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Apesar de lei, barreiras para denunciar violência por LGBTfobia no Brasil permanecem

Pesquisa mostra que população LGBT ainda encontra dificuldade para denunciar crime de homofobia - Pyrosky/Getty Images
Pesquisa mostra que população LGBT ainda encontra dificuldade para denunciar crime de homofobia Imagem: Pyrosky/Getty Images

28/06/2021 09h54

Dois anos anos depois de o Supremo Tribunal Federal criminalizar a LGBTfobia, na prática, a decisão ainda não saiu do papel. É o que mostra um estudo da organização internacional All Out em parceria com o Instituto Matizes, divulgado na ocasião do Dia Internacional do Orgulho LGBT+, neste 28 de junho.

"A gente identificou uma série de barreiras, pelo menos 34, que impedem que uma pessoa LGBT possa denunciar e tenha acesso a Justiça depois de ser vítima de uma violência LGBTfóbica", afirma Leandro Ramos, diretor regional da All Out na América Latina.

"A gente vive uma situação bastante peculiar: nos últimos anos, conquistamos a maioria dos direitos pelos quais o movimento LGBT luta no mundo: casamento igualitário, reconhecimento das identidades trans, proteções contra discriminação. Mas o Brasil continua sendo um país extremamente perigoso e violento para pessoas LGBT, principalmente trans e travestis", ressalta Ramos, frisando que esses direitos sempre foram reconhecidos pela via da Justiça, jamais pelo Congresso.

Apagão de dados

Para realizar o estudo, foram entrevistados policiais, advogados, juízes, promotores, entre outros integrantes da rede que recebe e trata queixas. A constatação é de que um caso de violência contra uma pessoa homossexual ou trans com frequência desconsidera este fator - assim, não entra para as estatísticas como uma agressão motivada pela orientação sexual ou o gênero.

"Existe um apagão de dados em relação à população LGBT no Brasil, não apenas em relação à violência, mas a gente não sabe quem são as pessoas LGBT, onde elas estão, quais são as questões envolvidas. Sem dados sobre essa população, dificulta muito que tenhamos dados sobre as violências sofridas por ela", aponta Ramos. "Uma vítima de LGBTfóbica frequentemente é revitimizada no processo de tentar denunciar. Isso acontece de várias formas, desde você chegar numa delegacia e quem lhe atende não ter nenhuma noção do que se trata a LGBTfobia, ou entender mas tentar relativizar e dissuadi-lo de fazer uma denúncia", exemplifica.

Ramos lembra que, no formulário de uma queixa policial, é comum não haver um campo para especificar que se tratou de violência contra uma pessoa homossexual ou trans - uma situação que reflete a que ponto a sociedade ainda ignora o problema. "A gente percebe isso em outros discursos, como o que pessoas LGBT buscam privilégios. Você ser quem você é e poder amar quem você quer, e ter os mesmos direitos, não é exatamente um privilégio", sublinha. "É só você ter uma garantia de que, ao ser quem você é, não vai significar perder a sua vida, a sua liberdade, a sua dignidade. Acho que ainda falta mais clareza da sociedade em relação a isso."

Policiais homens

O estudo nota ainda que as estruturas de segurança no Brasil, seja policial ou militar, são marcadas por uma forte presença não só masculina, com pouco ingresso de mulheres, homossexuais e ainda menos de pessoas trans, mas também são homens de perfil bastante "masculinista", conforme define o relatório.

"Precisaríamos de mais conscientização e treinamento das forças de segurança pública, que essa questão esteja mais presente na capacitação que as forças policiais e agentes de segurança recebem no Brasil. Isso ajudaria a começar a mudar essa realidade", avalia o ativista. "A gente tende a resistir ao que não conhece ou não entende."

Para ouvir a entrevista completa, clique no podcast acima.