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Paola Machado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Como sedentarismo afeta o cérebro e quais os benefícios em sair do sofá

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

26/05/2022 04h00

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Saia da zona de conforto! Para quem nunca praticou uma atividade física, iniciar uma rotina de exercícios pode ser uma tarefa desafiadora! Nosso cérebro tende a nos boicotar para não sair da zona de conforto ou da famosa zona de sofá.

E por que isso ocorre? Qualquer mudança exige energia, sair e revisar a rotina e, muitas vezes, investir financeiramente e priorizar seu tempo para o autocuidado —são todas ações que dependem diretamente de motivação para sair da inércia e disciplina para se manter no novo hábito.

Quando o corpo já está acostumado com a vida sedentária é natural bater aquela preguiça física e mental só de se pensar em trocar de roupa e sair de casa! Não é novidade dizer que a vida tende a ser cada vez mais sedentária, a tecnologia facilita em muitos aspectos, mas por outro lado, as pessoas permanecem cada vez mais e mais horas sentadas em frente ao computador no trabalho e, no tempo de descanso, estendem esse tempo em frente à televisão ou ao celular.

Pare para rever como está a sua rotina hoje!

Ah, mas será que sou sedentário? O comportamento sedentário refere-se a qualquer atividade de vigília enquanto sentado, reclinado ou deitado com baixo gasto energético, como sentar assistindo a televisão ou usando um computador.

Além dos prejuízos nos aspectos físicos, como aumento do risco para doenças crônicas, por exemplo, diabetes e hipertensão, o sedentarismo também está associado ao risco de desenvolver depressão e transtornos de ansiedade.

Atualmente, existem mais de 320 milhões de pessoas vivendo com depressão e mais de 260 milhões com transtornos de ansiedade em todo o mundo. Isso é, mais do que uma questão apenas estética ou de sanidade física, é a repercussão para o bem-estar mental e emocional que o sedentarismo pode causar.

A informação boa é que todos esses aspectos são potencialmente modificáveis por meio de intervenções direcionadas através de mudanças no estilo de vida.

Aqui listaremos 3 impactos do sedentarismo na saúde mental e daremos motivos de sobra para sair da inércia e do sedentarismo.

  1. Ser sedentário aos 40 anos está associado a um maior risco de doenças neurodegenerativas no envelhecimento, como a doença de Alzheimer

No processo de envelhecimento, a integridade estrutural do cérebro começa a diminuir, ocasionando atrofia nas regiões do hipocampo, córtex frontal, parietal e temporal devido à perda de tecidos e alterações na mielinização dos nervos e, consequentemente, redução da substância branca. Estas regiões são responsáveis por funções como: memória, motricidade, planejamento motor e associação de informações.

O exercício físico pode agir como um fator de proteção e retardamento dessa atrofia cerebral, principalmente se associado a exercícios aeróbicos.

Um estudo recente mostrou que idosos treinados aerobicamente (>70 anos) tinham volumes corticais sensório-motores e visuais maiores do que adultos sedentários.

Em outro estudo, um grupo de idosos que se submeteu a 6 meses de treinamento aeróbico teve aumento significativo dos volumes de substância cinzenta e branca localizados principalmente nos córtices pré-frontal e temporal quando comparados ao grupo de alongamento em idosos cognitivamente normais.

  1. Uma vida sedentária compromete a autoestima, leva aos estados de estresse e ansiedade, predispondo a depressão

Evidências mostram que as pessoas mais ativas tendem a ser menos ansiosas e deprimidas. Fisiologicamente, a prática de atividade física aumenta o transporte de oxigênio para o cérebro, estimula a síntese e degradação de neurotransmissores, liberação de serotonina e diminuição da viscosidade sanguínea, gerando efeitos na diminuição da ansiedade, melhora na autoestima e na cognição, além da redução do estresse.

Essas mudanças neurológicas positivas podem contribuir para o desenvolvimento das habilidades para lidar com tensões e frustrações e melhorar a autoestima. Não é de se pensar duas vezes: vale a pena investir seu tempo em se movimentar!

Um estudo mostrou um grupo que praticou exercícios físicos aeróbicos de intensidade moderada três vezes na semana por 30 minutos em comparação com um grupo sedentário que utilizava medicação antidepressiva. Os resultados apontam que o exercício pode ser tão eficaz quanto a medicação na redução do sofrimento psicológico e ainda parece ser superior por não apresentar nenhum efeito colateral, como náuseas, fadiga ou perda de apetite.

  1. O sedentarismo compromete a qualidade do sono, podendo causar insônia e alteração do humor

A insônia está associada a prejuízos psicossociais e ocupacionais que incluem déficits cognitivos, mau humor, fadiga diurna e má qualidade de vida.

Um estudo mostrou os benefícios da inclusão de exercícios físicos aeróbicos após 6 meses de treinamento, ocasionando melhora na qualidade sono, bem-estar psicológico e do sistema imunológico em pessoas que relatavam insônia. As melhorias podem ser explicadas fisiologicamente pelo aumento do consumo de energia, secreção de endorfina ou temperatura corporal de forma a facilitar o sono para a recuperação do corpo.

Além disso, alguns outros mecanismos, como aumento do consumo de energia, secreção de endorfinas, temperatura corporal, também são benéficos para melhorar a qualidade do sono

Quanto tempo de atividade física devo fazer para ser beneficiado do ponto de vista de saúde mental?

Para quem acha que não tem tempo suficiente para fazer uma atividade física, há estudos que mostram inúmeros benefícios como uma simples caminhada no aumento das funções cognitivas, principalmente na velocidade de processamento, memória e função executiva.

E por que não dedicar um tempo e uma pausa na rotina para ativar essas funções cerebrais diariamente?

Não precisa iniciar com uma meta que te cause ainda mais impactos psicológicos, se tornando um problema de cobrança, ansiedade e estresse.

Saiba que a duração de 15 ou 30 minutos de caminhada rápida (atividade de intensidade moderada) por dia pode ser suficiente para reduzir os riscos à saúde mental. Ainda sendo uma meta potencialmente mais realista do que mudanças de 60 minutos em populações altamente sedentárias.

Apenas inicie e se movimente! Você pode iniciar com uma caminhada no seu bairro, pode se dedicar a uma dança, a um treino em academia ou até ao pilates. Veja como você pode sair da inércia e se ajudar inserindo novos hábitos para ter mais qualidade de vida.

*Colaboração de Renata Luri, fisioterapeuta doutora pela Unifesp e sócia da Clínica La Posture e Juliana Satake, fisioterapeuta pela Unifesp e especializada pela Unicamp

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