Lúcia Helena

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Reportagem

Ciência da beleza: como impedir que as células da sua pele virem zumbis?

Você provavelmente nunca leu a palavra "zumbi" na embalagem do seu creme. Primeiro, talvez porque soaria um tanto sinistro. Segundo, seria necessário explicar algo complexo demais, mas que, na minha opinião, vale a pena entender.

Pois "célula zumbi" é, de fato, o termo empregado pela ciência para descrever a célula em senescência, o processo de envelhecimento do corpo. Sim, ela até aparece uma morta-viva que — eis o drama — vai abduzindo o tecido na vizinhança, tornando a situação mais grave.

O fenômeno tem atiçado a Medicina para entender desde por que a doença cardiovascular aparece cedo em alguns indivíduos até o câncer e as demências. "Mas o nosso foco, no caso, foi a pele", explica a química Priscila Moncayo, gerente de pesquisa e desenvolvimento da Natura para as linhas de rosto e fotoproteção.

Olha que ela e seu time foram ligeiros! Começaram a investigar a aparição desses tipinhos há nove anos, quando os cientistas mal falavam deles. Há apenas 64 trabalhos sobre células zumbis indexados na última década no PubMed, a fabulosa Biblioteca Nacional de Medicina do governo americano — e, para ver como o interesse está acelerando, dez deles só de janeiro para cá.

Priscila, que conduz pesquisas na Natura há 19 anos, mergulhou de vez na compreensão das células zumbis ao estudar a pele de mulheres acima dos 80 anos. "Não havia nada, simplesmente zero, na literatura mundial a esse respeito", diz. Os achados de seu grupo chamaram tanto a atenção que foram selecionados para serem apresentados, há duas semanas, no encontro anual da American Academy of Dermatology, em Orlando, nos Estados Unidos.

Uma das constatações: na intimidade, a pele aos 80 anos é bem diferente da pele da mulher de 70. Porém, uma boa notícia: "Ela pode ser muito responsiva", conta a pesquisadora, derrubando o mito perpetuado até entre os dermatologistas de que, nessa idade, tudo o que um creme faria seria não deixar a sua aparência piorar, mas sem melhorá-la nem sequer um tico, como se o tecido já não reagisse tão bem aos bioativos de qualquer formulação. Mas, senhoras, não é nada disso.

Por fim, não importa a sua idade, se está longe dos 80 ou não, pode ficar com rugas de preocupação: a chave para fazer a pele responder bem a um tratamento está em brecar o aparecimento de mais células zumbis. E estas começam a atazanar cedo, principalmente a partir dos 30.

A pesquisa liderada por Priscila Moncayo buscou maneiras de enfrentá-las. Encontrou um jeito na biodiversidade brasileira: precisamente, no jatobá e na casearia, que agora fazem parte de Chronos Derma em todas as faixas de idade. Note que há mudança no nome dessa linha criada há quase quarenta anos: foi acrescentado o "derma" porque os produtos passaram a ser considerados dermocosméticos.

Para integrar essa categoria, é preciso realizar testes de eficácia e segurança com os mesmos critérios e rigor do desenvolvimento de um novo medicamento. Diga-se, em gente como a gente, fazendo biópsia, e não em tubo de ensaio onde tudo parece funcionar até chegar ao seu rosto.

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E — outra exigência para ser um dermocosmético — o produto deve promover a saúde do tecido cutâneo. Faz sentido. A beleza, afinal, é o bônus de uma pele saudável.

Cercar o problema

Priscila Moncayo conta que, ao criar uma fórmula, os pesquisadores tentam cercar todos os mecanismos que por trás do que desejam: "Se a necessidade é dar firmeza ao rosto, buscamos ativos que incrementem a produção de colágeno e que, ao mesmo tempo, diminuam a colagenase e outras enzimas capazes de quebrar essa proteína que dá sustentação à pele", exemplifica. "Também incluímos substâncias que ajudam a aumentar a espessura do tecido."

Já se o objetivo é reduzir manchas, ela busca moléculas que ajam na tirosinase, por exemplo. "Essa enzima participa do controle da produção de pigmentos pelos melanócitos", descreve. Indo mais a fundo, inclui substâncias que evitem o transporte dos tais pigmentos. E por aí vai.

Mas o cerco, embora viesse funcionando, nunca parecia ser o suficiente. "Isso porque, independentemente da idade e do objetivo, se as células zumbis estivessem presentes, você poderia estimulá-las o quanto quisesse e nada", lembra a química. Como boas zumbis, não reagiam.

Afinal, o que é uma célula zumbi?

Todas as nossas células — da pele, do fígado, de onde for — têm um ciclo de vida e dão um duro danado ao longo dele. "O fibroblasto, por exemplo, produz colágeno e elastina, as tais fibras de sustentação", explica a pesquisadora. "Mas, com o tempo, sua capacidade de produção começa a cair e chega a um ponto em que acontece uma apoptose."

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Apoptose é um suicídio celular. Não há maiores consequências porque logo aparece um fibroblasto novo em folha no lugar para retomar o abastecimento de colágeno e elastina. O problema é que a célula senescente, ou zumbi, não morre. Nem produz mais nada. "Fica ali, ocupando um espaço". Só isso? Não! Os cientistas sabem que as zumbis liberam moléculas que criam mais zumbis ao seu redor. E não há creme que as "reviva".

A tecnologia batizada de Biociência Chronos foi criada com substâncias extraídas do jatobá, árvore amazônica que chega a superar 40 metros de altura, e da casearia, gênero botânico ao qual pertence a guaçatonga. Ela não faz uma zumbi voltar à vida de antes. "Mas impede o aparecimento de novas zumbis", assegura Priscila. "Com isso, damos a chance de todos os outros bioativos da formulação provocarem uma resposta ainda melhor."

Para ilustrar, nos produtos para mulheres acima de 80 anos, essa tecnologia favorece a ação dos ativos que reduzem manchas senis brancas, as quais surgem porque os melanócitos, assombrados, praticamente se aposentam. Menos ativados, deixam de liberar pigmentos, criando uma área de pele esbranquiçada.

A pele depois dos 80

A investigação dessa pele madura começou ainda em 2019, com uma pesquisa sobre comportamentos e atitudes da mulher nessa faixa etária. E, fácil entender, ela se sentia mal atendida, como se todos achassem que ela não precisava mais cuidar do seu rosto. O que não cabe em um mundo onde a população octogenária deve triplicar até 2050.

Então, os pesquisadores da equipe de Priscila passaram a fazer testes, ainda sem passar produto algum, só para entender essa pele em profundidade. Apesar de ser uma diferença de apenas dez anos, a mudança na microbiota — isto é, nos micro-organismos que habitam a superfície cutânea — é brutal dos 70 para os 80 anos. "Aos 80, predominam bactérias que estão associadas a um ressecamento intenso", afirma Priscila.

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A composição de lipídeos também pareceu totalmente alterada. Os pesquisadores deram pela falta daqueles envolvidos na renovação celular e com a barreira. A dúvida que fica: as tais bactérias que proliferaram nessa mulher madura cresceram e causaram toda essa confusão ou será que só cresceram por causa dela? Priscila Moncayo assume que, por enquanto, ninguém sabe a resposta para esse ovo-ou-galinha.

Como tratar a pele supermadura

Os cientistas da Natura, primeiro, foram atrás de uma ceramida, molécula de gordura que ajuda a formar a barreira da pele. Encontraram, no tipo conhecido por NP, aquela que se encaixava perfeitamente onde os lipídios estavam ausentes.

Por fim, testaram todas as manteigas disponíveis, vindas da nossa biodiversidade. "A de cupuaçu foi a que mais diminuiu a fragilidade cutânea nessas mulheres", explica. Mulheres que, na pesquisa, foram submetidas à biópsia depois de 30, 60 e 90 dias de uso. Ou seja, nada foi lançado naquela base da "impressão de ter melhorado", sempre um tanto subjetiva.

Para completar, o creme diurno tem antixoxidantes e compostos para reduzir manchas. Já o noturno carrega substâncias "calmantes". É que, pela legislação brasileira, um dermocosmético não pode dizer que tem antiinflamatório. Mas, cá entre nós, essa é a verdadeira ação. "Constatamos que, a partir dos 80, a pele fica extremamente inflamada", justifica a pesquisadora.

O que se espera com a combinação desses bioativos é uma pele mais forte, coesa, que não se rasgue, nem se irrite por pouca bobagem, exercendo a função de proteção desse órgão. Bonita e bastante saudável, enfim. Sem ser assombrada pelas células zumbis — nem pelo tempo, muito menos pelo etarismo.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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