Topo

Elânia Francisca

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

E se as Unidades Básicas de Saúde se tornarem referência para adolescentes?

iStock
Imagem: iStock

Colunista do UOL

07/01/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Vou começar esse texto explicando o que é uma UBS (Unidade Básica de Saúde), também conhecida por muitas pessoas como posto de saúde ou "postinho".

As UBS são equipamentos públicos de saúde e porta de entrada para todos os demais serviços do SUS (Sistema Único de Saúde). Todo mundo tem sua UBS de referência que é definida a partir do seu local de moradia —para que você possa acessá-la com mais facilidade e para que a equipe do serviço também conviva e conheça um pouco da dinâmica da região atendida.

Na UBS você pode fazer seu cartão SUS e agendar atendimentos básicos, além de receber encaminhamentos para outros serviços da rede pública de saúde. Contudo, não é só isso que faz a equipe de uma UBS, já que seu maior objetivo é a promoção de saúde e, como já escrevi em outro texto, saúde não é só ausência de adoecimento.

As UBS desenvolvem várias ações de promoção à saúde de toda a população e, por estarem dentro da comunidade, podem usar as mais diversas ferramentas e estratégias para dialogar sobre bem-estar e saúde integral das pessoas que são atendidas e vivem na região.

Há equipes de UBS que realizam atividades como criação de hortas com plantas medicinais, rodas de conversas nas quais as pessoas podem contar suas histórias de vida, caminhadas matinais que ajudam a (re)conhecer o bairro e ao mesmo tempo socializar e se exercitar.

Além de tudo isso, há UBS que realizam atividades com adolescentes sobre temas relacionados às questões que surgem nessa fase do desenvolvimento. Contudo, ainda são poucas as iniciativas que têm a adesão de pessoas entre 12 e 18 anos, e isso se dá por vários motivos, mas quero destacar aqui uma barreira chamada de adultocentrismo, aquela a ideia de que somente adultos sabem das coisas e que faz com que muitas pessoas pensem que adolescentes só podem acessar as UBS com a permissão de seus responsáveis e cultivem a ideia de profissionais da saúde contarão aos adultos tudo o que ocorre nas atividades ou atendimentos.

Em meu trabalho junto a adolescentes, busco sempre perguntar se conhecem sua UBS de referência e se frequentam suas atividades promovidas. Na maioria das vezes, a resposta é negativa e os motivos para não frequentarem o equipamento de saúde estão relacionados ao medo da quebra de sigilo sobre questões íntimas durante um atendimento ou a crença de que para frequentar a UBS precisam de autorização ou presença dos pais em consultas.

Adolescentes podem frequentar as atividades das UBS e têm direito de agendar atendimento e estar em consulta sem a presença de um adulto responsável, se for de seu desejo.

O sigilo durante o atendimento, seja em consulta seja em atividades grupais na UBS, só deverá quebrado pela equipe se envolver algum risco ou dano à saúde, mas caso isso ocorra, haverá dialogo prévio com a pessoa adolescente, explicando a situação e justificando o motivo da quebra do sigilo.

É fundamental que pessoas adultas dialoguem francamente com adolescentes sobre o papel das UBS e enfatizem tanto a questão do sigilo quanto a importância de tê-las como referência no cuidado à saúde.

Informar adolescentes é parte do fortalecimento do vínculo com nesse equipamento, mas não é a única ação de promoção à saúde de adolescentes —também é preciso ouvir as sugestões e queixas que essa parcela da população tem sobre o tratamento recebido nas UBS e demais serviços do SUS.

Imagine o que aconteceria se toda a população adolescente enxergasse a UBS como um espaço seguro e de referência em saúde?

A responsabilidade de criar esse caminho é das equipes desses serviços, mas também é nossa enquanto sociedade, família e responsáveis pela garantia do desenvolvimento saudável de adolescentes.

Para finalizar, eu imagino que você possa estar pensando que na teoria tudo isso é lindo, mas que na prática não é bem assim —e eu te entendo—, mas precisamos pensar que para o SUS ser colocado em prática do modo como está previsto é preciso investimento público —estou falando de dinheiro público mesmo, mas não só.

Precisamos que as equipes de saúde sejam valorizadas em seu trabalho e expandidas para que a população receba acolhimento de qualidade; precisamos que as equipes de saúde recebam formação de qualidade não só sobre técnicas e teorias, mas formação sobre a cultura do território em que está inserida, para que enxergue potência naquela comunidade e sinta-se também parte dela.