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Jairo Bouer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

É certo proibir uma avó com depressão de ver o neto?

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

20/06/2022 04h00

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Quando um casamento termina, qual o impacto que esse processo pode gerar em outros membros da família? Como avós, por exemplo, lidam com a menor frequência da visita dos netos, principalmente nos casos mais complexos e turbulentos de separação?

Não que um casal tenha que "segurar" uma relação que acabou por conta das respectivas famílias, mas o cuidado com quem está em volta, a família extensa, precisa ser levado em consideração.

Família extensa é aquela que vai além dos pais e filhos, ela é composta pelos parentes próximos com quem as crianças crescem e mantêm vínculos afetivos. E é claro que quando o casal se separa, essa parte da família também sofre.

Uma leitora (uma avó) escreveu recentemente pedindo ajuda com uma situação que estava lhe causando intenso sofrimento. Depois da separação, a ex-nora proibiu os encontros dela com o neto, com quem ela tem um vínculo afetivo muito forte. A mãe dizia não se sentir segura de deixar o neto com uma pessoa deprimida que estava em tratamento, sem se dar conta que esse afastamento prolongado era uma das principais causas do momento difícil que essa avó está atravessando.

Além dos aspectos jurídicos que devem ser levados em consideração (não tenho informações sobre como foi essa separação, e se essa ex-nora poderia mesmo proibir as visitas), existe um aspecto humano que não pode ser esquecido.

Em primeiro lugar, salvo situações excepcionais (depressões muito graves com quadros psicóticos, por exemplo), não existe a menor justificativa para se evitar o contato de um adulto com crianças. Pessoas com depressão (ainda mais em tratamento) vivem, trabalham, se relacionam e, inclusive, necessitam da manutenção das suas relações sociais para poderem se recuperar mais rápido e voltarem a se sentir bem. Me parece bastante insensível e cruel, para se dizer o mínimo, tanto para a avó como para próprio neto, proibir esses encontros afetivos.

Por mais difícil que tenha sido a separação e por mais tempo que os envolvidos no caso precisem para se recuperar, é essencial que os vínculos com a família extensa sejam preservados. O "sumiço" de uma avó na vida de uma criança pode gerar uma confusão de sentimentos, como culpa, abandono, ressentimento e tristeza, que levam décadas para serem superados.

A depressão dessa avó pode ter tido como gatilho, entre outras causas, a separação do filho e a distância do neto. Sem resolver essas questões fica muito mais difícil para ela sair dessa situação. Projetar a infelicidade ou raiva do término de uma relação em outros membros da família não faz bem nem para os envolvidos diretos nem para os parentes.

Seria muito importante que houvesse uma mediação adequada desse conflito para que essa questão seja resolvida. O pai que pareceu "sumir" desse momento precisa assumir um papel central em exigir e efetivar seu direito de ver o filho. Outros parentes ou alguém da rede de apoio dessa família poderia fazer também uma ponte entre ex-nora e ex-sogra para tentar uma melhor aproximação.

Questões iniciais de insegurança por parte da mãe poderiam até ser resolvidas com a presença de outros membros na família nos primeiros encontros. Uma terapia poderia também dar suporte para a mãe e para outros parentes para lidarem melhor com suas emoções nessa fase de transição.

Matéria de Universa dessa semana discute também outro aspecto interessante das separações, que são as mães que terminam novos relacionamentos e têm que lidar com os filhos que sentem falta do ex-namorado. Vale a leitura!

O que não pode acontecer é que avós e netos sejam prejudicados, e que um vínculo tão forte e bonito esteja sendo deixado de lado. Já imaginou o que teria acontecido se, na sua infância, sua mãe ou seu pai tivesse proibido você de conviver com a figura amorosa e querida da sua avó?