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Estudo aponta ligação entre poluição do ar e abortos

Poluição em Pequim, na China - Kim Kyung-Hoon/Reuters
Poluição em Pequim, na China Imagem: Kim Kyung-Hoon/Reuters

Charli Shield

17/10/2019 16h06

Alto nível de poluição do ar da China tem sido associado a mortes prematuras, doenças respiratórias e infertilidade. Agora, um estudo afirma que poluentes atmosféricos aumentam o risco dos chamados abortos retidos. Um adulto saudável respira cerca de 20 mil vezes por dia. E se este adulto vive numa metrópole como Pequim, ele provavelmente inalará por meio das milhares de respirações uma mistura nociva de produtos químicos e poluentes.

De acordo com a campanha internacional BreathLife, o ar na capital chinesa está 7,2 vezes acima dos níveis de poluição seguros, segundo as diretrizes estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para gestantes, o alto nível de poluição significa um aumento no risco de abortos retidos - quando o embrião morre ou não se desenvolve, mas não é expelido do útero -, sugeriu um novo estudo em larga escala divulgado na publicação científica Nature Sustainability.

A poluição do ar notoriamente aumenta o risco de parto prematuro, recém-nascidos abaixo do peso e complicações de saúde que acarretam risco de morte para mulheres grávidas, como a pré-eclampsia, marcada por pressão alta ou hipertensão gestacional. Mas a ligação entre a poluição e abortos retidos tem sido mais difícil de se estabelecer.

O novo estudo - uma colaboração de 16 autores diferentes de várias universidades da China - examinou retrospectivamente os registros de mais de 250 mil mulheres grávidas em Pequim de 2009 a 2017 em relação à exposição destas mulheres à poluição do ar.

Entre as mulheres cujos registros clínicos foram estudados, 17.497 (6,8%) tiveram abortos retidos. Aliado às considerações de diferentes idades, ocupações profissionais e temperatura do ar, os pesquisadores descobriram que a probabilidade de abortos retidos aumentava em áreas com maiores concentrações de poluentes no ar.

Mulheres com mais de 39 anos, assim como agricultoras e operárias, possuíram um risco maior de aborto retido associado à poluição do ar, afirmaram os autores do estudo.

Os pesquisadores definiram "poluição do ar" como consistente de quatro poluentes: material particulado (PM), dióxido de enxofre, ozônio e monóxido de carbono. Eles então calcularam os níveis com base em dados históricos da rede de monitoramento de qualidade do ar de Pequim.

Os autores do estudo apontaram que pesquisas anteriores descobriram que, quando as mulheres grávidas são expostas em longo prazo à poluição do ar, os poluentes são capazes de atravessar a barreira sanguínea materno-fetal e afetar o feto.

Ultrafino e ultratóxico

A maioria dos poluentes atmosféricos produzidos pelo ser humano é extremamente pequena: o material particulado (PM) tem aproximadamente o diâmetro de um fio de cabelo, e o material particulado ultrafino é ainda menor. É tão pequeno que, de fato, pode trafegar dos pulmões para a corrente sanguínea e circular no cérebro.

Os inúmeros efeitos nocivos à saúde causados pela poluição do ar são bem conhecidos e variam de doenças respiratórias e declínio cognitivo de crianças até infertilidade, síndrome dos ovários policísticos e demência. Quase um milhão de crianças morrem todos os anos de pneumonia, e metade dessas mortes está relacionada à poluição do ar.

O estudo chinês não é o primeiro a encontrar um elo entre poluição do ar e abortos. Em fevereiro de 2019, um estudo realizado em Salt Lake City, nos Estados Unidos, publicado na revista Fertility and Sterility, descobriu que um aumento de 20 microgramas de nitrogênio de dióxido de carbono por metro cúbico está associado a um aumento de 16% no risco de aborto.

O estudo americano analisou o registro de cerca de 1.300 mulheres entre 2007 e 2015, que foram ao pronto-socorro após abortos. Os pesquisadores constataram que o elo mais forte entre a poluição do ar e a gravidez perdida era o nível de dióxido de nitrogênio nos sete dias anteriores ao aborto.

Guerra contra a poluição

Há cinco anos, o governo chinês declarou uma tanto controversa "guerra contra a poluição", mas os níveis de poluição do ar em muitas cidades do país ainda são extremamente tóxicos.

Com as emissões globais de gases do efeito estufa não mostrando sinais de desaceleração, a China não é o único país com um grave problema de poluição do ar. A Organização Mundial da Saúde afirmou que 91% da população mundial vivem em cidades nas quais o ar é considerado tóxico.

Os autores do estudo chinês observaram que precisam fazer mais pesquisas para entender como exatamente a poluição do ar afeta o embrião e o feto.

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Autor: Charli Shield