Topo

Blog da Lúcia Helena

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Diabetes, dores crônicas e outros problemas de saúde que afetam a sua pele

iStock
Imagem: iStock

Colunista do UOL

07/06/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Coça, pinica, descama, arde, encaroça, racha, mancha, infecciona, se fragiliza — isso quando suas células não se rebelam, multiplicando-se sem parar e gerando um tumor. A pele de muita gente se ressente de fatores bem modernos, que vão das mudanças climáticas ao sequestro das horas dormidas. E não apenas isso.

Algumas doenças, que se tornaram mais frequentes nos dias atuais, também contam para uma explosão de problemas dermatológicos. Só nos Estados Unidos, segundo a Academia Americana de Dermatologia, eles atingem perto de 85 milhões de indivíduos.

"A pele é a fronteira entre dois mundos, o interior do corpo humano e o ambiente externo. E é influenciada o tempo todo por tudo o que acontece tanto do lado de dentro quanto do lado de fora", diz a dermatologista Adriana Vilarinho, que ontem lançou o livro "Saúde à Flor da Pele" pela editora Academia, com o qual contribuí na organização. A leitura provoca uma reflexão sobre o jeito como levamos a vida — o que vai muito além das aparências.

Se você perguntar à médica uma definição de pele bonita, nesta altura já sei de cor qual será a resposta. "É uma pele saudável", devolverá. Parece uma resposta simples demais, até você entender que não encontra isso em um pote de creme e que precisa olhar para o corpo da cabeça aos pés.

O estresse

A ansiedade nas alturas e as preocupações sem fim fazem o organismo apelar para a reação fisiológica primitiva que usava para escapar de um animal feroz e correr para dentro de sua caverna. Os vasos periféricos se contraem para a circulação ser mais direcionada aos músculos, preparando-os para dar no pé. "Diante do que o sistema nervoso vislumbra como um caso de vida ou morte, mandar sangue para a pele deixa de ser prioridade", diz Adriana.

Difícil precisar até que ponto isso favoreceria os problemas dermatológicos ou o envelhecimento cutâneo — embora, aí, a gente possa deduzir que, no mínimo, músculos tensos possam marcar a expressão.

O que se sabe é que, enquanto o nível de estresse sobe, o hormônio do crescimento, liberado pela tireóide, tende a cair. "E ele é o grande responsável pela renovação da pele dia após dia", explica a dermatologista. Daí a razão pela qual o cansaço fica na literalmente cara, abatida, de quem enfrenta uma jornada estafante.

"Os hormônios do estresse, como o cortisol, abalam ainda nossa capacidade de defesa contra uma série de doenças, as de pele incluídas", lembra Adriana. "O cortisol elevado, para completar, estimula as glândulas sebáceas. É por isso que algumas pessoas, quando se sentem muito ansiosas diante de um evento, acordamcom uma espinha no rosto."

Além de aumentar a oleosidade, o estresse comprovadamente induz a liberação de substâncias relacionadas à inflamação. "Daí que ele não tem só a ver com a acne. Todo dermatologista sabe que períodos mais estressantes agravam doenças inflamatórias, como a rosácea e a psoríase", conta Adriana.

Na realidade, a estimativa da ciência é de que mais de 40% das manifestações cutâneas sejam influenciadas por questões psíquicas. E, portanto, não adiantaria se olhar no espelho sem se enxergar por dentro para cuidar bem delas também.

Dores crônicas

O estresse, porém, não está associado apenas com condições emocionais: "Qualquer doença capaz de provocar dores crônicas também leva à produção exagerada de cortisol e das tais moléculas inflamatórias", nota Adriana.

Para piorar, muitos problemas que provocam dores sem trégua — o que já é estressante — têm uma inflamação por trás, fazendo subir anda mais a quantidade de substâncias capazes de desencadear ou piorar irritações cutâneas. "Se alguma parte do corpo constantemente dói, a pele sofre junto", costuma dizer Adriana.

No caso, analgésicos podem mascarar o incômodo, mas não resolvem a inflamação. O problema que está na raiz de tudo precisa ser tratado ou controlado, é claro, se a pessoa quer ver a pele melhorar.

Insônia

As horas de descanso devem ser respeitadas. "É em pleno sono que o organismo secreta substâncias que reparam os tecidos, principalmente o hormônio do crescimento", diz a dermatologista, que é favorável ao hábito de dormir mais cedo por causa disso.

"O pico de liberação desse hormônio ocorre no início da madrugada, mas, atenção, isso quando você já está dormindo há algumas horas. Se vai para a cama às 2 da manhã, mesmo que possa acordar mais tarde e repousar as famosas oito horas, essa liberação já não será a mesma", garante Adriana. Ou seja, você perderá o timing do relógio biológico para renovar a sua pele.

Problemas digestivos

Segundo Adriana, quem tem algum problema de digestão provavelmente não se alimenta bem ou não aproveita os nutrientes das refeições direito. "E o aporte adequado deles seria fundamental para a saúde da pele", assegura. Por isso, ainda, a médica faz o alerta: "Dietas restritivas e da moda também têm seu preço na dermatologia."

Por essa mesma lógica, um problema digestivo não tão comum, mas que se reflete na pele, é a insuficiência da enzima lipase, que quebraria as moléculas de gordura das refeições para serem absorvidas no intestino. Quando é assim, a pessoa se sente empachada ao beliscar um pastel ou experimentar qualquer prato com um pouco mais de azeite. "A pele, então, costuma ser bem mais seca", diz Adriana. "Isso porque o organismo não tira proveito da gordura da alimentação e ela, em porções sem exagero, é igualmente importante."

Já quando os alimentos ultraprocessados substituem frutas, legumes, verduras e cereais integrais — enfim, quando a comida caseira não é servida à mesa -, aí que tudo desanda de vez. "Não só pelo exagero de sal, gordura e açúcares desses produtos, mas porque a alimentação cheia deles desequilibra a microbiota do intestino", explica a doutora. Já foram publicados diversos estudos relacionando esse desequilíbrio, conhecido por disbiose, a doenças autoimunes de pele.

Diabetes

Micoses ou infecções bacterianas frequentes devem fazer o médico, na opinião de Adriana Vilarinho, desconfiar de diabetes e pedir exames para afastar a suspeita. "A glicose elevada no sangue costuma causar essas infecções de repetição", justifica. "E, se o indivíduo sabe que é portador de diabetes, elas entregam que ele não está controlando sua glicemia direito."

Fácil entender: a superdosagem de açúcar na corrente sanguínea afeta os vasos. E, em geral, aqueles que são mais finos, como os que abastecem a pele, são os primeiros prejudicados. Aí, não faltam só nutrientes e oxigênio, que seriam trazidos pela correnteza do sangue: as células de defesa tampouco alcançam depressa a região onde eventualmente aconteceu um ferimento.

"Desse jeito, qualquer machucado serve de brecha oportuna para o crescimento de bactérias e outros agentes nocivos", conclui Adriana. Portanto, lesões de pele em pessoas com diabetes descontrolado merecem todo o cuidado. Até porque nelas — mais uma vez pela dificuldade que o sangue tem para chegar — os processos de cicatrização tendem a ser mais lentos.

E, mesmo sem qualquer ferida, os fungos podem fazer a festa. "Portadores de diabetes têm mais frieiras e outras micoses do que a média da população", constata Adriana.

O mais grave, porém, é que a glicose elevada é tóxica para os nervos. "Quando eles começam a ficar danificados, a pessoa experimenta uma coceira generalizada ou fica com a sensação de agulhadas", avisa.

A perda de sensibilidade que surge na sequência é perigosa: o sujeito pode se ferir e não perceber, enquanto a lesão vai ficando infeccionada. Uma unha encravada é capaz de só ser notada ao virar uma ferida purulenta.

"Para completar, no organismo com diabetes a falta ou a insuficiência de insulina, o hormônio produzido pelo pâncreas que faria a glicose entrar nas células, afeta o crescimento de células cutâneas chamadas queratinócitos", conta Adriana. Resultado: perda de viço, como se a pessoa fosse alguns anos mais velha.

Obesidade

"Em quem está acima do peso, a secreção das glândulas sebáceas é mais intensa, daí que o risco de proliferação de micróbios também é maior", explica a dermatologista.

A gordura corporal, por sua vez, forma uma espécie de isolante térmico que dificulta a troca de calor com o ambiente e, para compensar, a pele derrama mais suor. A questão é que a dupla sebo e suor se acumula nas áreas de dobras, como as virilhas, podendo criar assaduras.

Tabagismo

Além de as toxinas inaladas com o cigarro gerarem uma quantidade exorbitante de radicais livres que vão lesionar as células — e não só as da pele —, a nicotina é um potente constritor de vasos. Mais uma vez, é aquela história: como os que abastecem a pele são finíssimos, ela logo se ressente da falta de uma boa oxigenação e nutrientes.

As fibras elásticas que sustentam esse tecido, como as de colágeno, deixam isso evidente. Sim, fumar torna a pele bem mais envelhecida. Pode ser o menor dos motivos para alguém largar o cigarro, mas não deixa de ser um estímulo a mais.