Sempre com novidades, Botafogo está cada vez mais descolado e democrático
Há quem brinque que toda semana abre uma nova casa em por lá. Áreas antes esquecidas, e até consideradas perigosas, agora abrigam lugares modernos, com público que se estende pelas calçadas. Em 2014, ele ganhou o apelido de BotaSoHo do jornalista Renato Lemos. Foi quando as novidades culturais e gastronômicas do bairro carioca de Botafogo vinham chamando atenção. E não pararam mais, tanto que em 2018 ele foi citado pelo site da revista "Time Out" como um dos 50 bairros mais cool do mundo - o único brasileiro a figurar na lista, por sinal.
Veja também:
8 rolês divertidos para conhecer a história do Rio de Janeiro
Nostálgico e cultural, o Rio de Macalé tem gosto de infância e adolescência
No Rio de Janeiro de Kéfera, o que vale mesmo é se conectar com a natureza
"O que mudou foi sobretudo o perfil dos negócios. Sempre existiu boemia, mas antes era aquela mais tradicional. Hoje tem casas mais descoladas ou alta gastronomia", analisa Fernando Blower, presidente do Sindicato de Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro (SindRio). Ele também é sócio do Meza Bar, que fica no comecinho do Humaitá, ao lado de Botafogo.
A diretora de TV Joana Lessa mora há 12 anos na Rua Álvaro Ramos - uma das áreas mais moderninhas da região, apelidada de "hipsterlândia" - e acompanhou as transformações de perto. "Era um lugar muito pouco valorizado e tinha muito assalto", conta. Segundo ela, a abertura do batalhão de polícia na rua foi uma mudança: o local para onde ninguém ia, porque era perigoso, começou a ser considerado legal. Depois que abriu o bar e café CoLAB, então, foi o "ponto de virada" na visão da diretora.
Apesar do hype, ela diz que esse movimento não gerou uma gentrificação: os antigos moradores continuam por ali, e o aluguel se manteve na mesma faixa de preço. "É engraçado, porque tem um hi-lo: ao mesmo tempo que apareceu uma coisa supernova que atraiu uma galera jovem, ainda tem o pessoal que morava antes, das vilas da rua, que põe cadeira de praia na calçada, faz churrasco e bota um sonzinho", observa.
Movimento gera movimento
Como o bairro é muito grande, a transição vem acontecendo aos poucos. Um dos primeiros trechos a passar por esse processo foi o quarteirão da Rua Sorocaba próximo à Rua Mena Barreto. No fim de 2011, ali abriu a Comuna, e as calçadas (e a rua) do bar ainda lotam mesmo 8 anos depois da inauguração.
Já passaram por ali diversas festas, bazares, exposições, exibições de filmes, shows, uma editora e uma loja de novos estilistas. Também foi onde aconteceram as primeiras edições da famosa Junta Local, uma feira de pequenos produtores. Além de orgânicos e outros produtos, o evento tem drinques, vinhos, queijos, sanduíches e comidinhas diversas. É possível encomendar alguns dos produtos pelo site da feira (e um dos locais para retirada é justamente a Comuna).
Quando a casa começou a apostar nos hambúrgueres, ganhou diversos prêmios. As receitas vivem mudando, e atualmente há pedidas como o Partidão (R$ 30), com 160g de carne temperada com sal e tutano no pão branco, queijo, picles de pepino, cebola-roxa, maionese branca e molho remoulade. Os drinques também fazem sucesso, entre eles o Santa Maria (R$ 28), com gin, pitanga, tangerina, suco de gengibre e água tônica.
"Acho que a grande difusão veio da quantidade de projetos que passaram pela Comuna. E, se a gente está nesta casa até hoje, é porque fazemos sempre muita mudança", conta João Casotti, um dos seis sócios do bar. Quem se deu bem com o burburinho foi o veterano Alfa Bar: desde 1952 no mesmo endereço, virou point bombado depois do sucesso do vizinho, já que o público se espalha por aquela área. A rua depois ganhou um outro empreendimento, o Alice Bar, em 2016.
"Hipsterlândia"
No mesmo ano, na "hipsterlândia", foi inaugurado o CoLAB, que não tinha a pretensão de promover tanto fuzuê. "Ele foi criado para ser uma casa especializada em café, o que a gente de fato é. Com o tempo, tomamos uma proporção que nos puxa para uma coisa noturna", conta Diogo Schot, sócio ao lado de Rodrigo Abe e morador do bairro há 8 anos.
O café funciona de dia e o bar à noite, com festa e música ao vivo às terças, e festas e DJs às quintas. Clarice Falcão, Duda Beat e Braza são alguns dos artistas que já se apresentaram lá e fazem parte do CoLAB Records, canal no YouTube com clipes feitos a partir de pocket-shows gravados ali.
Numa vibe brunch, o forte são os cafés (o CoLAB faz a torra para alguns lugares da cidade) e pratos como o Full English Breakfast (R$ 34), com bacon, ovos, cogumelos, linguiça, tomate grelhado com feijão e pão Sourdough. À noite são servidos, por exemplo, o bowl de moqueca (de tilápia ou banana-da-terra, R$ 30) ou o X-Burguer (R$ 20), com hambúrguer artesanal, queijo prato, picles e maionese caseiros no pão brioche.
Alguns meses depois da chegada do CoLAB foram surgindo casas descoladas nos arredores, como o South Ferro, restaurante com pegada asiática do nova-iorquino Sei Shiroma, e o Quartinho Bar, de um ex-sócio do CoLAB, Jonas Aisengart, junto com Edu Mendes. Este abriu em dezembro do ano passado.
O Quartinho só funciona à noite e aposta nos drinques, divididos em três categorias: gin tônicas (de R$ 22 a R$ 42); Doces Dezesseis (R$ 16) e Especiais do Quartinho (R$ 28), com coquetéis autorais. Para comer, há sugestões como os empadões (R$ 18 cada), de camarão com manga e catupiry, de cogumelo com gorgonzola e de queijo de cabra com cebola caramelizada.
Botafogo para todes
Uma das primeiras áreas do bairro a atrair gente de outras regiões da cidade foi a Rua Conde de Irajá, onde se concentram alguns dos destaques gastronômicos de Botafogo, restaurantes como Lasai, Oteque, ColTivi, Irajá Gastrô e o ino. (uma filial do paulista). E por ali também está um lugar que chama um público mais alternativo: o Reduto. Desde 2012, ele é sede de diversos eventos da Pequena Central, a produtora do ator Marco Nanini em parceria com o produtor Fernando Libonati.
O espaço tem dois casarões: um deles tem mesas e cadeiras; no outro, funciona o bar de drinques, um salão onde às vezes há eventos e a pista de dança, no porão. Na área aberta tem uma lojinha de camisetas do ateliê Naked Neuras, e o esquema do bar e da cozinha é pague e pegue. Do cardápio dá para pedir a porção de croquete de carne (R$ 24, com seis) e o gin tônica (R$ 29).
"Botafogo sempre lança uma modinha nova, depois acabam copiando em outras partes da cidade", opina o DJ e autor teatral Guilherme Scarpa, que frequenta o bairro há muitos anos, assim como a irmã, a artista plástica e estudante de Psicologia Luiza Scarpa. Ambos presenciaram as mudanças acontecendo ao longo do tempo e como essa nova faceta foi se desenhando. "É um bairro onde cabe todo mundo: tem lugar para mauricinho, artista, gay. É bem plural. E sempre senti uma vibe de respeito pelas tribos. Parece ser uma convivência pacífica", diz Guilherme.
Entre os lugares que ele frequenta está a galeria Ble, aberta em 2017, num trecho da Rua Dezenove de Fevereiro cuja revitalização foi recente. Dedicada a trabalhos de artistas novos, a galeria também contempla estúdio de tatuagem, um café/bar e recebe shows de música, festas e encontros literários, entre outros eventos. Aliás, um dos sócios é Tiago de Barros, neto do poeta Manoel de Barros (1916-2014). "É muito interessante e ainda não tão conhecido", conta.
Aquele pedaço antes esquecido da Rua Dezenove de Fevereiro começou a atrair pessoas em 2016, quando a conceituada cervejaria carioca Hocus Pocus abriu seu próprio bar em uma antiga garagem. Com projeto arquitetônico clean, são 14 torneiras de chope, sendo seis fixas, com receitas próprias (a Interstellar, do tipo IPA, sai a R$ 16).
O lugar é um dos eleitos do jornalista Rodrigo Miguez, 34, que começou a andar por Botafogo por volta de 2013. "Antes ele era sem graça e até um pouco perigoso. Hoje, a gente percebe o point que virou. No começo, eu ia nos bares do início da Voluntários. Depois que a Void abriu, passei a ir principalmente lá. Mas depois descobri o Caverna e os bares cervejeiros, como a Hocus Pocus, e virei frequentador", lembra ele, que acaba de se mudar para São Paulo.
A Void General Store chegou ao bairro em 2015. A filial da loja gaúcha no bairro tem uma cozinha que recebe convidados diferentes a cada dia. Já prepararam suas receitas por ali os chefs Elia Schramm, Pedro Benoliel, Batista (braço-direito de Claude Troisgros) e Jimmy Ogro, além nomes como o cantor Marcelo Jeneci e a artista plástica Mana Bernardes.
Com gosto parecido ao do irmão, Luiza tem ido volta e meia ao Be+Co, uma vila de contêineres com diversas casas. São três boxes fixos e um pop up, e o esquema é pague e pegue. Entre os restaurantes fixos está o Ají, do chef Thiago Berton, o Zatar, da chef Katia Hannequim, e o Tortin, que só tem bebidas e a carta de drinques é assinada pelo bartender Igor Renovato. Além de prover os comes, a vila também promove shows, feiras e outros eventos.
"É bem legal, tem um clima interessante, porque é uma vila, com bons drinques e preço honesto", observa a artista plástica. Ela brinca que Botafogo está virando "quase um estado". "O bairro está ficando com uma cara própria dele, virando um polo cultural e artístico", comemora.
O que Botafogo tem
Rafael Santos, um dos idealizadores e sócios do Be+Co diz que a ideia sempre foi abrir o negócio em Botafogo, por ter características mais "urbanas" do que outros redutos da Zona Sul que estão perto da praia. "É um lugar de uma população jovem, muito aberta a novos negócios e novas discussões. Acabou sendo um ponto de encontro de pessoas que estão antenadas com os temas que estão sendo falados", acredita ele.
O bairro também foi a escolha certeira para o casal Rafa Brito e Ludmila Espindola, donos da bombada padaria Slow Bakery. Eles buscavam um lugar com espaço, mas que não tivesse aluguel caro. "A gente não tinha sócio-investidor. Era empreendedorismo na raça, uma das grandes características do que vem surgindo em Botafogo: gente que transforma sua paixão e seu ofício em negócio", explica Ludmila.
Ela acredita que uma cidade mais conectada com esses valores contemporâneos, de pequenas produções locais, trabalho mais autoral e redução do lixo, está acontecendo mais em Botafogo. "Ele tem diversidade e frescor que outros bairros, mais ensimesmados, mais voltados para dentro, não têm. O bairro complementa e potencializa a padaria. A Slow é o que é por causa de Botafogo."
Vai lá:
Alfa Bar
Rua Mena Barreto, 94, Botafogo, Rio de Janeiro.
Segunda a sábado, das 8h às 3h.
Domingo, das 9h à 0h.
Telefone: (21) 2266-2510
Be+Co
Rua da Matriz, 54, Botafogo, Rio de Janeiro.
Terça a quinta, das 17h à 0h.
Sexta, das 17h à 1h.
ábado, das 11h à 1h.
Domingo, das 11h às 20h.
Ble Galeria e Arte
Rua Dezenove de Fevereiro, 184, Botafogo, Rio de Janeiro.
Segunda a quarta, das 11h às 22h.
Quinta e sexta, das 11h às 2h.
Sábado, das 14h às 2h.
Telefone: (21) 3820-9017
Comuna
Rua Sorocaba, 585, Botafogo, Rio de Janeiro.
erça, das 12h à 0h.
Quarta, das 12h à 0h30.
Quinta e sexta, das 12h à 1h.
Sábado, das 18h30 à 1h.
Domingo, das 18h30 à 0h30.
Telefone: (21) 3579-6175
CoLAB
Rua Fernandes Guimarães, 66 - Botafogo, Rio de Janeiro.
Terça a sábado, das 10h à 0h30.
Domingo, das 10h às 16h.
Telefone: (21) 3592-0470
Junta Local
Rua Capistrano de Abreu, Botafogo, Rio de Janeiro.
Todo primeiro domingo do mês, das 10h às 17h.
Junta Local + Chega Junto
Área externa da Christ Church Rio - Rua Real Grandeza, 99, Botafogo.
Todo terceiro sábado do mês, das 10h às 17h.
Hocus Pocus DNA
Rua Dezenove de Fevereiro, 186, Botafogo, Rio de Janeiro.
Segunda e terça, das 11h45 às 15h30 e das 18h à 0h.
Quarta e quinta, das 11h45 às 15h30 e das 18h às 2h.
Sexta e sábado, das 18h às 2h.
Telefone: (21) 4107-3107
Quartinho Bar
Rua Arnaldo Quintela, 124, Botafogo, Rio de Janeiro.
Terça a sábado, das 18h às 2h.
Telefone: (21) 2179-6447
Reduto
Rua Conde de Irajá, 90/98, Botafogo, Rio de Janeiro.
Sexta e sábado, das 19h à 1h.
Telefone: (21) 3797-0100
Slow Bakery
Rua São João Batista, 93, Botafogo, Rio de Janeiro.
Terça a sexta, das 9h às 19h30 (cozinha e café fecham meia hora antes).
Sábado, das 9h às 15h.
Telefone: (21) 3563-8638
Void General Store
Rua Voluntários da Pátria, 31 Loja C e D, Botafogo, Rio de Janeiro.
Segunda a quarta, das 12h à 1h.
Quinta, das 12h às 2h.
Sexta e sábado, das 12h às 3h.
Domingo, das 12h à 1h.
Telefone: (21) 3593-3326
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.