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Nuno Cobra Jr

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O slow training representa o futuro do treinamento físico

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Imagem: iStock

Colunista do VivaBem

15/07/2021 04h00

Slow significa devagar, em português.

E se alguém lhe contasse que existe uma forma de treinamento extremamente eficiente, na qual, mesmo sem qualquer sofrimento, treinando sempre com moderação, com treinos de fortalecimento muscular que duram apenas de 10 a 20 minutos, dia sim, dia não, você pudesse atingir uma qualidade e definição muscular superior a conquistada com 20 anos de musculação tradicional na academia? Veja bem, não estamos falando de volume muscular, mas de força útil e inteligente, algo que produz definição muscular e qualidade, uma força diferente de tudo o que você conhece.

A comparação com a musculação tradicional foi feita por um aluno meu, recentemente. Mais à frente mostro o vídeo e retomo esse assunto com mais cuidado.

Parece algo fantasioso, né!? No entanto, esse método existe, há 67 anos, e se chama Método Nuno Cobra, uma metodologia criada por meu pai. A técnica tem sido mantida em segredo, desenvolvida de uma forma artesanal, sob medida para cada aluno, assim como um alfaiate à moda antiga.

O "Movimento Slow" —um convite para desacelerar a forma como estamos vivendo— se espalha por todos os setores, como o Slow- food, o Slow- education, o Slow- technology, e o Slow-medicine, uma medicina humanizada e profunda, com o foco na prevenção.

No entanto, a minha proposta de trazer esse movimento ao treinamento físico esbarra em uma enorme resistência. Como propor ir mais devagar em um ambiente no qual todo o marketing está direcionado em seduzir as pessoas com propostas para acelerar os resultados?

Antes de responder a essa questão, vamos explicar algo básico no treinamento: afinal, por que a força útil e natural é tão diferente da força artificial conquistada na musculação tradicional?

O exercício natural mobiliza as fibras musculares mais profundas e estabilizadoras, algo que não ocorre em exercícios em que esse tipo de estímulo é tímido, como a musculação tradicional com pesos.

Uma aluna minha definiu bem esse tipo de força natural. Certo dia, ela teve que tirar um vaso enorme da sala. Como não tinha quem a ajudasse, pediu ajuda a pessoa mais forte do prédio, um cara enorme, alguém que fazia musculação pesada há muitos anos.

Depois de diversas tentativas, o ajudante convocado disse que era impossível mover sozinho aquele vaso, e que seria melhor chamar mais pessoas.

No dia seguinte, ela chamou o porteiro, alguém que havia trabalhado com mudanças, durante muitos anos. Ele foi lá, sozinho, e pegou o vaso, com uma firmeza e facilidade que a deixou espantada. Detalhe: ele era magro e não tinha uma musculatura aparentemente muito grande e desenvolvida.

Se quiser conhecer, na prática, como funciona esse "milagre" do fortalecimento muscular natural no método Cobra, veja essa conversa entre meu pai e um aluno meu, alguém que fez musculação pesada na academia, durante 20 anos.

O depoimento do meu aluno, Homero Gontijo, 42 anos, da pequena cidade de Luz, próximo a Uberlândia, é um mergulho interessante em nossa metodologia, iluminando os princípios fundamentais de um treinamento consciente e natural.

Em apenas um ano, fazendo treinamento na barra fixa, um estímulo totalmente diferente, inspirado nas bases da ginástica olímpica, um exercício natural e funcional, Homero confirma e explica, na prática, como funciona o nosso método. O que ele narra já aconteceu com centenas de alunos, um conceito testado e aprovado por alguns dos maiores atletas, executivos e empresários brasileiros, nas últimas sete décadas

As vantagens do slow training

Por que slow training é tão diferente?

O meu pai descobriu o universo do slow training por acaso, quando tinha apenas 13 anos, em 1951. Ele era um menino extremamente franzino e hipotônico, tinha sido proibido pelos médicos de fazer atividade física na infância, o que lhe causava grandes dificuldades na adolescência.

Quem leu o seu livro: "A semente da Vitória", o maior best-seller brasileiro na área de treinamento físico e saúde, vendendo mais de 600 mil exemplares, deve conhecer essa narrativa.

Quando ele e o seu mentor, o Pedro Pexexa, montaram uma barra fixa no quintal —além de outros aparelhos de ginástica olímpica— e começaram a treinar, as dificuldades que surgiram o forçaram a criar novos repertórios de exercícios.

Como meu pai não conseguia subir o corpo na barra, a solução foi descer, bem devagar, o que acaba trabalhando, com muito mais eficiência, todas as fibras musculares mais profundas. É o que, tecnicamente, chamamos de contração excêntrica. E assim, inventando e criando novos repertórios, usando treinos de força isométricos e excêntricos, ele acabou criando a sua metodologia.

Para explicar esse conceito para um leigo, pense o seguinte: você está acostumado a fazer um exercício na academia, com pesos livres, como o supino, com carga de 50 kg. No entanto, você faz esse exercício na velocidade normal, um pouco acelerada, se aproveitando da inércia gerada pelo impulso do movimento, o que facilita bastante movimentar tal carga.

Como você se aproveita da inércia, os seus músculos só trabalham durante algumas fases do movimento.

Agora tente um desafio diferente: coloque menos carga e, com apenas 30 kg, tente fazer o mesmo movimento em slow motion, extremamente devagar, o máximo que você for capaz.

Você irá perceber que, ao final do exercício, a sensação de ter trabalhado seus músculos será ainda maior, comparado a carga anterior.

Veja o post recente abaixo, no qual meu pai ilustra essa questão. Detalhe: ele vai completar 83 anos, no mês que vem, e fez esse exercício três meses após sair do hospital em uma cadeira de rodas, devido a complicações causadas pela covid.

Essa é a revolução proposta em nosso método, o mais importante não é a carga ou a intensidade, mas a qualidade da contração muscular. Como fazer o treinamento atingir mais qualidade, sem prejudicar estruturas nobres, como as articulações e cartilagens, e sem causar tensões desnecessárias ao seu corpo?

Ou seja, como fechar uma equação complexa, na qual aquilo que você faz como atividade física não irá desgastar o seu corpo, no médio e longo prazo, consumindo a sua saúde e o seu aparelho locomotor?

Ainda hoje, os nossos atletas conquistam um preparo cardiovascular e um fortalecimento muscular acima da média, como no caso do piloto Guilherme Samaia, atualmente competindo na Fórmula 2, como mostro nesse vídeo. Ele treinou comigo até 2019.

Como era o treinamento de Ayrton Senna?

O Ayrton Senna, por exemplo, atingiu por meio do nosso método um VO2 máximo de 70 ml, algo comparado a um maratonista, mesmo treinando com moderação, seguindo uma estratégia completamente diferente do treinamento cardiovascular ligado ao senso comum.

Em relação à força muscular, após cinco anos, ele era capaz de fazer 3 séries de 15 movimentos da oitava, uma manobra de ginastica olímpica extremamente difícil e complexa. Imagine o cara mais forte que você conhece na academia, provavelmente, ele teria que treinar alguns meses para fazer apenas uma repetição desse mesmo exercício, e o Ayrton conseguia fazer 45 movimentos da oitava em um só treino, algo surreal.

Qual é a pegadinha? Ele se adaptou a esse exercício durante muitos anos. Força útil não tem nada a ver com tamanho, afinal, um corpo leve e ágil vai ter muito mais facilidade para se mover, pular um muro ou se levantar na barra. Ou seja, quanto mais pesado for o seu corpo, menos útil será a sua força.

Ao final de uma corrida na F1, com duas horas de duração, o Ayrton tinha fôlego e músculos de sobra, o que se tornava uma enorme vantagem em relação aos concorrentes.

O treinamento físico e mental do Ayrton é um marco na Fórmula 1, ele foi o primeiro piloto a levar isso a sério.

Como conseguimos esses resultados? Fazendo tudo diferente do que o mercado recomenda. Melhor ainda, nossos atletas não se lesionam em função do treinamento físico, já que investimos na medida exata, uma filosofia na qual menos é mais. Algo que se encaixa perfeitamente a proposta do slow training.

Para encontrar esse novo caminho, resolvemos contrariar o senso comum, integrando áreas da ciência que não se conversam, implantando o humanismo e a filosofia na educação física.

A atividade física, uma área, a princípio, biológica, foi tomada pela métrica matemática dos resultados. Até onde pude pesquisar, meu pai é o primeiro a entender a preparação física por meio de um prisma humanista, transdisciplinar e filosófico mais profundo e abrangente.

A lógica racionalista dos resultados rápidos e imediatos aniquilou o treinamento com o foco na saúde e na longevidade, uma tendência que precisa ser invertida nos próximos anos. Dessa forma, um modelo de treinamento com o foco na estética e na pressa de resultados representa o passado do treinamento físico, por mais atual que ele seja.

Não por acaso, o primeiro passo do nosso método é tirar o foco no resultado e colocá-lo no prazer de viver o próprio processo, em si. O que, no fim, gera resultados mais positivos, quando pensamos na saúde de uma forma mais profunda.

A cura

Coincidentemente, o slow training —uma atividade física sustentável, meditativa, equilibrada e consciente— vem de encontro a um dos maiores problemas de saúde pública no nosso tempo: a aceleração da vida causada pelo mundo moderno.

O ser humano se apaixonou pela eficiência e pela produtividade, criando uma máquina perversa de consumo que, agora, ameaça o futuro da humanidade.

Essa visão mecanicista e racional da vida, iniciada por Rene Descartes, afirmando o domínio do cérebro sobre o corpo, nos conduziu a uma lógica na qual os interesses humanos estão submetidos a ditadura dos resultados.

Agora, onde trabalhavam duas pessoas, colocam apenas uma, para economizar recursos.

A aceleração da vida é pertinente às empresas que lutam para se estabelecer em um mercado cada vez mais competitivo, selvagem e veloz, mas não faz bem à saúde pública, como já pudemos comprovar, causando um rombo de bilhões nos orçamentos públicos. Veja bem, se todo mundo corre, onde vai parar isso?

O pior é que a lógica dos resultados e a visão mecanicista da vida invadiu todos os setores, a política, as empresas, a medicina e o próprio treinamento físico, no qual a atividade física, um processo vital e curativo, muito mais profundo e abrangente, tornou-se apenas uma forma de obter resultados estéticos acelerados.

Nós precisamos fazer o caminho de volta, colocar pausas, silêncios e respiros em nosso dia a dia. Essa é a cura do mundo!

Através do Movimento treinamento consciente, um projeto que uni diversas áreas complementares do conhecimento corporal, venho propor uma volta ao simples e essencial, uma forma de treinamento saudável, orgânica, inclusiva, sustentável e mais eficiente, trazendo o slow training para a pauta do dia.

Sim, a eficiência no treinamento está diretamente associada à moderação (a medida exata, sem exagero), pois a medida exata demanda um ritmo de transição exato, sem pular etapas essenciais. "Devagar e sempre", este deveria ser o slogan mais popular do treinamento físico ou do emagrecimento, infelizmente, ele não está muito em voga, ultimamente.

Até faz sentido, em uma sociedade estruturada na pressa e no imediatismo, o marketing ainda não aprendeu a vender a calma e a lentidão como uma vantagem. Eles ainda não perceberam que este é o antídoto e o bem mais precioso do nosso tempo.

Essa desaceleração funciona para tudo em sua vida, com calma, foco e paciência, tudo irá fluir melhor. Quer um exemplo? Trabalho como consultor em mudanças de hábitos, qualidade de vida e treinamento integral há 37 anos. Após 3 meses de consultoria, propus a um aluno introduzir certas pausas e relaxamentos em sua rotina. Sugeri, então, que ele almoçaria bem mais devagar, em silêncio, sem usar o celular, usando essa pausa como uma forma de meditação. Depois, combinamos de ele tirar uma "siesta" de uns 20 minutos após as refeições.

Como resultado dessa experiência, enquanto todos voltam ao trabalho com sono e com dificuldade de concentração, ele está "voando", com uma digestão leve, renovado e descansado. Outro dia, meses depois de introduzir esse hábito, entre outros, ele me disse: "Caramba, Nuno"! Eu trabalho muito menos do que trabalhava antes, coloquei mais pausas em meu dia, a caminhada no parque, os alongamentos e tudo mais, e o resultado final é que a minha produtividade dobrou. Nunca a minha empresa foi tão bem.

Então, eu lhe disse, complementando o raciocínio: "Pois é, a sua empresa é uma extensão do seu equilíbrio interno, quanto mais saudável você fica, melhor ela se desenvolve de uma forma orgânica e saudável.

Quanto mais o mundo se acelera, mais doente ele fica.

O consumo e a tecnologia adoecem o animal humano. A nossa herança evolutiva não nos preparou para o excesso de conforto, comida, trabalho e informação. Esses excessos estão nos matando, lentamente, de uma forma quase imperceptível.

Imagine um trem que avança a toda velocidade, mas que, ao invés de tentar freá-lo, os maquinistas continuam a colocar mais lenha na caldeira. Pior ainda, as pessoas que conduzem esse trem não têm a menor ideia de onde estamos indo, só os interessa acelerar o ritmo e conseguir colher mais lucros pelo caminho.

Esse trem chama-se capitalismo, e ele só está interessado no crescimento econômico, no lucro imediato, essa é a sua obsessão, mesmo que isso signifique a nossa extinção como espécie.

Ou seja, ou adaptamos esse sistema para um capitalismo sustentável e consciente, ou o final do caminho será o precipício, um buraco sem volta.

A cura do mundo passa por diversos fatores, como mais amor, tolerância, menos individualismo, mas em relação a todas as doenças modernas, um fator se sobressai: desacelerar é urgente, desacelerar é a mudança necessária para "quebrar a espinha dorsal" do aumento vertiginoso da insanidade física e mental no mundo.