Filho, cardiologista, diretor clínico do Incor e colunista de VivaBem.

"Eu entendo os dois lados. O paciente grave e a prevenção. A gente quer dados o mais rápido possível", continuou Nunes. "O número de evidências é limitado, mas creio que os nossos estudos no Brasil serão muito melhores", comentou Nilse Yamaguchi, oncologista, imunologista e diretora da Associação Brasileira de Mulheres Médicas.

Politização do remédio

Nas últimas semanas, o debate acerca da cloroquina e da hidroxicloroquina foi alvo de disputas políticas e também de diferentes pontos de visto entre médicos.

"É um volume muito grande de pacientes e precisamos de respostas rápidas. Médicos, não hesitem em produzir ciência, precisamos disso. Reconhecemos que é importante encontrar medicação, mas precisamos de mais dados. Não pode ter torcida em volta disso, a ciência não pode ter bandeira, temos que ter perguntas e respostas", criticou Pedro Benedito Batista Jr., diretor médico da Prevent Senior.

"Os EUA perdoaram o produto para tê-lo lá. Se fosse tão ruim assim, não haveria tanta busca por isso. O que quero muito são os dados dos estudos, mas que vai ser bombardeado, coragem...", afirmou Yamaguchi.

Caso da Prevent Senior

A Prevent Senior é um plano de saúde voltado para a terceira idade, com a maioria dos clientes nessa faixa etária, por isso, cerca de 25% dos casos de morte pela covid-19 na cidade de São Paulo acontecem lá, o que a faz até ser investigada pela Prefeitura de São Paulo.

"A partir do momento em que começamos a avaliar a doença, precisávamos entendê-la. A minha média de idade na Prevent é 68 anos. A hidroxicloroquina com azitromicina começou a ser usada nos pacientes graves. Na hora em que começamos a introduzir as medicações no início da doença, eles evoluíram com resposta adequada, e nos pacientes graves não foi tão adequada. Então começamos a puxar a régua mais para trás. O trabalho que publicaremos nos próximos dias tem 632 pacientes, 412 aceitaram tomar a medicação e cerca de 200 não aceitaram e nem por isso deixaram de ser acompanhados", explicou Batista Jr.

O plano de saúde também começou a ministrar hidroxicloroquina para pessoas com sintomas leves em casa. Os resultados desse estudo devem ser publicados nos próximos dias. O diretor médico adiantou que a cada 28 tratamentos, uma internação é evitada.

"Não é que estão dando como se fosse bala de goma. As indicações mais clássicas são para pacientes monitorados em hospitais. Não estou dizendo que todo mundo em casa tem que tomar hidroxicloroquina, mas ela é usada em casa há décadas [para outras doenças, como lúpus e artrite]. O uso em casa, regular, dentro de um protocolo científico, além de evitar a doença, você evita o colapso do sistema de saúde. É claro que há opiniões diversas porque estamos numa guerra. É claro que o desejo dos médicos é para o bem do doente, queremos que os doentes não morram", disse Kalil.

Para Nilse, trata-se de uma substância segura. "A maior parte do que está escrito na bula não ocorre numa dose de 5 dias. A bula é feita para quem usa semanas e meses".

Outras emergências médicas

Dados têm demonstrado que o atendimento a outras emergências médicas tem diminuído nos hospitais. O próprio Kalil, diretor do Incor, apontou que no período pré-pandemia, o hospital atendia cerca de 60 infartos por dia. Nas últimas semanas, esse número não passa de 10.

"As pessoas estão passando mal em casa e não vão ao médico. Os PSs estão vazios porque as pessoas estão morrendo em casa. Não deixe de ir ao médico. Tem gente deixando até de fazer quimioterapia. As pessoas estão mal interpretando isso. O coronavírus não vai te pegar na rua que nem um fantasma. As pessoas estão confundindo e acredito que por falta de informação. Uma coisa é fazer isolamento, mas tem que ser responsável", concluiu o cardiologista.

Estudo no Amazonas

Em determinado momento do debate, Pedro Benedito Batista Jr., diretor médico da Prevent Senior, citou que um estudo sobre cloroquina encabeçado pela FioCruz no AM, interrompido por motivos de segurança, tem um número de registro que não consta na Plataforma Brasil, do Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisado) do Ministério da Saúde, e por isso não teria sido aprovado.

Realmente, ao pesquisar pelo Conep informado no artigo científico, ele não aparece na Plataforma Brasil. Segundo a assessoria de imprensa da CloroCovid-19, isso acontece pois no artigo artigo saiu o número do parecer de aprovação do protocolo inicial pela Conep. Mas ao fazer a busca no sistema pelo CAAE 30152620.1.0000.0005 do estudo é possível encontrar o registro.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado, o CAAE do estudo da FioCruz é 30152620.1.0000.0005 e não 30504220.5.0000.0005. A informação já foi alterada na reportagem.