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De volta às quadras: cheerleader mirim relata na internet recuperação após hemorragia cerebral

Após mais de dois anos de recuperação, Kiki voltou às quadras ao lado das antigas colegas na equipe de cheerleaders, desta vez em uma cadeira de rodas - Arquivo Pessoal
Após mais de dois anos de recuperação, Kiki voltou às quadras ao lado das antigas colegas na equipe de cheerleaders, desta vez em uma cadeira de rodas Imagem: Arquivo Pessoal

Alessandra Corrêa

De Winston-Salem (EUA) para a BBC News Brasil

02/03/2020 12h44

Keira Cunningham voltou a se apresentar ao lado das colegas na equipe de cheerleaders dois anos após ficar paralisada parcialmente.

A menina americana Keira Cunningham tinha oito anos de idade e era uma dedicada cheerleader mirim quando, em setembro de 2017, sofreu uma hemorragia cerebral que a deixou parcialmente paralisada.

Quando chegou ao hospital, seu caso era tão grave que os médicos não sabiam se ela sobreviveria.

"Não tínhamos ideia se ela voltaria. E, se sobrevivesse, de como seria sua vida", diz à BBC News Brasil sua mãe, Lauren.

Mas, no mês passado, aos 10 anos de idade e depois de mais de dois anos de um longo processo de recuperação, Kiki, como é chamada por familiares e amigos, voltou às quadras em uma apresentação ao lado das antigas colegas na equipe de cheerleaders, desta vez em uma cadeira de rodas.

Ela e a família relatam sua evolução em uma página no Facebook, que começou como uma maneira de atualizar parente em outros Estados sobre a saúde da menina, mas que agora tem mais de 2 mil seguidores.

Hemorragia cerebral

Lauren conta que a filha sempre foi uma menina alegre e saudável, que adorava praticar esportes e nunca teve problemas de saúde. Mas, naquela tarde de setembro, depois de uma visita com a família à Estátua da Liberdade, Kiki reclamou de dor de cabeça.

"Era um dia muito quente", lembra Lauren. "Eu achei que fosse o calor, lhe dei água e um remédio, e ela se deitou um pouco. Depois de meia hora, estava bem e foi para a rua brincar com os primos."

Inicialmente, os médicos não sabiam se Keira iria sobreviver, após uma operação de emergência - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Inicialmente, os médicos não sabiam se Keira iria sobreviver, após uma operação de emergência
Imagem: Arquivo Pessoal

Pouco depois, a dor voltou mais forte, e a menina começou a gritar e desmaiou. Kiki foi levada às pressas ao hospital mais próximo, onde médicos descobriram que ela havia sofrido uma hemorragia no cerebelo esquerdo devido a uma malformação arteriovenosa, um vaso sanguíneo defeituoso que cresce e acaba se rompendo.

A menina foi então transferida para o centro médico de Westchester, em Nova York. "Ela foi submetida a uma cirurgia de emergência e ficou em coma induzido por um mês", relata a mãe.

Segundo a médica Ruth Alejandro, que supervisionou o tratamento e a recuperação de Kiki no Hospital Infantil Blythedale, no condado de Westchester, em Nova York, para onde a menina foi transferida após um mês, cerca de 3% de todos os pacientes com malformação arteriovenosa cerebral são crianças.

"Malformações arteriovenosas pediátricas são lesões vasculares congênitas raras e têm maior risco de ruptura do que em adultos. São a causa mais comum de hemorragias intracranianas espontâneas (sangramento cerebral) em crianças", diz Alejandro à BBC News Brasil.

"Uma hemorragia intracraniana espontânea é geralmente considerada uma das complicações mais devastadoras de uma malformação arteriovenosa, com alta taxa de mortalidade, especialmente em casos pediátricos", observa a médica.

Recuperação

Kiki foi submetida a uma traqueostomia para voltar a respirar e ganhou uma sonda no estômago para se alimentar. Lauren lembra que, ao iniciar o tratamento no hospital Blythedale, a família foi alertada de que o processo de recuperação seria lento.

Mas, ao chegar ao hospital, Kiki abriu os olhos. "Foi a primeira vez que ela abriu os olhos em um mês", recorda a mãe. "E, aos poucos, ela começou a progredir."

A menina teve de reaprender a comer, sentar, ficar em pé e caminhar. Segundo a médica, ela já consegue caminhar cerca de 30 metros com a ajuda de fisioterapeutas. Ela também já consegue controlar sua cadeira de rodas motorizada.

Lauren diz que, aos poucos, a filha reaprende a comer por conta própria, apesar de ainda usar uma sonda, e tem começado a tentar usar o lado esquerdo do corpo, que ainda está debilitado. A mãe conta que Kiki também aos poucos volta a falar, mas se comunica principalmente por escrito.

A menina passou 15 meses hospitalizada e teve de reaprender a comer, sentar, ficar em pé e caminhar. Ela ainda recebe terapia para reaprender a falar, fisioterapia, terapia ocupacional e outros tratamentos - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
A menina passou 15 meses hospitalizada e teve de reaprender a comer, sentar, ficar em pé e caminhar. Ela ainda recebe terapia para reaprender a falar, fisioterapia, terapia ocupacional e outros tratamentos
Imagem: Arquivo Pessoal

"Ela começou escrevendo o nome dos irmãos", lembra Lauren. Os dois irmãos tinham 13 e nove anos de idade quando Kiki sofreu o derrame.

"(No início) ela mal conseguia segurar um lápis, mas do nada escreveu o nome do irmão, e não parou mais", diz a mãe. "Ela escreve frases completas e bonitas, melhor do que muita gente."

Kiki é extremamente comunicativa e também usa um aplicativo em seu tablet, parte de um programa de tecnologia assistiva que a ajuda a se comunicar. Segundo sua médica, ela tem uma "personalidade maravilhosa" e sua motivação é um fator importante na recuperação.

Depois de 15 meses, a menina recebeu alta. Mas ela ainda vai ao hospital cinco dias por semana para fazer terapia de fala, fisioterapia, terapia ocupacional e outros tratamentos. Kiki também cursa o quinto ano do ensino fundamental na Mt. Pleasant-Blythedale, escola pública que funciona dentro do próprio hospital.

Lauren conta que, durante todo o tempo em que Kiki esteve hospitalizada, a técnica e as colegas da equipe de animadoras de torcida a visitaram. "Quando a nova temporada (de jogos) estava para começar, perguntei o que achavam da ideia de Kiki retornar, mas em sua cadeira de rodas, e eles ficaram empolgados", afirma.

Segundo a mãe, Kiki diz que é bom estar de volta, apesar de ser difícil saber que (antes) era ser capaz de fazer as rotinas de pé e pular. "Ela tenta fazer os movimentos da melhor maneira possível. É quase como uma outra terapia para ela", observa a mãe.

Quando Kiki ficou doente, Lauren e o marido, Chad, decidiram criar uma página no Facebook para manter familiares e amigos informados sobre o estado de saúde e a recuperação da filha.

Por meio da página, chamada de Kiki Strong (Kiki Forte, em tradução livre), a menina e a família recebem mensagens de apoio de amigos e estranhos, e entraram em contato com outros sobreviventes de derrame.

Lauren diz que a doença de Kiki mudou completamente a vida da família, que vive nos arredores de Nova York. "Em um segundo tudo está feliz e perfeito, e a vida é boa, e no momento seguinte você não sabe se ela vai sobreviver e como (sua vida) vai ser."

Mas ela ressalta que Kiki continua sendo uma menina esperta, divertida e determinada. "Ela é o tipo de pessoa que nunca desiste", diz a mãe. "E acho que é por isso que ela está se recuperando tão bem."