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Paulo Chaccur

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Entenda quais são os perigos do burnout para o sistema cardiovascular

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Colunista do UOL

18/07/2021 04h00

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Você anda se sentindo exausto? Mesmo depois de uma noite de sono, a sensação de cansaço permanece? Isso pode ser reflexo da síndrome de burnout, termo usado para explicar um quadro de colapso físico e mental, o estresse em seu grau mais intenso em decorrência de um cenário de pressão excessiva no trabalho, que inclui, por exemplo, longas jornadas com ausência de intervalos e períodos de descanso, acúmulo de funções e responsabilidades, cobranças e demandas acima do previsto, assédio moral e falta de reconhecimento.

E se mesmo antes da chegada do coronavírus muitos de nós já vivíamos um dia a dia estressante, com a pandemia, para grande parte dos brasileiros, a situação só se agravou. Por conta do isolamento, houve quem viu o limite de carga horária e as múltiplas tarefas se sobreporem.

A migração do trabalho presencial para o remoto levou à exaustão extrema. No início, o home office se mostrou uma boa saída, mas ao longo dos meses também virou um gerador de estresse.

Sem falar nos profissionais da saúde, especialmente aqueles na linha de frente no atendimento de pacientes com covid-19, que estão há mais de um ano enfrentando uma rotina de esgotamento físico e emocional.

O fato é que os desafios trazidos com a chegada do coronavírus não são poucos e nos afetam de diferentes maneiras. A pandemia gerou ainda mais preocupação e ansiedade. As incertezas do momento atual, a perda da fonte de renda e o desemprego, o medo causado pela doença e o que ela remete também podem contribuir para agravar o quadro.

A realidade é que o burnout tem se intensificado. Quando o ambiente de trabalho foi para dentro de casa e se misturou a tantas outras questões, o cenário piorou.

Segundo a Anamt (Associação Nacional de Medicina do Trabalho), a síndrome atinge hoje mais de 30% dos trabalhadores no país. E, apesar desse tipo de esgotamento não ser considerado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) uma doença ou condição médica, é reconhecido pela entidade como um fator que influencia a saúde, inclusive do coração.

Sinais de alerta

Cansaço criativo - iStock - iStock
Imagem: iStock

Até chegar ao burnout, o corpo percorre um longo caminho e costuma enviar sinais para avisar que algo não vai bem e, assim, evitar um colapso. É preciso ficar atento. Diferentemente de um cansaço normal, a exaustão motivada pela síndrome se manifesta por meio de alguns sintomas.

Entre eles, podemos destacar: cansaço crônico, desânimo, desejo de se isolar, sensibilidade a ruídos sonoros, insônia e outros distúrbios do sono, dores pelo corpo e de cabeça (que podem vir acompanhadas de náuseas), tremores, problemas gastrointestinais, falta ou excesso de apetite, dificuldade de concentração, irritabilidade, falta de interesse em coisas que antes eram relevantes e alterações na frequência cardíaca.

Com o tempo, há ainda declínio da produtividade, presença de baixa autoestima, distância física e emocional de relacionamentos interpessoais e mudanças bruscas de humor.

A sensação é de falta de energia e de recursos emocionais para lidar com as situações do cotidiano, intensificando um sentimento de incapacidade e insuficiência. A tendência é o desenvolvimento de uma depressão.

O risco de problemas no coração e doenças cardiovasculares

A síndrome do esgotamento profissional está associada a um maior risco de doenças no coração e eventos cardiovasculares e isso por uma série de fatores.

Um estudo comandado pela Faculdade de Medicina da Universidade de Wake Forest (EUA) aponta que pessoas com altos níveis de exaustão vital (outro termo usado para síndrome de burnout) têm 20% mais propensão a desenvolver fibrilação atrial (batimento cardíaco irregular ou rápido), com risco para eventos isquêmicos cerebrais transitórios se não diagnosticados e tratados.

Além da fibrilação (tipo de arritmia), a condição tende a provocar o aumento do colesterol ruim (LDL), dos níveis de glicose, de triglicerídeos, da proteína C reativa e da pressão arterial.

Saúde cardíaca, cardiovascular, coração - iStock - iStock
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Gera ainda hiperatividade do sistema nervoso simpático, inflamação sistêmica, anormalidades plaquetárias que levam a fenômenos trombóticos, funções imunológicas prejudicadas, alterações na coagulação, distúrbios do sono, entre outros. Todos pontos que interferem na saúde do coração.

O transtorno também está relacionado com o ganho de peso. Isso porque pacientes diagnosticados com a condição tendem a desenvolver compulsão alimentar e a serem menos ativos fisicamente —fatores que, como sabemos, aumentam as chances de problemas cardíacos.

E um dos principais motivos para todas essas mudanças é o alto nível de estresse crônico. Em situações assim, o corpo libera grande quantidade de hormônios, como a adrenalina, responsável por aumentar a respiração e a frequência cardíaca, alterando a pressão arterial.

Outra substância que passa a ser produzida em excesso é o cortisol, o chamado "hormônio do estresse", capaz de aumentar o nível de insulina, o que causa desequilíbrio em todo o sistema metabólico.

O cortisol, quando produzido em excesso ou de maneira constante, também pode levar a uma resposta inflamatória no organismo que predispõe a problemas cardíacos.

O quadro afeta o sistema imunológico, estimulando a evolução de uma aterosclerose (acúmulo de placas de gorduras nas paredes das artérias), a ocorrência de arritmias e da doença arterial coronariana, podendo desencadear até um infarto do miocárdio ou AVC (acidente vascular cerebral).

Não espere o quadro se agravar

Home office - Surface/Unsplash - Surface/Unsplash
Imagem: Surface/Unsplash

Por isso, ao notar os sintomas, não espere para fazer algo a respeito. Ficar atento aos limites e sinais do seu corpo é de extrema importância.

Existem formas de prevenção e mudanças de hábitos antes que o burnout aconteça ou chegue a um estágio mais sério. Nem sempre é fácil organizar o tempo, as tarefas e diminuir as responsabilidades do dia a dia, mas é preciso ter a intenção e fazer o possível para isso —como vimos por uma questão de saúde!

Procure então estabelecer limites entre o pessoal e o profissional e ter horários fixos para atender as demandas de trabalho. A atitude ajuda a desconectar psicologicamente, mesmo no home office.

O tempo longe do trabalho é precioso para nosso bem-estar físico e mental. Busque ter um momento real consigo, sem culpa, horários e obrigações, nem que sejam alguns minutos todos os dias.

Além disso, é imprescindível reservar espaço no dia a dia para as refeições e atividades de lazer e esportes. Alimentação saudável, prática de exercícios físicos, tempo de qualidade para relaxar e fazer coisas que dão prazer são fundamentais.

Recuperar-se do burnout pode não ser simples. O quadro geralmente é combatido com mudanças no estilo de vida, porém, muitas pessoas precisam de apoio psiquiátrico e psicológico, medicamentos e até o afastamento do trabalho ou da situação que serviu de gatilho.