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Coronavírus: o que se sabe sobre o uso do ibuprofeno para tratar sintomas da doença

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Da BBC News Brasil

17/03/2020 18h52

Porta-voz da OMS disse que remédios indicados para os sintomas são outros, mas não há contra-indicação formal da OMS sobre o assunto no momento -- entidade diz que são necessários mais estudos.

Muitas dúvidas e questionamentos sobre o uso do medicamento ibuprofeno surgiram após o ministro da Saúde da França levantar preocupação com o uso do remédio no combate aos sintomas do novo coronavírus em sua conta no Twitter.

Nesta semana, gerou ainda mais questionamentos a notícia de que um porta-voz da Organização Mundial da Saúde (OMS) disse que a entidade não recomenda o remédio para quem decidir se automedicar.

"Nós estamos recomendando paracetamol, não ibuprofeno", disse Christian Lindmeier em uma coletiva de imprensa em Genebra, na qual alertou que os cientistas ainda estão investigando a questão.

Essa fala não quer dizer que haja uma contraindicação formal da OMS para o uso de ibuprofeno no momento, diz a organização à BBC News Brasil.

"A Organização Mundial da Saúde está ciente de preocupações com o uso de remédios anti-inflamatórios não-esteroides (ibuprofeno, por exemplo) para o tratamento da febre em pessoas com covid-19", afirma a entidade, citando o nome oficial da doença provocada pelo novo coronavírus.

"A OMS está reunindo evidências mais aprofundadas sobre essa questão, mas depois de uma breve revisão da literatura [científica], não está ciente de dados publicados sobre esse tópico com base em pesquisas clínicas ou populacionais."

Mas, afinal, de onde surgiu essa preocupação e quais as evidências científicas sobre a questão?

Investigação em andamento

O alerta do ministro francês no Twitter foi motivado por estudos que ainda estão em andamento e investigam se anti-inflamatórios (como o ibuprofeno) podem facilitar de alguma forma o aumento da infecção em uma pessoa contaminada por coronavírus.

"É importante lembrar que os estudos estão em andamento e ainda não há uma conclusão científica sobre o assunto", diz André Bacchi, professor de farmacologia do curso de medicina da Universidade Federal de Rondonópolis.

Especialistas ouvidos pela BBC dizem que, por precaução, é melhor dar preferência para paracetamol ou dipirona em caso de febre e suspeita de coronavírus. Mas também é preciso tomar cuidado com o pânico e jamais abandonar medicamentos prescritos por um médico sem consultá-lo.

"É importante alertar contra o pânico porque as pessoas não podem abandonar medicamentos prescritos por médicos nem correr para estocar paracetamol", explica Bacchi.

Qual a relação entre ibuprofeno e o coronavírus?

O ibuprofeno é um tipo de anti-inflamatório leve, que é vendido comercialmente no Brasil sob diversos nomes, incluindo Advil e Motrin.

Para entender melhor as pesquisas científicas que estão sendo feitas para investigar se infecção é afetada pelo remédio, é preciso saber a diferença entre esses três termos: analgésicos, anti-térmicos e anti-inflamatórios.

Analgésicos são remédios para a dor, enquanto anti-térmicos ajudam no combate à febre. Anti-inflamatórios são remédios que atuam na diminuição de processos inflamatórios no corpo — que são reações do organismo a uma infecção ou lesão a um tecido. Durante uma inflamação, o corpo amplia o fluxo de sangue para o local, deixando a região atingida vermelha e quente.

Como a febre é um dos sintomas do coronavírus, analgésicos e anti-térmicos podem ser usados para aliviar os sintomas. No momento, segundo o Ministério da Saúde e a OMS, aliviar os sintomas e tratar possíveis complicações geradas pela covid-19 são as únicas formas de tratamento para quem está doente — não existe nenhum tipo de remédio ou vacina que combata o coronavírus em si.

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O ibuprofeno é um antiinflamatório leve
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Em teoria, anti-inflamatórios também poderiam ser usados para combater os sintomas. No entanto, o pronunciamentos do porta-voz da OMS e do ministro de Saúde francês aconteceram depois que um artigo de revista científica Lancet sobre o coronavírus citou a possibilidade de anti-inflamatórios, incluindo o ibuprofeno, agravarem a infecção.

"O artigo da Lancet cita estudos sobre como diversas variedades de coronavírus parecem usar uma enzima especifíca (enzima conversora da angiotensina-2, ou ACE2) que temos no organismo como forma de entrar nas células", explica Bacchi. "O artigo fala de suspeitas de que anti-inflamatórios, incluindo o ibuprofeno, possam aumentar a produção dessa enzima."

Se o corpo tiver mais dessas enzimas, diz Bacchi, o coronavírus teria mais facilidade de se alastrar no organismo de uma pessoa que tenha contato com ele, tornando mais difícil a recuperação da pessoa.

"No entanto ainda não há evidências fortes de que anti-inflamatórios aumentam essa enzima, é uma suspeita", diz Bacchi.

Bacchi afirma que, embora "não existam evidências científicas que possam estabelecer um contra-indicação formal" aos serviços de saúde, "por via das dúvidas, é melhor evitar a automedicação com anti-inflamatórios, por precaução."

"No Brasil as pessoas têm a opção de usar dipirona e paracetamol", diz o médico Leonardo Weissmann, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologista.

"Mas é bom lembrar que (automedicação) é só para sintomas leves, em caso de dificuldade de respirar é preciso procurar o médico."

Ninguém deve interroper sozinho uso de remédios prescritos

Bacchi, alerta, no entanto, que os anti-inflamatórios são essenciais no combate a algumas outras doenças — como asma e artrite reumatóide, por exemplo — e que quem usa medicamentos prescritos contra essas doenças não deve deixar de tomá-los.

"Nesse tipo de situação os benefícios do remédios em comparação com possíveis riscos são avaliados caso a caso pelos médicos, então é importante procurar o médico e aguardar uma avaliação caso a caso, jamais parando com um remédio prescrito por conta própria", diz Bacchi.

Além disso, diz o farmacologista, não é preciso sair correndo para estocar paracetamol ou dipirona, o que poderia acabar tornando os medicamentos indisponíveis em alguns locais.

O Ministério da Saúde do Brasil disse na segunda-feira que não há nenhuma evidência que justifique a contraindicação formal do medicamento. "Nossa Secretaria de Ciência e Tecnologia fez revisão bibliográfica e, neste momento, não há nenhum motivo, nem comprovação científica para que haja substituição do ibuprofeno", afirmou João Gabbardo, secretário executivo do Ministério da Saúde.

Na terça, no entanto, Gabbardo disse que em função das atualizações o "Ministério da Saúde stá fazendo uma avaliação e deve emitir nova nota sobre o uso desse medicamento" amanhã.