Topo

Blog da Sophie Deram

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Com a idade, ganhar um pouco de peso pode ser bom, sugere estudo

iStock
Imagem: iStock

Colunista do UOL

02/02/2022 04h00

Um estudo financiado pelo National Institutes of Health dos Estados Unidos e publicado no periódico Annals of Epidemiology sugere que iniciar a idade adulta com um IMC (Índice de Massa Corporal) considerado adequado e ao longo da vida ganhar um pouco de peso (mas sem chegar a ter obesidade) pode estar associado a uma menor taxa de mortalidade.

Investigando a obesidade e mortalidade com o avançar da idade

A obesidade é uma das epidemias mais urgentes em nossa sociedade. Seus efeitos negativos se acumulam ao longo da vida e se constituem como um fator de risco para o desenvolvimento de muitas doenças crônicas, como diabetes, doenças do coração e alguns tipos de câncer.

Para avaliar a obesidade e seus efeitos, os estudos epidemiológicos geralmente utilizam o IMC, pois apesar de suas limitações, é um método fácil e simples de usar.

No entanto, até o momento, ainda não está claro como os valores de IMC se relacionam com saúde e mortalidade com o avançar da idade.

Para tentar esclarecer isso, a equipe de pesquisadores coordenada por Hui Zheng, da Universidade de Ohio, analisou dados de 4.576 participantes do estudo de coorte Framingham Heart Study e de 3.753 dos seus filhos. Os primeiros foram acompanhados entre os anos de 1948 e 2010 e os demais entre 1971 e 2014. Ambas as gerações tiveram seus dados analisados com idade entre 31 e 80 anos.

A partir de 2011, 3.913 pessoas na coorte original e 967 dos descendentes foram a óbito, permitindo uma estimativa mais precisa do que estudos anteriores sobre como a obesidade está ligada à mortalidade.

O IMC foi calculado dividindo-se o peso pela altura ao quadrado de cada participante (peso/altura²) e a partir do valor obtido eles foram classificados, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), como:

  • Peso adequado (IMC de 18,5 a 24,9 kg/m²)
  • Sobrepeso (IMC de 25 a 29,9 kg/m²)
  • Obesidade classe I (IMC de 30 a 34,9 kg/m²)
  • Obesidade classe II/III (IMC maior ou igual a 35 kg/m²)

Os pacientes também foram consultados por uma equipe de médicos e enfermeiros e questionados quanto ao uso de medicamentos para tratar problemas de saúde e sobre diagnósticos de doenças.

Ganhar um pouco de peso pode contribuir com a longevidade

A partir da análise dos dados, os pesquisadores definiram 7 trajetórias de IMC para os pais, foram elas:

  1. Trajetória "obesidade classe II/III" (1,88% da amostra): as pessoas começam com obesidade classe I aos 31 anos e passam para obesidade classe II/III aos 60 anos.
  2. Trajetória "obesidade classe I" (8,35% da amostra): inicia com o estado de sobrepeso aos 31 anos e aumenta para o estado de obesidade classe I.
  3. Trajetória "estável com excesso de peso" (20,89% da amostra): inicia com sobrepeso e aumenta lentamente, mas permanece dentro dessa mesma classificação até cerca de 80 anos.
  4. Trajetória "sobrepeso descendente" (21,48% da amostra): inicia com sobrepeso aos 31 anos e o peso diminui gradativamente até os 80 anos.
  5. Trajetória "peso normal ascendente" (13,31% da amostra): inicia com o peso adequado e aumenta para classificação de sobrepeso por volta dos 55 anos.
  6. Trajetória "peso normal estável": inicia com um IMC adequado (de cerca de 21,60 kg/m²) e permanece adequado até os 80 anos.
  7. Trajetória "nível mais baixo de peso adequado" (10,34% da amostra): inicia com um IMC normal, mas com uma média de 19,47 kg/m².

Já para os filhos, só foram definidas 6 trajetórias, pois não foram observados voluntários com perda de peso em números significativos.

A análise dos dados ao longo das duas gerações mostrou que o impacto do ganho de peso parece depender de sua magnitude e da fase de vida.

Os pesquisadores controlaram variáveis que podem influenciar a mortalidade, como hábito de fumar, sexo, nível de escolaridade, estado civil e doenças e calcularam como as trajetórias de IMC se relacionavam com a mortalidade.

Eles observaram que tanto na geração de pais quanto na de filhos, quem começou com peso considerado adequado e depois passou a apresentar sobrepeso (mas não obesidade) teve propensão a viver por mais tempo.

Aqueles que mantiveram o peso adequado ao longo de toda a vida ficaram em segundo lugar em termos de expectativa de vida; seguidos dos participantes com excesso de peso, mas com peso estável ao longo da vida; dos participantes com nível mais baixo de peso adequado; e, na geração mais velha, de quem estava com sobrepeso e perdeu peso com o avançar da idade.

Os participantes com tendência a viver menos foram os que estavam classificados nas duas trajetórias de "obesidade classe II/III" e "obesidade classe I".

Acredita-se que o ganho de peso moderado entre aqueles com peso adequado no início da idade adulta pode fornecer proteção contra deficiências nutricionais, estresse, desgaste e fragilidade dos músculos e ossos. No entanto, mais pesquisas devem ser realizadas para explicar plenamente esse fenômeno.

Além disso, embora ambas as gerações tenham mostrado resultados semelhantes, os pesquisadores descobriram algumas tendências preocupantes na coorte mais jovem.

Foi observado um aumento na proporção de obesidade classe I e obesidade classe II/III de 12,45% para 16,10%, e de 3,18% para 6,25%, respectivamente, da coorte original para os descendentes.

Ou seja, a geração mais jovem está desenvolvendo sobrepeso e obesidade mais cedo do que os seus pais e apresenta maior tendência a ir a óbito por fatores ligados ao aumento da obesidade.

Mais estudos sobre peso e longevidade devem ser realizados

O estudo em questão foi realizado com uma amostra muito homogênea e apresenta outras limitações, sendo importante a realização de mais pesquisas sobre o tema.

De qualquer forma, essas descobertas apoiam e ampliam outro estudo de 2013 feito por Hui Zheng e seus colaboradores. Nele, os pesquisadores observaram que os voluntários que aos 51 anos tinham peso normal, mas que ganharam peso e passaram a ser classificados com sobrepeso aos 77 anos, tiveram menor risco de mortalidade.

Além disso, os resultados fornecem informações interessantes para termos um novo olhar sobre obesidade e desmistificar a ideia de que a magreza está associada à saúde e à longevidade, quando, na verdade, existem pessoas saudáveis de todos os tamanhos.

Sophie Deram