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Rico Vasconcelos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Podemos cancelar o Carnaval, mas não a prevenção de ISTs

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

25/02/2022 04h00

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É, foliões, lá se vai mais um Carnaval interditado pela pandemia de covid-19. Desde o início do ano, todas as grandes cidades que organizam festas de rua cancelaram, uma a uma, os desfiles e os blocos de rua. Por outro lado, no feriadão que começa amanhã, as festas privadas e os shows em todo o Brasil seguem liberados.

Nem quero aqui discutir a coerência de se proibir uma forma de aglomeração, mas não outra, mas alertar que se não o de rua, algum Carnaval vai, sim, acontecer. E o abandono das campanhas sobre temas importantes de saúde pública, como a prevenção do HIV e outras ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), pode ter sérios desdobramentos para a população brasileira.

No Brasil, tradicionalmente eram produzidas duas grandes campanhas de prevenção de HIV e outras ISTs. Uma delas era lançada no mês de dezembro, aproveitando o Dia Mundial da Aids, e a outra era veiculada nos meios de comunicação no período de Carnaval.

A reclamação que fazíamos todos os anos era a de que fora do Carnaval e do dia 1º de dezembro o HIV desaparecia do debate público. Enquanto isso, as pessoas continuavam com suas vidas sexuais plenamente ativas durante o ano inteiro. Criticávamos as campanhas que reduziam a prevenção ao uso da camisinha. E pedíamos para que todos os grupos fossem representados nas campanhas, e não apenas as pessoas cisgênero heterossexuais.

O tempo passou e hoje percebemos que éramos felizes e não sabíamos. Em 2022 nem campanha de prevenção teremos nesse Carnaval.

É uma ilusão pensar que só porque os bloquinhos foram proibidos de desfilar, a prevenção das ISTs pode também ser cancelada. O Carnaval é o maior feriado do calendário oficial brasileiro. Um dos momentos de maior fluxo de turistas pelo país em busca de diversão e o ponto alto do consumo de bebidas alcoólicas. A combinação explosiva desses fatores torna, todos os anos, milhares de pessoas mais vulneráveis às ISTs.

Com as festas liberadas, e sendo apenas elas o destino da multidão, estamos perdendo uma oportunidade única de desenvolver com seus organizadores parcerias para divulgação de conteúdos de prevenção. Por meio dessa estratégia, atingiríamos quem mais precisa dessas informações, tornando a campanha bem mais efetiva do que pagar milhões para veicular uma peça no intervalo da novela.

Mesmo sem campanha oficial, nesse Carnaval atípico continua valendo o que é importante o ano inteiro. Use camisinha o máximo que você puder. E, se pelo menos uma parte da penetração aconteceu sem o preservativo, lembre-se que você pode ter a indicação do uso da Profilaxia Pós-Exposição ao HIV (PEP), que está disponível no SUS e deve ser iniciada até 72 horas depois da relação sexual.

Se você usa a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP) ou já vive com esse vírus, não se esqueça de levar seus antirretrovirais na sua viagem e fique atento para não esquecer de tomar seus comprimidos mesmo que atrasados.

Se tiver alguma relação sexual com parceria casual, sobretudo se for sem camisinha, fique atento ao surgimento de sintomas de uma IST. E mesmo se não tiver sintomas, tenha sempre uma rotina de testagem para ISTs. Você pode ter se infectado com alguma bactéria sem saber.

É falando abertamente sobre prevenção de ISTs aplicada à vida real das pessoas que podemos manter o assunto presente na cabeça da população. Deixar de falar sobre um problema de saúde pública é a pior de maneira de lidar com ele.