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Jairo Bouer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

TikTok me mostrou como falta diálogo sobre sexo entre os jovens e seus pais

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Imagem: iStock

Colunista do VivaBem

29/09/2021 04h00

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Há pouco mais de três meses, resolvi entrar no TikTok, plataforma digital que fala basicamente com o público jovem, para testar como eles reagiriam a vídeos muito curtos (cerca de 30 segundos) respondendo a dúvidas sobre sexo.

A tentativa era uma incógnita, já que a distância de idade que me separa deste público hoje é bem maior do que a que existia quando eu "falava" com os adolescentes nos já extintos "Folhateen" (da Folha de S.Paulo) e no "MTV Erótica", o primeiro no começo da década de 1990, e o segundo já na virada do século 20 para o 21 (de 1999 a 2003 para ser mais preciso).

400 mil seguidores depois, já com vários vídeos ultrapassando 1 milhão de visualizações, e nosso recordista no TikTok alcançando mais de 5 milhões de "views", achei interessante traçar algumas considerações sobre essa aproximação com os jovens das gerações Z e Alpha e, por tabela, com os pais dessa turma, muito dos quais podem até ter me escrito ou assistido no passado. Uma das coisas que percebi pelos comentários e dúvidas que chegam para mim, é que o diálogo em casa não anda dos melhores.

Dúvidas muito básicas

Um texto dessa semana do colunista de TV Fefito, publicado no BuzzFeed, traz algumas perguntas curiosas que eu já respondi no TikTok (os vídeos também são postados em meu Instagram). Um dos pontos que chama a atenção é que as dúvidas revelam um nível preocupante de desinformação. Além de serem praticamente as mesmas questões de quase 30 anos atrás, elas são muito básicas, mostrando que não só em casa, mas também nas escolas, está faltando discutir o tema.

Nos últimos anos a educação em sexualidade perdeu terreno, e arrisco dizer que o assunto é hoje muito menos discutido em sala de aula do que há 20 anos. Pena! Travadas por visões conservadoras, muitas das redes públicas de ensino desmontaram seus programas de prevenção. É urgente que os próximos governos sejam sensíveis à retomada dos projetos nessa área.

Para se ter uma ideia do nível das perguntas, mesmo considerando um público bem jovem, separei algumas delas aqui:

Eu e minha amiga fizemos sexo oral. Tem como engravidar?

É normal o pênis ficar duro quando beijo minha namorada?

Falta conversa em casa

Outro ponto importante revelado pelas perguntas e comentários é a dificuldade em conversar com os pais sobre a vida sexual. Em nosso vídeo de maior sucesso, a gente sugere formas da garota conseguir que a mãe a leve ao ginecologista sem ter que contar que tinha tido sua primeira vez, já que ela não via espaço para esse tipo de diálogo em casa. Não deixa de ser simbólico o fato do vídeo de maior repercussão ser justamente o que mostra como não falar sobre o assunto. Não seria muito mais fácil, para os dois lados, se tudo fosse feito às claras?

@jairobouer

"PERDI A V!RG!NDADE E AINDA TÁ S@NGR@ND0! É NORMAL?" #jairoresponde #duvida #dicas #jairobouer #curiosidade

? som original - jairobouer

Curioso notar que a geração atual de pais de adolescentes, que foi mais exposta a informações sobre sexualidade, ainda tenha tanta dificuldade em estabelecer um canal de comunicação mais efetivo com os filhos. Claro que também existe uma dificuldade natural, talvez até uma vergonha do jovem em compartilhar suas experiências iniciais com os pais.

Entretanto, se ele percebesse um terreno mais fértil para esse tipo de conversa, certamente uma série de questões seria resolvida em casa, bem como haveria uma maior facilidade para que os pais fossem a ponte para que os filhos tivessem acesso mais rápido e direto aos serviços de saúde. Lembrando que quando o assunto é sexo, prevenir é sempre melhor do que remediar!

Outro ponto: se tem um assunto que se tornou mais presente e falado com mais naturalidade pelos mais novos (sem tantos tabus e preconceitos) é a questão da maior fluidez sexual. Temas como bissexualidade, identidade de gênero, experiências com pessoas do mesmo sexo e exploração de outras formas de prazer aparecem com maior frequência entre eles, embora ache pouco provável que sejam assuntos compartilhados, pelo menos inicialmente, com os pais.

Aprendendo com as redes

A geração que se informa pelas redes sociais pode ter uma maior dificuldade em criar filtros para separar o que é verdade do que é boato. Um vídeo de um médico ou de um especialista pode ter o mesmo peso (ou até menor) do que a postagem de um influenciador que sabe muito pouco ou quase nada sobre o assunto. Mas se a informação hoje se transmite de forma mais fragmentada e horizontal, seria importante também trabalhar os influenciadores para alguns temas mais sensíveis.

Os comentários que seguem a maioria dos vídeos dizendo que queriam que o pai ou a mãe falasse com eles com a mesma naturalidade com que a gente discute no TikTok (ou que eu fosse o "tio bacana" com quem pudessem conversar sobre sexo) mostram que eles ficariam mais felizes e tranquilos de poder falar sobre o tema sem tabus em casa. Fica a dica para os pais!

Para saber mais sobre comportamento e sexualidade jovem, visite meu site doutorjairo.uol.com.br/