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Paola Machado

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Duração e gravidade da obesidade aumentam o risco de patologias; saiba mais

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Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

22/06/2021 04h00

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Hoje em dia escrever demanda um grande esforço para não virar uma grande "joga pedra na Geni" e vivemos, por isso, "pisando em ovos" —não deveria ser assim, já que todos devemos entender a realidade, o fato, e não viver em uma realidade utópica.

Estou de fato perplexa com a mistura de tópicos e a distorção de valores, pois existe uma relação distante entre o que é o respeito ao próximo e o que é de fato um problema sério de saúde pública; já que o artigo 29 da Declaração Universal de Direitos Humanos reforça o dever de respeitar o direito do próximo.

Na Bíblia, Pedro 2:17 falou: "Tratem a todos com o devido respeito: amem os irmãos"; Mateus 7:12 fala: "Assim, em tudo, façam aos outros o que vocês querem que eles façam a vocês; pois esta é a Lei e os Profetas".

Enfim, respeito ao próximo é princípio básico e sine qua non. Isso é uma questão indiscutível, independente de qualquer escolha.

Trabalho com obesidade desde 2008 e sei que a grande maioria das pessoas que tem a patologia lutam diariamente em busca de soluções. Elas entendem que, para progredir, precisam ter consciência do seu ser, de suas ações, se amar —sabendo que dar amor ao corpo significa cuidar, preservar, buscar a longevidade, viver bem e feliz.

Mas o que temos que entender é que nossas escolhas, nossa lógica, nosso caminho, nossas condutas, respingam em resultados. Temas simples, e que o profissional de saúde sempre lutou para combater, como obesidade, viraram grandes tabus por conta da aceitação do corpo e até a defesa de que obesidade não é doença.

O que o excesso de gordura é capaz de fazer com seu corpo?

  • Sistema nervoso: A obesidade aumenta muito o risco de derrame e também pode ter um efeito profundo em sua saúde mental, incluindo risco depressão, baixa autoestima e problemas com a imagem corporal.
  • Sistema respiratório: A gordura armazenada ao redor do pescoço pode tornar as vias aéreas estreitas, o que pode dificultar a respiração à noite levando a apneia do sono.
  • Sistema digestório: A obesidade tem sido associada a um maior risco de doença do refluxo gastroesofágico e também aumenta o risco de desenvolver cálculos biliares. A gordura também pode se acumular ao redor do fígado e causar danos, cicatrizes e até mesmo insuficiência hepática.
  • Sistema cardiovascular e endócrino: Como sabemos, o excesso de gordura corporal pode levar a hipertensão que é a principal causa do acidente vascular cerebral. Além disso, pode levar à resistência a insulina e diabetes tipo 2. O diabetes tipo 2 está relacionado a uma série de outros problemas de saúde, incluindo doenças cardíacas, doenças renais, derrame, amputação e cegueira. O aumento da pressão, do colesterol e da glicemia, junto com excesso de gordura corporal, aumenta o risco de doenças cardiovasculares e derrame. Além disso, diabetes e hipertensão podem desencadear a doença renal crônica.
  • Sistema reprodutivo: Pode tornar mais difícil para uma mulher engravidar e aumentar o risco de uma mulher ter complicações graves durante a gravidez.
  • Sistemas esqueléticos e musculares: Pode causar a deterioração da densidade óssea e da massa muscular --obesidade osteosarcopênica. A obesidade osteosarcopênica pode levar a um maior risco de fraturas, deficiência física, resistência à insulina e malefícios a saúde em geral. Além do mais, pode comprometer as articulações.
  • Sistema tegumentar (pele): As erupções cutâneas podem ocorrer onde a pele da gordura corporal se dobra. Uma condição conhecida como acantose nigricans também pode ocorrer --caracterizada por descoloração e espessamento da pele nas dobras e vincos do corpo.
  • Outros efeitos: A obesidade tem sido associada a um risco aumentado de muitos tipos diferentes de câncer, incluindo câncer endometrial, hepático, renal, cervical, de cólon, esofágico e pancreático, entre outros. À medida que seu IMC (índice de massa corporal) aumenta, aumenta também o risco de desenvolver câncer.

A duração de exposição do organismo a obesidade, aumenta o risco de desenvolver patologias

Um tema que recebo muito é: "Tenho obesidade, mas está tudo bem com minha saúde" ou "Sou obeso há anos e nunca tive nada". Sempre reforcei que o excesso de gordura no nosso corpo pode ser silencioso e as consequências não aparecem de um dia para o outro, sendo que estudos mostram a relação do aumento da condição de desenvolvimento de patologias com a duração da obesidade.

Um estudo publicado na PLOS Medicine compilou dados de três estudos de coorte, analisando o IMC, bem como fatores de risco de doenças cardiometabólicas (pressão arterial, colesterol e açúcar no sangue elevado) em mais de 20 mil pessoas com idades entre 10 e 40 anos.

Os pesquisadores descobriram que quanto mais tempo uma pessoa tem obesidade, maior a probabilidade de desenvolver fatores de risco. Eles reforçam que os resultados demonstram a importância de retardar o início da obesidade, porém se o excesso de gordura corporal foi inevitável, é possível reduzir o risco de doença cardiometabólica com a perda de peso o quanto antes —e não deixando passar ano após ano sem buscar estratégias, pois "está tudo bem com seus exames".

Além disso, os resultados do estudo sugerem que o número de anos que uma pessoa vive com seu IMC acima do limiar de obesidade aumenta seu risco de diabetes, mesmo se seu IMC estiver apenas na faixa de obesidade e não continuar a aumentar.

Mas eu sou metabolicamente saudável!

Um estudo publicado pelo The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism buscou mostrar que a gravidade relativamente maior e a duração mais longa da obesidade estão associadas a uma maior incidência de síndrome metabólica.

Estudos indicaram que o aumento da duração da obesidade leva a maiores riscos cardiometabólicos, mas poucos discriminaram entre os riscos da obesidade e da gravidade. Isso é de interesse particular no que diz respeito à obesidade metabolicamente saudável, porque a duração e a extensão da progressão da obesidade podem ter implicações importantes para a saúde metabólica de indivíduos em diferentes estágios ao longo dessa via de disfunção cardiometabólica.

Dentro dessa estrutura, o estudo tem como objetivo mostrar que a gravidade relativamente maior e uma duração mais longa da obesidade estão associadas a uma maior incidência de síndrome metabólica no Estudo Multiétnico de Aterosclerose (MESA).

Em contraste com a ideia de que aqueles com obesidade metabolicamente saudável são de alguma forma resistentes aos efeitos negativos da obesidade para a saúde, as evidências para essa hipótese reforçariam o entendimento de que a exposição cumulativa à obesidade determina a progressão da obesidade metabolicamente saudável para a síndrome metabólica.

Usando regressão logística de medidas repetidas com efeitos aleatórios, o estudo investigou a associação da gravidade e duração da obesidade com variação no tempo com a síndrome metabólica incidente em 2.748 participantes do Estudo Multiétnico de Aterosclerose com obesidade (índice de massa corporal de 30 kg/m²).

O estudo conclui que tanto a duração quanto a gravidade da obesidade estão positivamente associadas à síndrome metabólica incidente, sugerindo que a obesidade metabolicamente saudável é um estado transitório no caminho para a doença cardiometabólica.

A perda de peso deve ser recomendada a todos os indivíduos com obesidade, incluindo aqueles que atualmente são definidos como metabolicamente saudáveis.

Por isso, fique atento...

  • O sinal de alerta de que o peso de uma pessoa está atingindo um nível potencialmente prejudicial à saúde não é apenas um IMC alto que está acima do limite da obesidade, mas um IMC que continua a aumentar além desse limite, levando ao risco de doenças.
  • A obesidade é uma doença muito mais complexa do que as pessoas imaginam, mas quando a adiposidade está desequilibrada, é um órgão hormonal ativo que leva à resistência a insulina, inflamação, aumenta o risco de câncer, doenças cardíacas e mortalidade precoce.
  • Muitas pessoas com obesidade continuam consumindo os mesmos alimentos, considerados inflamatórios, que aumentam ainda mais esse desequilíbrio.

A obesidade afeta quase todas as partes do corpo. Se você está vivendo com obesidade, pode tratar ou controlar muitos desses fatores de risco com uma combinação de dieta, exercícios e mudanças no estilo de vida.

Perder apenas 5 a 10% do seu peso atual pode reduzir o risco de desenvolver esses problemas de saúde, sendo que deve ser mantido um estilo de vida saudável.

Referências:

Norris T, Cole TJ, Bann D, et al. Duration of obesity exposure between ages 10 and 40 years and its relationship with cardiometabolic disease risk factors: A cohort study. PLOS Medicine . 2020. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1003387

National Cancer Institute. Obesity and Cancer. Disponível em: https://www.cancer.gov/about-cancer/causes-prevention/risk/obesity/obesity-fact-sheet

Ormsbee MJ, Prado CM, Ilich JZ, et al. Osteosarcopenic obesity: the role of bone, muscle, and fat on health. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2014;5(3):183-192. doi:10.1007/s13539-014-0146-x

American Society for Metabolic and Bariatric Surgery. The Impact of Obesity on Your Body and Health. Disponível em: https://asmbs.org/patients/impact-of-obesity

National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases (NIH). Health Risks of Overweight & Obesity. Disponível em: https://www.niddk.nih.gov/health-information/weight-management/adult-overweight-obesity/health-risks?dkrd=/health-information/weight-management/health-risks-overweight

Center for Disease Control and Prevention (CDC). Obesity is a common, serious, and costly disease. Disponível em: https://www.cdc.gov/obesity/data/adult.html

Mongraw-Chaffin M, Foster MC, Kalyani R, et al. Obesity Severity and Duration Are Associated With Incident Metabolic Syndrome: Evidence Against Metabolically Healthy Obesity From the Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis, The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, Volume 101, Issue 11, 1 November 2016, Pages 4117-4124, https://doi.org/10.1210/jc.2016-2460